I SÉRIE — NÚMERO 105
12
A Procuradoria Europeia é uma instituição criada para investigar a fraude contra interesses financeiros da
União Europeia. E colocamos a questão de saber que interesses financeiros tem a União Europeia, qual é, no
fundo, o bem jurídico que é aqui objeto de proteção.
Por exemplo, uma agência de rating que sobe ou desce o valor de uma determinada economia ao sabor de
interesses e de cálculos de ganho de «fundos abutres», comete ou não uma infração contra os interesses
financeiros da União Europeia?
E quem é que são os sujeitos dessas infrações? Quando um Estado acumula sucessivamente superavits
contra os tratados, comete ou não uma infração contra os interesses financeiros da União Europeia?
Por outras palavras, vai a Procuradoria Europeia fazer investigação criminal contra determinados Estados
que cometem estas infrações, contra determinados atores que cometem estas infrações?
Estas são questões que, naturalmente, deveriam ser respondidas.
É verdade que há práticas de criminalidade económica instaladas na União Europeia a coberto de regimes
que são acolhidos pelos Estados-Membros, regimes como o dos vistos gold e o dos offshores, ou o regime para
não residentes, assim como regimes que facultam a evasão fiscal e a elisão fiscal ou o branqueamento de
capitais.
Portanto, a eficácia recomenda formas de cooperação forte e adequações de escala.
Há, nesta proposta de lei várias incoerências, aliás, apontadas nos pareceres que foram emitidos, desde
logo, pela Procuradoria-Geral da República, na previsão das tipologias de crime aqui envolvidas ou na própria
identificação de quem pode ser procurador europeu. Tudo isso é necessário corrigir, naturalmente, no trabalho
de especialidade, porque, de outra maneira, o que teremos diante de nós é uma figura que se arrisca a criar
mais entropia onde ela não deve existir, que é justamente no combate eficaz, determinado, corajoso e
politicamente empenhado contra a criminalidade económica, seja quem for o seu ator, seja qual for a prática
que esteja em causa.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves
Moreira, do PS.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Justiça e Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por dizer que para refutar a
referência feita pelo Sr. Deputado do PSD à falta de empenho deste Governo no combate à corrupção, basta-
me fazer menção ao investimento feito, nomeadamente, nos meios do Ministério Público e da Polícia Judiciária
e compará-lo com o que foi feito pelo anterior Governo, para dizer que isso só pode ter sido uma afirmação de
má consciência.
Voltando ao ponto que nos ocupa, já foi referido que, por um lado, a Proposta de Lei n.º 192/XIII/4.ª trata de
dar execução, no nosso ordenamento jurídico, ao Regulamento europeu que estabelece uma cooperação
reforçada para a instituição da Procuradoria Europeia.
Estão em causa competências para o exercício da ação penal nos Estados-Membros quanto às infrações
lesivas dos interesses financeiros da União Europeia, nomeadamente crimes que são, reconhecidamente,
tendencialmente complexos, que podem envolver vários agentes, recorrendo a mecanismos fraudulentos que
atingem diversas jurisdições dos Estados-Membros da União Europeia.
É por isso que o êxito do inquérito e a eficácia da investigação requerem um conhecimento profundo do
quadro jurídico aplicável, tanto mais que, frequentemente, a dificuldade de uma cooperação eficaz entre os
Estados-Membros reside na diferença dos sistemas jurídico-penais, na incerteza quanto à jurisdição, na
onerosidade dos recursos envolvidos e nas diferentes prioridades atribuídas pelos Estados-Membros às
investigações.
A Procuradoria Europeia procura vir ultrapassar obstáculos relacionados com constrangimentos na
cooperação entre Estados-Membros e diferenças e incertezas nos vários sistemas jurídicos, funcionando como
instância única em todos os Estados-Membros participantes, não dependendo dos instrumentos tradicionais do
direito da União Europeia para a cooperação entre as diversas autoridades judiciárias, naquele âmbito de
competência.