22 DE FEVEREIRO DE 2019
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Se é verdade que a taxa de pobreza se reduziu nos últimos anos, com cerca de 100 000 pessoas a abandonar
esta situação, a verdade é que Portugal continua a ser um dos países da Europa com maior taxa de pobreza e
maiores níveis de desigualdade.
Haver 1 milhão e 700 mil cidadãos, dos quais muitos são crianças e jovens, em situação de pobreza no nosso
País é um facto que não pode deixar de nos ofender e de motivar a nossa ação.
Há um imenso caminho a percorrer para erradicar este fenómeno. O último plano de ação para a inclusão foi
em 2010 e, depois disso, houve algumas medidas, sim, mas Portugal continua a não ter uma estratégia
integrada, transversal a todas as políticas de combate e erradicação da pobreza.
Em 2008, a Assembleia da República declarou, por unanimidade, que a pobreza conduz à violação dos
direitos humanos. Os anos que se seguiram mostraram que esse compromisso estava longe de ter
consequência nas escolhas políticas, designadamente no período da troica e do anterior Governo.
De facto, o combate à pobreza diz respeito a todas as políticas e não pode fazer-se sem atacar o conjunto
das suas causas. As mudanças na legislação laboral, políticas salariais, negociação coletiva, contribuem para
agravar ou para combater a pobreza. O mesmo pode dizer-se de todas as políticas sociais, da proteção no
desemprego ou das pensões, onde a pobreza entre os idosos, sobretudo entre as mulheres, é também uma
condenação por causa das pensões baixas e de carreiras contributivas degradadas, ou da questão dos
cuidadores e das cuidadoras que são também empurrados frequentemente para a pobreza pela ausência de
respostas sociais que lhes sejam dirigidas.
Se falamos de políticas educativas, falamos de um instrumento de combate à pobreza e sabemos da
interseccionalidade entre pobreza e racismo, bem como entre pobreza e todas as outras formas de desigualdade
e de discriminação. Entre pobreza e saúde há uma relação forte e inequívoca: quanto mais doente, mais pobre
e quanto mais pobre, mais doente.
Falamos do combate à pobreza quando tratamos da habitação, a maior despesa de tantas famílias. As
medidas que protegem as pessoas ou que promovem os despejos, que garantem habitação pública ou que a
entregam ao mercado, têm um impacto direto no agravamento da pobreza.
O combate à pobreza exige, pois, uma atenção e uma consciência em todo o espectro da intervenção política.
Há uns anos, a Rede Europeia Anti-Pobreza (REAPN) lançou um desafio que é simples, mas, ao mesmo
tempo, subversivo: e se, antes de se discutir qualquer lei, se avaliasse não apenas o seu impacto no Orçamento
mas também o seu impacto sobre a pobreza? Ou seja, quando se discute o aumento do número de alunos por
turma ou o encerramento do centro de saúde, quando se debate o valor do salário mínimo ou as regras do
subsídio de desemprego, a lei das rendas ou os passes de transporte, o valor das pensões ou o abono de
família, qual o efeito previsível que essa proposta tem na produção, na manutenção ou no agravamento da
pobreza e da exclusão social?
Foi esta ideia que o Bloco de Esquerda converteu em projeto de lei, prevendo também neste processo de
avaliação mecanismos de participação das pessoas em situação de pobreza, das organizações da sociedade
civil e das instituições de investigação e produção de conhecimento, prevendo uma avaliação sucessiva de
impactos.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Termino, Sr. Presidente, com este apelo, que é para todos: que se aprove
este projeto de lei e que se dê o sinal de que este não é um tema apenas para dias solenes mas uma
preocupação que passará a perpassar todos os debates deste Parlamento.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Rui Cruz, do PSD.
O Sr. Rui Cruz (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de muitas políticas para combater
a pobreza, depois de muitos louvores à governação, depois de muitas juras ao fim da austeridade — ainda hoje,
aqui! —, depois de muitos milagres e fintas geniais, a pobreza existe em Portugal com uma dimensão que nos
deve envergonhar, que deve envergonhar o Governo.