I SÉRIE — NÚMERO 80
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Mas continuemos a ouvir as pessoas. Os sentimentos de distância face ao poder e o clima de desconfiança
ainda revelam níveis preocupantes. E os ataques mal-intencionados ao Parlamento e aos seus membros
continuam a ver-se e a ouvir-se.
O 25 de Abril representou o fim da ditadura e o princípio do voto universal em Portugal. Não podemos aceitar
que o direito universal ao voto se torne numa formalidade, em que, de forma desproporcionada, os mais jovens
e os mais pobres se interessem menos pela vida política e participem menos nos atos eleitorais. Temos de
pensar seriamente em novas soluções, que ajudem a aumentar a influência política e eleitoral das novas
gerações e que contribuam para uma renovação da representação política.
Enquanto titulares de cargos políticos, temos o dever de ouvir e refletir, mas também de dar o exemplo e de
prestar contas aos portugueses. Saibamos todos, eu e todos nós, dar o exemplo e estar à altura do mandato
dos portugueses. Saibamos todos, eu e todos nós, distinguir aquilo que são as legítimas e desejáveis clivagens
democráticas do que são as responsabilidades que temos perante as regras e o funcionamento das instituições
da democracia.
E falando em prestação de contas, importa dar a conhecer as primeiras propostas do Grupo de Trabalho
para o Parlamento Digital, que lancei há precisamente um ano. Num ano, e no âmbito das atividades do Grupo
de Trabalho para o Parlamento Digital, foi possível prever a desmaterialização do processo legislativo,
nomeadamente no circuito entre o Governo, a Assembleia da República, a Presidência da República e o Tribunal
Constitucional; preparar a renovação do site da Assembleia da República; criar mecanismos que permitem uma
maior interação com os cidadãos, como uma plataforma para a submissão de petições; simplificar os requisitos
para apresentação de iniciativas legislativas de cidadãos ou de referendos; criar instrumentos de democracia
direta, como a bolsa de perguntas e requerimentos.
Quero aqui felicitar o Sr. Vice-Presidente Jorge Lacão, que, aliás, não está cá porque está em minha
representação na Eslováquia, pelo trabalho de coordenação que tem desenvolvido. E quero saudar o espírito
de compromisso democrático que tem pautado a atuação de todos os grupos parlamentares neste Grupo de
Trabalho que lancei há um ano.
Entretanto, por intermédio do Sr. Deputado Fernando Negrão, posso também testemunhar que dos trabalhos
da Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas, onde já tiveram lugar
valiosas audições, resultaram importantes contributos para melhorar os mecanismos de fiscalização, que já
foram hoje aqui falados, criando regras claras, comportamentos de exigência e soluções que correspondam a
uma democracia cada vez mais qualificada.
Minhas Senhoras, Meus Senhores, Sr.as e Srs. Deputados, olhemos também para os desafios estratégicos
de Portugal. A União Europeia e as relações transatlânticas são assuntos evidentemente estratégicos para nós.
Ora, é precisamente o futuro da União Europeia e das relações transatlânticas que está em jogo, neste tempo
histórico em que vivemos.
Portugal tem feito o seu trabalho na Europa. Contudo, sabemos que o cumprimento das nossas obrigações
é condição necessária, mas não suficiente, para o sucesso dos objetivos nacionais e europeus. Veja-se, por
exemplo, a ameaça da extrema-direita, que continua visível em França.
Não basta, a este respeito, falar em populismo. Acho que é um conceito que normaliza o que não é normal
em democracia: as derivas autoritárias, os ataques à liberdade de imprensa, o racismo, o fechamento económico
e social, o medo da diferença e do pluralismo. Isto não é nenhum novo populismo. Isto é a velha extrema-direita
autoritária, nacionalista e xenófoba!
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Às vezes não damos o devido valor àquilo que temos e esquecemos a dimensão daquilo que conseguimos.
Há quem fale de fadiga democrática e de desencanto europeu, mas foi a democracia e o projeto europeu que
garantiram o desenvolvimento e o mais duradouro período de paz no nosso velho continente. Recordemos as
sábias palavras de um grande europeísta, François Mitterrand: «o nacionalismo é a guerra».
Temos de aperfeiçoar a política monetária, temos de encontrar mecanismos em que a dívida não estrangule
o crescimento; temos de coordenar a governação económica; temos de harmonizar a fiscalidade, temos de
combater o terrorismo e garantir a nossa segurança e defesa; temos de integrar melhor os imigrantes e os
refugiados; temos de reforçar as políticas de coesão e de emprego; temos de fazer isso tudo, porque sabemos