I SÉRIE — NÚMERO 46
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Mas daí a considerar que qualquer cidadão que nasça em Portugal, mesmo que acidentalmente, adquira a
nacionalidade portuguesa originária, parece-nos que é ir longe demais e que deve haver algum critério melhor
pensado relativamente a essa matéria.
Ou seja, para um alargamento do jus soli contarão connosco, mas um alargamento irrestrito desse princípio
quer parecer-nos que é uma solução que não é muito ponderada e que deveria ser melhor equacionada do
ponto de vista, sublinho, da necessidade de alargar a sua aplicação. Do nosso ponto de vista, o princípio do jus
soli ainda é excessivamente restrito.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado
Alves, do PS.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que nos convoca leva-
nos a dois caminhos distintos e a dois elementos diferentes da Lei da Nacionalidade, mas em relação a ambos
sublinho que um fator importante, apesar de não ser um valor único e absoluto, é o da estabilidade dos atos
legislativos.
O projeto de lei que o PSD hoje apresenta, em que recupera a iniciativa legislativa que apresentou na
Legislatura passada e que foi aprovada apenas mediante uma correção que garantisse que existam laços de
efetiva ligação à comunidade nacional, reabre um debate que tivemos muito recentemente e para o qual me
parece que este Parlamento conseguiu construir uma solução relativamente equilibrada para acautelar as
circunstâncias daqueles que, com uma expectativa legítima, gostariam de aceder à nacionalidade portuguesa,
mas sem perder de vista que a Lei da Nacionalidade não pode pura e simplesmente assentar apenas na vontade
pontual, sem demonstrar a existência de um substrato suficientemente denso e claro de ligação com a
comunidade nacional.
Além disso, o PSD traz-nos também um outro aspeto, esse, sim, novo, que poderá ser objeto de discussão
e de melhoramento, que diz respeito à possibilidade de dispensa de oposição nas circunstâncias de casamento
ou de união de facto. Mas mesmo aí temos algumas reservas e dúvidas quanto à eficácia e ao modelo sobre o
qual o Ministério Público pode, eventualmente, passar a ficar dispensado. São matérias para as quais ainda não
há clarificação suficiente que nos permita dizer com toda a certeza que o podemos acompanhar, mas, pelo
menos, é merecedor de alguma discussão e atenção.
Por outro lado, temos a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda.
Penso que podemos todos consensualmente dizer que as políticas de asilo e imigração de Portugal nos
devem orgulhar há muitos anos. Somos reiteradamente bem classificados nos rankings que olham e aprovam
para as matérias de acolhimento da população migrante e da população exilada, e também aí é uma boa
demonstração de que há efetivamente abertura deste País às fronteiras e a outros povos que connosco vêm
partilhar as suas vidas e os seus destinos. Mas daí não retiramos necessariamente que, da forma como vem
proposta, possamos acompanhar o Bloco de Esquerda pela maneira como consagra, de forma totalmente
aberta, o jussoli, até porque ele pode acarretar riscos significativos para os próprios migrantes. Isto porque,
muitas vezes, o jus soli é que pode estar na origem de soluções que levam às migrações, não digo forçadas,
mas impulsionadas pela vontade de nascer num determinado território, porque sabem que, sem qualquer um
outro critério, há lugar à aquisição da nacionalidade.
Simultaneamente, por essa razão — porque também há riscos e a Lei da Nacionalidade deve ter essa cautela
—, a aquisição automática e imediata da nacionalidade por efeito do casamento, sem uma ponderação que
permita balizar a duração desse casamento e a efetiva ligação à comunidade nacional, também nos parece ser
merecedora de maior atenção, sendo que a unidade familiar e a presença dos restantes membros da família é
garantida através da lei que assegura o título de residência e que todos podem viver connosco de forma
totalmente legal.
Diria também que, para efeitos de atribuição da nacionalidade, é ainda arriscado dispensarmos da presença
legal em Portugal quem aqui esteja de forma não regular, pelo menos, durante um período de seis anos. Porque
mesmo nesse caso, olhando para as múltiplas capacidades e oportunidades, que a lei portuguesa hoje oferece,
de regularização daqueles que connosco partilham os seus destinos, é estranho — e raro, até — encontrarmos