6 DE ABRIL DE 2019
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Se há coisa que é impensável ser objeto de um ato comercial é um órgão humano. É uma indignidade, uma
violência atroz, uma situação que fere os mais básicos valores da vida. É um crime hediondo, uma realidade
cruel que, infelizmente, não podemos ignorar. É uma matéria, Sr.as e Srs. Deputados, que justifica o debate de
hoje e que nos deve unir a todos. O tráfico de órgãos humanos é um ultraje à dignidade humana e ao direito à
vida, aos valores, aos princípios e aos direitos mais importantes da humanidade.
O comércio de órgãos humanos e o tráfico de pessoas para remoção de órgãos tornou-se um problema
global e já constitui uma das práticas criminosas mais lucrativas do mundo. É uma situação, Sr.as e Srs.
Deputados, verdadeiramente horrenda, que se aproveita da escassez de órgãos, da fragilidade da doença e da
pobreza.
Sr.as e Srs. Deputados, a enorme procura de órgãos humanos originou um mercado negro — onde, por
exemplo, um rim pode custar cerca de 500 000 € —, redes internacionais de crime organizado, muitas vezes
com dimensão transnacional, e até um turismo de transplantação.
A iniciativa do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, justifica-se, mas, a nosso a ver, peca por ser tardia. Justifica-
se, tendo em conta que o Código Penal e a Lei n.º 12/93 não contemplam de forma suficiente e autónoma a
tipologia das condutas previstas na Convenção do Conselho da Europa sobre o tráfico de órgãos de humanos,
mas peca por tardia, porque vem com um atraso de cerca de quatro anos, após a assinatura pelo Estado
português da Convenção de Santiago de Compostela.
A Sr.ª Elza Pais (PS): — Vocês é que não a ratificaram! Podiam tê-la ratificado quando estavam no Governo!
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, esta tem de ser uma luta global travada
em dois planos: no plano da criminalização daquele que é um crime hediondo e no plano dos avanços científicos.
Qualquer um destes planos, Sr.as e Srs. Deputados, requer empenhamento e investimento por parte dos
decisores políticos.
Sr.as e Srs. Deputados, a união de todos, ou seja, a união das diferentes forças partidárias em Portugal é
imprescindível para o combate e para a prevenção do tráfico de órgãos humanos.
O PSD está, obviamente, disponível para discutir a introdução de novas infrações para fortalecer a lei e para
incrementar a cooperação jurídica nesta matéria.
Por isso, votará, na generalidade, a favor desta iniciativa, dando assim um sinal claro e inequívoco a todos
os que se dedicam à prática deste crime monstruoso.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Cunha, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Esta proposta de lei, que
concretiza as ideias da Convenção contra o tráfico de órgãos humanos, vai no sentido correto de apertar a malha
contra um crime que não conhece fronteiras e que, por isso mesmo, merece que todos os países adotem
soluções semelhantes para que a punição destes comportamentos seja uma realidade.
Esta é uma proposta que merece o nosso apoio, à semelhança, aliás, da Resolução da Assembleia da
República que aprovou esta Convenção e que mereceu o voto favorável de todas as bancadas parlamentares.
No geral, registamos que a proposta do Governo respeita o espírito da Convenção, que, relembre-se,
consistia em criar um crime autónomo de tráfico de órgãos humanos, reforçar a cooperação internacional e
garantir a proteção das vítimas e das testemunhas. Das alterações aqui trazidas, destaco algumas que nos
parecem ser especialmente importantes.
A necessidade de proteger as vítimas destes crimes está aqui presente com soluções que vemos com bons
olhos. Refiro, em primeiro lugar, o facto de se permitir que as vítimas possam prestar declarações para memória
futura, algo que o Bloco de Esquerda tem defendido para outros crimes e que é um recurso absolutamente
essencial para se proteger a prova e para evitar efeitos revitimadores. Este é, portanto, um bom caminho.
Assim como é um bom caminho que esteja consagrada a proibição da publicação, por qualquer meio, da
identidade da vítima, garantindo a reserva da sua identidade e da sua privacidade.