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I SÉRIE — NÚMERO 91

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Os Parlamentos são, pela sua natureza, uma das grandes fontes de notícias. Elas, as notícias, resultam do

papel único que o seu promotor assume nas democracias pluralistas e decorrem do permanente escrutínio que

essa realidade obriga.

Ações e omissões, do todo ou de parte, dos grupos ou dos Deputados, transportam para a opinião pública,

para os cidadãos, os sentidos da aprovação ou da reprovação, da mobilização ou da contestação.

Em todo o mundo democrático assistimos a um questionar do papel dos Parlamentos, a uma ponderação do

exercício da representação eleitoral. Também em Portugal, apesar de vivermos uma democracia mais recente

e, portanto, podermos consagrar um outro estádio nas perceções sobre o papel do mesmo Parlamento, temos

vindo a verificar uma erosão da imagem da Assembleia da República (AR) e, também, dos que assumem a

«deputação» em cada círculo.

Nos primeiros dois anos desta legislatura, a AR reganhou importância e garantiu, para si, uma outra

centralidade nas decisões políticas. Tal ficou a dever-se a uma circunstância muito especial em que o partido

que governa não foi o que obteve o maior número de assentos e a «coligação» que o suporta encerra em si,

fruto de realidades históricas e ideológicas várias, muitas singularidades.

Depois de uma intervenção externa que levou o País a um profundo sofrimento, depois de ter sido possível

encontrar uma solução mínima que não se pode manter por muito mais tempo (porque resulta da militância

contra um inimigo já desaparecido), depois de aprovados quatro Orçamentos, em situações que assinalaram

uma opção quase infactível entre contenção do défice e redução da dívida e o aumento da despesa corrente, o

Parlamento parece ter deixado, nestes últimos meses, de garantir o interesse inicial que referimos para dar

espaço a outras e velhas questões que precisam de ser olhadas de frente e com coragem.

Sempre foi fácil, em Portugal ainda mais, encontrar nos políticos uma espécie de «bombo de festa» para

neles se refletir o descontentamento dos seres individuais ou organizados. Também se evidenciou, sempre, uma

matriz, presente ainda e infundida pelo salazarismo, de considerar os políticos, o debate político, como coisa

horrenda. Por outro lado, constata-se uma ideia muito camiliana, qual Calisto Elói, de que o Deputado quando

vem para Lisboa deixa de ter uma ligação permanente ao seu espaço de eleição e, por isso, os abonos que

recebe não são mais que acrescentos remuneratórios indevidos e resultantes de «esquemas»1.

Ora, perante todas estas circunstâncias, o que devem fazer os Deputados? O que deve fazer o Parlamento?

No início desta legislatura havia já um conjunto de desassossegos que importava analisar e alterar. Foi por

isso que a AR aprovou uma resolução que permitiu a «constituição de uma comissão para o reforço da

transparência no exercício de funções públicas»2.

Essa comissão avocou seis áreas de trabalho: a) Regime de exercício de funções; b) Condições de

desempenho do mandato; c) Controlo público de riqueza; d) Regime de incompatibilidades e impedimentos; e)

Regime de interesses e prevenção de conflito de interesses; f) Regime de responsabilidade.

Para além de todas estas obrigações, a Comissão avaliaria a criação de uma entidade que recebesse

responsabilidades no universo da verificação da transparência e, ainda, trabalharia no sentido de ponderar um

regime de regulação da atividade de lobbying.

Não cumpre encontrar agora as razões (haverá muitas e algumas já se espraiaram na comunicação social)

para justificar a pouca «perspicuidade» do labor da mesma comissão, cujo prazo de funcionamento se prolongou

já pela quarta vez3. Não cumpre também antecipar a quase impossível verificação da evolução dos seus

trabalhos. O Parlamento português não é um exemplo na execução do reporte formal sistemático e para isso

não tem contribuído muito a realidade partidária e a atenção da generalidade dos Deputados4.

Acontece que, para além destas matérias, os últimos dois anos identificaram um outro conjunto de dúvidas

e dificuldades a que não podemos deixar de dar atenção. A Assembleia da República aprovou hoje algumas

alterações ao regime relativo a remunerações e subsídios. Um erro. Nem as inovações são suficientes nem

sequer olham para credibilização da função parlamentar. Os portugueses vão achar que é pouco, os Deputados

1 Ver: Programa Parlamento de 8 de dezembro – considerações da jornalista Luísa Bastos e explicações de Pedro Filipe Soares e António Filipe - https://www.rtp.pt/play/p4252/e378691/Parlamento

2 Ver: https://dre.pt/home/-/dre/107692696/details/maximized

3 Ver: https://www.publico.pt/2018/07/11/politica/noticia/prazo-da-comissao-da-transparencia-alargado-pela-quarta-vez--agora-para-fim-de-marco-1837681

4 Ver: https://ionline.sapo.pt/596800