I SÉRIE — NÚMERO 40
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Em primeiro lugar, o argumento de que este diploma é um nível intermédio na passagem para a carreira de
investigação científica é falso, Sr.as e Srs. Deputados. O que o diploma garante, única e simplesmente, é um
contrato a prazo, sem qualquer garantia de estabilidade no horizonte. Aos bolseiros, é-lhes negada uma
perspetiva de futuro, porque não garante a possibilidade de ingressar na carreira de investigação científica.
Em segundo lugar, o argumento de que os bolseiros ficarão a ganhar mais também é falso, Sr.as e Srs.
Deputados. Refere o Decreto-Lei que a remuneração a atribuir no âmbito das contratações é correspondente ao
nível 28 da TRU (Tabela Remuneratória Única). Isto pode mesmo significar uma diminuição muito expressiva
dos rendimentos dos atuais bolseiros, o que é de todo inaceitável. Constitui um retrocesso relativo ao estipulado
no programa Investigador FCT, que também tinha os seus problemas, mas que, na verdade, garantia um grau
de rendimento igual àquele que está na carreira de investigação científica.
Não estamos, por isso, perante uma lógica de reposição de rendimentos nem tampouco de aumentos
salariais, estamos, sim, a discutir quanto é que, em nome de um contrato precário, cada um destes bolseiros
perde ao fim do mês.
Se queremos, realmente, resolver o problema da precariedade e alterar o paradigma da investigação em
Portugal, temos de ter a coragem para alterar aquilo que cria ainda mais entropias ao sistema.
Garantir que ninguém fica de fora do combate à precariedade é o objetivo do Bloco de Esquerda.
A Assembleia da República tem, hoje, a responsabilidade de corrigir os erros que o Ministério criou.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço aos Srs. Deputados que têm intenção de intervir neste debate mas
que ainda não se inscreveram o favor de o fazerem.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, para apresentar o
projeto de lei n.º 368/XIII (2ª).
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresentou o
Decreto-Lei n.º 57/2016 como uma solução para a precariedade reconhecidamente existente no Sistema
Científico e Tecnológico Nacional. É este Decreto-Lei — a sua intencionalidade, aplicabilidade e efeito — que
está, hoje, em apreciação parlamentar.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tem afirmado relativamente a este regime que:
primeiro, resultou de um processo de ampla discussão pública e institucional; segundo, assume a figura do
contrato como o vínculo normal para o trabalho científico pós-doutoral; e terceiro, contribuirá para a renovação
contínua da comunidade científica.
Em primeiro lugar, a discussão recente no meio académico e científico que converge, hoje, quatro meses
decorridos da publicação do Decreto-Lei, nesta apreciação parlamentar, tem demonstrado que, embora possa
ter havido uma ampla discussão pública e institucional, esta não resultou num desejável consenso sobre a
matéria. Bem pelo contrário, as universidades, os bolseiros e os sindicatos — que daqui saúdo — têm,
insistentemente, apresentado sérias críticas, como, de resto, nos foi dado ouvir nos últimos dois dias, na
Comissão de Educação e Ciência. E, se há consenso, ele está quase todo fora da letra do Decreto-Lei.
De resto, o Decreto-Lei contém uma série de contradições. Por exemplo, a disposição quanto aos níveis
remuneratórios estabelece que uma experiência de três anos corresponde ao escalão 54 de vencimento, mas a
norma transitória faz equivaler o escalão 28 aos mesmos três anos, o que tem impacto significativo nas
remunerações dos candidatos.
Em segundo lugar, se a intenção é a de que os contratos de trabalho passem a ser o modo de vinculação
normal para os doutorados, então as disposições do Decreto-Lei ficam aquém desse desígnio e a delineação
contratual de seis anos exemplifica bem esta limitação.
É verdade que se estabelece a possibilidade de se poderem abrir concursos para esse efeito, mas isso, por
si só, não tem novidade. A maior relevância está na norma transitória que, ao vigorar por um ano, acaba por não
conferir igual oportunidade a todos os bolseiros que estão hoje no sistema. Resulta que o efeito pretendido, de
fazer prevalecer o contrato sobre a bolsa — que, em si mesmo, é positivo —, tem uma abrangência menor do
que a devida. Importa, por isso, alargar o período transitório para três anos, garantida a correta interpretação
dos requisitos por parte da FCT, o que nos dizem não estar a ser o caso.