30 DE MAIO DE 2015
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Propomos alargar a exigência de registo no Banco de Portugal aos acionistas que escondem a sua
identidade participando no capital dos bancos através de outras sociedades. Não conhecer estes
«beneficiários últimos» facilita o uso de informação privilegiada, por exemplo para negociar com ações do
próprio banco, como foi visto em vários casos de segredo bancário em Portugal.
Em segundo lugar, combater a opacidade das operações financeiras.
Devem ser impedidas todas as operações com entidades e empresas sediadas em jurisdições offshore
não-cooperantes ou cujo beneficiário último não seja conhecido. É uma medida de princípio: Portugal não
pode compactuar com quem lucra com o anonimato, com quem impede a investigação de fraudes fiscais ou
branqueamento de capitais. Queremos tolerância zero neste ponto.
Em terceiro lugar, simplificar as estruturas dos grupos bancários.
Conglomerados complexos, que incluem partes financeiras e não-financeiras, por vezes com sedes em
jurisdições inatingíveis, abrem o caminho para operações e conflitos de interesses. Pior: a complexidade
destas estruturas é um alçapão para todas as práticas, todas as operações de planeamento fiscal e todas as
negociatas, como bem vimos no caso da PT ou em múltiplas empresas do GES. Não podemos tolerar esta
complexidade!
Em quarto lugar, proteger os clientes de retalho.
Além da economia e dos contribuintes, as crises bancárias atingem sempre os clientes dos bancos. No
caso do BES, são «os lesados do papel comercial». A diferença entre informação tida pelo banco, que vende
produtos próprios, e pelo cliente, que confia no primeiro e no seu gestor de conta, implica proteger o lado mais
frágil desta relação.
Propomos, por isso, a proibição da venda, aos balcões dos bancos, de valores emitidos por estes ou por
entidades com eles relacionadas. Em paralelo, propomos medidas para impedir subterfúgios como o que o
BES usou para escapar à supervisão da CMVM na colocação de dívida do GES, que quer pelo seu valor, quer
pelo número de subscritores inferior a 150 fez com que o papel fosse classificado como uma colocação
privada, estando fora do crivo da CMVM. Achamos que o critério determinante deve ser o tipo de cliente, se é
ou não qualificado, e não o número de clientes ou o valor da emissão.
Em quinto lugar, melhorar a supervisão bancária.
O Banco de Portugal deve vigiar de forma direta e permanente a atividade dos bancos, assumindo a função
de auditoria e controlo interno. Assim, as irregularidades podem ser conhecidas mais cedo e sem risco de
represálias, exercidas por administradores ou acionistas sobre os funcionários que as denunciem. Tal como
sucede noutros regimes jurídicos e tal como recomenda a Autoridade Bancária Europeia, o Banco de Portugal
deve ter poderes reforçados na avaliação da idoneidade dos gestores — indispensáveis ao exercício da
atividade financeira —, de forma independente em relação a eventuais processos internos ou a decisões que
deles resultem.
Quanto aos auditores externos, propomos que o Banco de Portugal seja diretamente envolvido na escolha
dos mesmos, na definição da sua remuneração e da sua rotação, garantindo que atuam de forma isenta, livres
da relação perversa de cliente-fornecedor que hoje têm com os bancos que auditam. É incompreensível, aliás,
que a proposta que o Governo aqui traz sobre esta matéria não leve em linha de conta as considerações e
recomendações da própria Comissão de Inquérito e não ponha um ponto final a nenhuma das disfunções que
têm permitido a verdadeira amnésia coletiva que a cada crise toma a banca de assalto.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Estas medidas são suficientes para resolver os problemas do
sistema financeiro? Não. Não são. Estes são os aspetos que decorrem diretamente da experiência do caso
Espírito Santo e que devem ser corrigidos para evitar a repetição da história. É indispensável, no entanto, uma
revisão mais profunda dos modos e regras do funcionamento da banca a nível fiscal, de defesa dos
consumidores ou da proteção às famílias endividadas, só para começar.
Mas, acima de tudo confirma-se neste caso o que a realidade teima em provar-nos da forma mais dura: a
banca é demasiado importante para estar nas mãos dos banqueiros, chamem-se eles Jorge, José, João ou
Ricardo. Qualquer um deles ou qualquer outro que seja dono de um banco não hesitará em usar o dinheiro
que lhe foi confiado para lucro próprio. Afinal, esse é mesmo o propósito dos bancos privados. Nenhum deles
está vinculado ao interesse comum. Por isso mesmo, o Bloco de Esquerda recusa a utilização de dinheiros
públicos para privatizar bancos privados. Pelo contrário, só o controlo público da banca pode garantir
transparência, estabilidade, eficiência e controlo democrático do sistema financeiro.