4 DE NOVEMBRO DE 2017
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estratégia proclamada, reverteu objetivos, abandonou prioridades e desistiu de apostas, sem nunca o dar a
conhecer nem ter a frontalidade de o reconhecer.
Afinal, aquilo que a Assembleia da República aprovara e que as pessoas, os agentes económicos, e
particularmente os serviços públicos tanto esperavam, ficou longe, bem longe do executado.
Diga-se que com a cumplicidade sonsa de uma maioria parlamentar que sempre fingiu não perceber a farsa
e, sistematicamente, preferiu demitir-se da exigência do cumprimento do aprovado, como é de regra em
democracia.
Aplausos do PSD.
O triste espetáculo da encenação de espanto, ensaiada pelos parceiros da maioria social comunista ao ser
exposta e revelada a real expressão dos cortes cegos operados pelas cativações, do histórico garrote ao
investimento público ou da trajetória do endividamento e do crescimento dos pagamentos em atraso, só rivaliza
em dimensão com a mansidão que exibiram, meses a fio, no encobrimento de uma realidade que lhes era, de
todo, impossível desconhecer.
Convenhamos pois que, em matéria orçamental, nada tem de edificante o comportamento e o exemplo deste
Governo e da singular maioria de cinco partidos que nesta Câmara o apoia.
Ainda assim, Sr.as e Srs. Deputados, é nossa obrigação, ao analisarmos e discutirmos o Orçamento do
Estado, interrogarmo-nos sobre qual é a visão e qual é a ambição que deste documento e do debate que sobre
ele aqui travámos podemos retirar.
É este um Orçamentoque denota plena consciência e, sem reservas, assume, na plenitude, a prioridade da
emergência nacional de uma empenhada e decisiva resposta à tragédia de Pedrógão, tragédia que teve lugar
quatro meses antes da sua entrega a esta Assembleia, emergência desesperadamente reforçada pelo colapso
do Estado na proteção das pessoas e do território no passado mês de Outubro?
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É este um Orçamento que estanque a míngua a que, nos últimos
dois anos, serviços públicos essenciais — da saúde à segurança, da educação aos transportes — têm sido
votados cegamente pela opção política do Governo em privilegiar a distribuição de dinheiro para grupos
específicos, à custa da qualidade e, em alguns casos, da falência ou rutura na prestação de serviços públicos
que o Estado, a todos, deve prestar?
É este um Orçamento que aproveita, com inteligência, os ventos favoráveis do momento cíclico de
crescimento económico, alavancado pela conjuntura positiva dos nossos parceiros comerciais, pelo boom das
receitas proporcionadas pelo turismo, pelas gordas transferências de dividendos do Banco de Portugal ou o
baixo preço do petróleo, para reduzir a despesa estrutural, que é rígida, e para baixar nominalmente a dívida,
realizando uma efetiva consolidação orçamental?
É este um Orçamento que aposta na estabilidade fiscal e no incentivo dirigido às empresas e aos sectores
mais dinâmicos para criar as condições e promover a captação de investimento, a criação sustentada de riqueza
ou dinamizar o tão necessário crescimento da poupança nacional, que lhes é pressuposto incontornável?
É este um Orçamentoque apresenta, e nos permite percecionar, uma estratégia sustentada de
desenvolvimento, no médio e longo prazos, alicerçada numa concreta capacidade reformista, que nos permita
antecipar e responder à evolução permanente dos nossos concorrentes, numa economia que se desenvolve
numa imparável lógica de globalização?
É este um Orçamentoque arrepia caminho na insana aventura de replicar a maioria dos erros que nos
trouxeram, em 2011, à antecâmara da bancarrota e que rompa com a estúpida ideia de acreditar na hipótese
de que é possível fazer tudo da mesma maneira e esperar que, desta vez, o resultado seja diferente?
Sr.as e Srs. Deputados, com certeza que cada um de nós pode ainda formular outras ou mais interrogações,
mas alguma Deputada ou Deputado deste Parlamento pode, em consciência e sem reserva mental, responder
afirmativamente a todas ou, pelo menos, a uma confortável maioria das questões enunciadas, questões que
obrigatoriamente a todos devem interpelar?