17 DE SETEMBRO DE 2020
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Para este debate, queremos partir da premissa do Primeiro-Ministro, e cito: «Só a precaução pode diminuir
a ansiedade. A direção da escola, os professores, os assistentes e os técnicos podem fazer o melhor trabalho
possível, mas, se cada aluno ou família não fizer o melhor possível, então, não funciona.»
A questão é esta: terá o Governo feito o suficiente para lavar assim as suas mãos dos riscos em cima do
comportamento cívico dos alunos e das famílias?
Se, hoje, as famílias podem confiar os seus filhos e filhas à escola pública é porque as escolas e os
profissionais da educação esticaram toda a corda que tinham para garantir a segurança de todos. Não é justo
dizer que o Governo tenha feito tudo o que podia para lhes facilitar a vida. Era possível ter ido mais longe e mais
cedo: no desdobramento de turmas, para aumentar o distanciamento, como o Bloco de Esquerda propôs em
junho; na contratação atempada de professores e funcionários; na clareza sobre a proteção de grupos de risco,
sobre o acompanhamento pedagógico dos alunos em quarentena e sobre um conjunto de outras matérias
sanitárias.
A falta de preparação dá sempre lugar ao improviso. Como a gestão do risco ficou para as escolas, estas
tentam controlá-lo como podem, surgindo outros perigos que também não devemos desprezar, como o de
transformar a escola numa experiência dolorosa para todos. Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance
para que crianças de 12 e 16 anos não tenham de ficar o dia inteiro dentro da sala de aula, intervalo após
intervalo, aula após aula, tendo até de fazer as refeições dentro dessa sala, proibidos de sair da escola sequer
para ir almoçar a casa. A sala de aula não pode ser uma prisão.
A partir daqui, temos de pensar o que poderia ter sido feito. Que problemas estruturais da escola pública é
que o Governo ignorou, mesmo perante uma pandemia que os tornou ainda mais graves?
Primeiro: equipar as escolas com material informático não deveria depender de um contrato milionário, o qual
foi prometido para o início das aulas, mas que afinal só chega no Natal. Deveria ser da gestão orçamental de
cada escola ter a dotação suficiente para comprar o material informático de que precisa — sempre, não apenas
em tempo de pandemia.
Depois, a diminuição do número de alunos por turma já deveria estar mais avançada. Tem todas as
vantagens e já deveria ter avançado.
Quanto ao rejuvenescimento da classe docente, deveria olhar-se de frente para o problema. Metade dos
professores vão reformar-se em três ou quatro anos e não há quem os substitua. E é a esses professores que
agora vamos pedir que integrem a linha da frente.
Como é possível falar de um ano letivo bem preparado quando, só nesta semana, no início do ano letivo, já
faltam professores em 600 escolas, mesmo sem contar com aqueles que pertencem a grupos de risco e vão
deixar as escolas?
A escola pública precisa de sangue novo e precisa de futuro. A escola pública também precisa, e já precisava,
de contratar funcionários. Há sete meses que a portaria de rácios está por rever, de acordo com a proposta do
Bloco de Esquerda aprovada no Orçamento do Estado. Há sete meses que a contratação de funcionários
depende da alteração da portaria de rácios, apenas para responder à normalidade da escola pública, já para
não falar do acréscimo que é agora necessário para a limpeza e para o alargamento de horários.
Esta foi uma oportunidade perdida para se encontrar na pandemia e nas respostas à pandemia as respostas
aos problemas estruturais da escola pública. O Ministério da Educação abdicou de ser um estratega de políticas
de educação para passar a ser um gestor avarento, que tenta sempre regatear com as escolas os recursos de
que, como está à vista de todos, elas precisam.
Neste momento, é preciso fazer aquilo que ainda for possível, dado que o Governo não fez tudo o que podia.
Ainda é possível contratar e vincular os funcionários que as escolas dizem ser necessários para a higiene,
limpeza e alargamento de horários. Ainda é possível fazer já a contratação de professores que sabemos que
irão ser necessários ao longo do ano. Ainda é possível dar a autonomia e os recursos necessários às escolas,
para estas adaptarem as suas estratégias ao longo do ano letivo e para poderem fazer o tão necessário
desdobramento de turmas. Como o próprio Primeiro-Ministro disse, não são as paredes das escolas que
transportam o vírus, quem o transporta são as pessoas e, portanto, não é igual estarem 16, 20 ou 28 alunos
entre as mesmas paredes da escola.
É inegável que qualquer país com estas condições poderia estar mais preparado para enfrentar esta
pandemia. Preparar o ano letivo não é correr atrás do prejuízo e a contar que as escolas façam muito com
pouco, e a verdade é que o Governo não fez tudo o que podia.