I SÉRIE — NÚMERO 54
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do ambiente. Ou seja, a presente alteração das normas pode tentar as multinacionais a levarem a tribunal os
Estados que decidam democraticamente vetar o seu território a estes organismos. É uma preocupação tanto
maior e iniludível quando pode vir a estar acoplada à aprovação do Acordo de Parceria Transatlântica de
Comércio e Investimento, vulgarmente conhecido por TTIP.
A pressão dos povos é crescente, Sr.as
e Srs. Deputados. Mesmo nos Estados Unidos, que são os maiores
produtores de OGM e onde tradicionalmente a opinião pública era mais favorável, isso está a mudar. No início
do ano passado, uma multinacional agroalimentar viu-se obrigada a retirar OGM dos seus cereais de pequeno-
almoço, dos mais consumidos no país. Não resolve o problema, mas espelha o consenso que se alarga na
sociedade.
Existe, sem dúvida, um problema no planeta com falta de alimentos, mas os OGM em nada resolvem esse
problema. Não se resolve o problema da pobreza concentrando mais a riqueza.
O cultivo de OGM dá um poder desmesurado à indústria agroquímica, torna os países dependentes das
suas sementes e dos seus pesticidas, é um risco tanto para a saúde pública, cuja consequência não está
desmentida, e para o ecossistema. Num momento em que a população mundial de abelhas está ameaçada, é
necessário mudar de paradigma.
Em regra, os OGM ou segregam pesticidas — como é o caso do milho MON810 — ou têm uma resistência
excecional a estes químicos. Isto leva a uma grande concentração destes químicos no ecossistema, seja pela
autoprodução, seja pelo uso excessivo. Nomeadamente nos Estados Unidos, assistimos ao regresso do uso
de pesticidas altamente tóxicos, como é o caso do herbicida 2.4-D, nada mais, nada menos do que um
derivado do agente laranja, uma arma química que todos conhecemos e que foi usada na guerra do Vietname.
Chegou o momento para, em Portugal, dizermos não aos OGM. É assim em quase toda a Europa. É assim,
até, nas potências agrícolas da Europa. É essa a vontade da precaução dos povos. Por esse motivo,
apresentámos à Assembleia da República, e outros também o farão, uma proposta para proibir o cultivo, a
importação e a comercialização de organismos geneticamente modificados.
O Governo português tem estado do lado errado no que toca à segurança alimentar. Há dois anos votou na
União Europeia contra a proibição de três pesticidas responsáveis pelo declínio da população de abelhas. A
proibição foi maioritária e foi aprovada. Agora, insiste em proteger os interesses das multinacionais
agroquímicas, embora praticamente isolado na União Europeia, ao autorizar o cultivo de OGM. Esteve errado
e isolado, e assim continua.
O nosso caminho, nesta matéria, tem sido bastante claro: aprovar o princípio da precaução. Já o fizemos
no ano 2000, especificamente em relação a algumas variedades de OGM.
Sr.as
e Srs. Deputados, não é aceitável que, em resposta ao Bloco de Esquerda, o Ministro do Ambiente,
Jorge Moreira da Silva, nos diga que vai manter a autorização para o milho transgénico em Portugal quando
ele se coloca claramente dentro da ideia cientificamente comprovada, diz ele, que esse OGM não tem
qualquer consequência nem para a saúde pública nem para o ecossistema.
Segundo o Ministro do Ambiente, o princípio da precaução está garantido porque os OGM não têm
nenhuma lesão, nenhum conflito com o princípio da precaução. É lamentável que o Governo mantenha essa
opinião minoritária, hoje completamente em decadência na Europa.
Deixamos, aqui, o alerta, porque infelizmente não só o Governo PSD/CDS se prepara para manter a
autorização para esse organismo geneticamente modificado como, eventualmente, agora liberto dos
condicionamentos da União Europeia, pode, até, vir a autorizar outro tipo de variedades genéticas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Miranda Calha): — A Mesa regista três pedidos de esclarecimentos, a que o Sr.
Deputado irá responder em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, cumprimento o Sr. Deputado Luís Fazenda.
Sr. Deputado, relativamente a esta matéria, o PCP considera que a história da legislação portuguesa não é
propriamente famosa, consideramo-la até, na nossa perspetiva, desadequada relativamente ao interesse
nacional.