I SÉRIE — NÚMERO 59
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A inderrogabilidade da presunção de inocência, da não inversão do ónus da prova em direito penal, do in
dubio pro reo e do direito à não autoincriminação continuam…
A inderrogabilidade da presunção de inocência, da não inversão do ónus da prova em direito penal, do in
dubio pro reo e do direito à não autoincriminação continuam a fazer parte da boa herança jurídica e
democrática com que, no PS, nos orgulhamos de identificar, pois foi em nome da liberdade que nos fundámos
como partido e é e será sempre em nome dela e da garantia dos direitos fundamentais que nos bateremos.
Perderam-se, entretanto, por pura teimosia, anos de resposta consistente no aperfeiçoamento do regime
de responsabilidade e de controlo das declarações de rendimentos e património e no tratamento de eventuais
acréscimos patrimoniais não justificados. Mas antes, como agora, continuamos persuadidos do bem fundado
do caminho que apontámos e que, por isso, continuamos a defender.
Pelo que passo a expor as orientações mais relevantes do projeto do PS.
Em primeiro lugar, propõe-se um significativo alargamento do elenco das entidades sujeitas ao dever de
apresentação das declarações de património e rendimentos. Doravante, não apenas aos titulares de cargos
políticos, mas abarcando, também, os altos dirigentes da Administração Pública central, descentralizada e
regional, bem como os administradores do setor público empresarial.
Em segundo lugar, o prazo para apresentação das declarações devidas é encurtado de 60 para 30 dias.
Em terceiro lugar, as declarações exigíveis devem ser apresentadas até ao fim do terceiro ano após a
cessação dos mandatos.
Em quarto lugar, as declarações de património e rendimentos devem passar a desagregar os rendimentos
obtidos e a identificar as suas fontes.
Em quinto lugar, a eventual recusa de apresentação da declaração devida fará incorrer o responsável em
crime de desobediência.
Em sexto lugar, a avaliação das declarações, tanto na disponibilidade do Tribunal Constitucional, como do
Ministério Público, como da Autoridade Tributária, além das já vigentes regras sobre consulta pública, devem
passar a ser registadas em suporte eletrónico e, consequentemente, suscetíveis de utilização mais eficiente.
Em sétimo lugar, por efeito do cruzamento de dados ou na base de investigação ao abrigo do regime legal
dos sinais exteriores de riqueza, a administração fiscal pode providenciar, junto do tribunal tributário, a
apreensão cautelar de todo o acervo patrimonial não devidamente justificado.
Em oitavo lugar, em sede de Código do IRS, prevê-se o agravamento da taxa fiscal incidente sobre o
património não justificado, que passa dos atuais 60% para 80%.
Em nono lugar, estabelece-se adequada compatibilização de normas, por forma a garantir que, em caso de
condenação por crime de natureza económica e financeira, e em resultado de sentença, o referido acervo
patrimonial não justificado seja definitivamente perdido a favor do Estado. E é oportuno lembrar que foi por
iniciativa de um Governo do PS, em 2002, que a lei relativa à criminalidade económica e financeira já prevê tal
solução.
Em décimo lugar, para que procedimentos penais possam ter lugar, no caso de a eles haver lugar em
relação à prática dos crimes de natureza económica e financeira ou inerentes à corrupção, a participação da
administração fiscal ao Ministério Público deve, necessariamente, ter lugar nas situações verificadas de não
justificação dos rendimentos e do património.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, reafirmamos, pois, a integral coerência da proposta do PS, e é tempo para
declarar que o Grupo Parlamentar do PS estabeleceu como orientação viabilizar, na generalidade, por
abstenção, o conjunto dos demais projetos apresentados. Vai fazê-lo em nome de um empenhamento genuíno
em contribuir para um resultado positivo do presente processo legislativo. Mas fica o aviso: no final do
processo, só poderá votar favoravelmente soluções conformes com os princípios matriciais do Estado de
direito.
Aplausos do PS.
É, pois, em nome desses princípios que importa clarificar, desde já, as orientações que não
acompanhamos.
Aquelas que, em sede criminal, continuam a comprometer o princípio da presunção de inocência e, com
ele, a proteção da não incriminação própria ou da proibição da inversão do ónus da prova.