23 DE FEVEREIRO DE 2018
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Acho, no entanto, que devemos ajustar um pouco as expectativas quanto ao alcance da longuíssima e
vastíssima proposta de lei que nos chega. A própria Diretiva assume como objetivo, que foi aqui também
repetido, tornar os mercados financeiros mais seguros e restaurar a confiança no mercado financeiro no período
pós-crise.
Srs. Deputados, não é fazendo pequenas alterações às regras de comercialização de produtos financeiros
que se garante a estabilidade do mercado financeiro. Aliás, basta ver o que aconteceu na bolsa de Nova Iorque
há uma semana ou duas, quando o Dow Jones veio abaixo, literalmente, porque houve uns bancos de
investimento que decidiram apostar no inverso do índice de volatilidade. Ou seja, o ridículo foi a este ponto:
tanto apostaram que o mercado ia ser calmo que o volume de apostas criou uma tempestade nos mercados
financeiros e lá veio a bolsa norte-americana por aí abaixo.
Portanto, Srs. Deputados, nada mudou desde a crise. O sistema financeiro não mudou, o sistema financeiro
está pior e vai ficar pior, porque aquilo que a União Europeia se prepara para fazer com o mercado único de
capitais a nível europeu, com mais integração e mais liberalização, é dar mais espaço aos bancos de
investimento, dar mais espaço à especulação, dar mais espaço à «banca sombra», e nada disso trará
estabilidade ao sistema.
Por isso, sejamos honestos quanto às expectativas: aquilo que se está a fazer em termos de regulamentação
de mercados financeiros é a aumentar a instabilidade. Depois, há pequenas medidas para tentar mitigar alguns
dos problemas que, no fundo, não resolvem nenhum problema. O problema de fundo continua a estar presente,
porque não se limita a especulação, porque não há controlo público sobre a banca, porque não é possível ter
um sistema financeiro capaz de servir as economias.
Há uma outra questão sobre a venda de produtos financeiros: em muitos casos, em Portugal, tanto no BES
(Banco Espírito Santo) como no BANIF (Banco Internacional do Funchal), os produtos financeiros não eram
necessariamente complexos; noutros casos, a informação foi dada, mas as pessoas simplesmente não tinham
capacidade para perceber a informação que lhes estava a ser dada; noutros casos, existiam regras para
transmissão de informação, mas essas regras foram violadas, houve uma violação da lei e uma venda
fraudulenta.
Srs. Deputados, as novas regras serão necessariamente úteis, e estamos disponíveis para as discutir em
sede de especialidade, mas elas não vão à raiz do problema. Para ir à raiz do problema é preciso, pura e
simplesmente, separar os balcões da banca, para que quem quiser fazer um depósito não o faça no mesmo
balcão onde se compra um produto arriscado. Assim, não corremos o risco de alguém dizer que há uma
obrigação de capital garantido — porque é isso que é vendido —, quando esse capital é garantido pelo banco,
mas não é garantido pelo Fundo de Garantia de Depósitos, que é o Estado.
Por isso, para cortar o mal pela raiz é preciso separar, é preciso proibir definitivamente que certos
instrumentos especulativos sejam transacionados nos mercados financeiros e é preciso também, já agora,
proibir a venda de instrumentos de capitalização dos acionistas aos balcões dos próprios bancos, que foi aquilo
que vimos em vários dos casos de falências bancárias e que criou milhares de lesados.
Portanto, Srs. Deputados, não vamos inviabilizar esta proposta de lei, estamos disponíveis para a discutir,
mas temos expectativas muito humildes quanto à sua capacidade quer para proteger os clientes bancários quer
para trazer alguma estabilidade à banca. Achamos que nenhum destes objetivos ficará cumprido com esta
proposta de lei.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Mais uma vez, a Mesa não regista inscrições, pelo que vamos passar
ao próximo ponto da ordem de trabalhos…
Pausa.
O Sr. Deputado João Galamba está a pedir a palavra? É que já esteve inscrito e não é acenando como se
estivesse no meio do mar que se inscreve, tem outros meios tecnológicos mais avançados para o fazer.
Risos e aplausos dos Deputados do PSD e do CDS-PP.