I SÉRIE — NÚMERO 3
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Bom, tivemos uns anos de alguma recuperação que permitiram que estas empresas sobrevivessem, mas
sempre no limiar da sua capacidade de sobrevivência. E, quando chegámos ao ano de 2020, a situação não era
tão má como nos anos anteriores, mas ainda não era uma situação boa.
O aparecimento desta pandemia, que obrigou muitas empresas ao encerramento forçado, por razões que
todos conhecemos, conduziu muitas empresas a uma situação absolutamente catastrófica do ponto de vista da
sua sobrevivência. O que sucede é que as empesas que estão no âmbito dos programas previstos relativamente
à aplicabilidade desta proposta de lei, as empresas que estão em processos de insolvência ou em processos
especiais de revitalização são uma escassa margem das empresas portuguesas. Portanto, podemos dizer que
esta proposta de lei, a ser aprovada, na sua aplicação terá um efeito, na melhor das hipóteses, marginal, para
não dizer praticamente nulo, relativamente à situação do tecido empresarial das micro, pequenas e médias
empresas do nosso País.
O relatório, já aqui citado, da Ordem dos Advogados, entregue à Assembleia no âmbito deste processo
legislativo, chama também a atenção para isso e até sugere uma série de medidas concretas que deveriam ser
tomadas, portanto até esta iniciativa legislativa poderia ser aproveitada para isso. Mas o que nos parece
fundamental é que as respostas encontradas no âmbito da justiça, no âmbito dos processos de insolvência, têm
um caráter extraordinariamente limitado perante a dimensão das dificuldades com que estas empresas se estão
a deparar — refiro a situação das empresas familiares, nomeadamente na restauração, que estiveram fechadas
durante largo tempo e que ainda hoje não podem funcionar na plenitude da sua capacidade e refiro outros
pequenos negócios familiares, que estão numa situação absolutamente aflitiva — e não é com iniciativas com
este alcance que o problema poderá ser enfrentado.
O que se exige é que haja um esforço nacional de apoio ao tecido económico português, de apoio à
sobrevivência de milhares de pequenas empresas que têm a sua continuidade absolutamente comprometida,
pois, mesmo num quadro em que já podem funcionar, estão confrontadas com um ambiente recessivo que,
obviamente, muito prejudica a sua capacidade de recuperação. E, portanto, impõem-se medidas muito mais
eficazes e efetivas de apoio a estas empresas.
Por isso, podemos dizer que, com esta proposta de lei, sendo aprovada, não vem mal nenhum ao País, mas,
de facto, é preciso fazer muito mais e ter uma ação com um alcance muito superior ao que aqui é proposto.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta que o Governo nos traz tem duas dimensões, uma política e outra jurídica.
A proposta política é evidente: trata-se de alargar o prazo para o regime de recuperação de empresas, o que
temos de reconhecer que tem um mérito, o da proibição da suspensão de serviços essenciais, como a água, a
luz, etc. É algo que há muito já deveria ter sido feito em empresas nestas situações.
Mas não foi além, como poderia ter ido, como, por exemplo, na isenção das taxas de justiça, conforme nota
a Ordem dos Advogados. Poderíamos ter feito muito mais nesta matéria, sobretudo para empresas que estão a
sentir na pele a asfixia da crise.
E não só: por exemplo, em matéria de recuperação de créditos, não deveríamos ter enfraquecido a posição
dos credores, porque também eles se podem tornar empresas em dificuldade, no atual contexto da pandemia.
Este é um grande erro que esta proposta comete: faz uma redução do prazo de reclamação de créditos dos
credores e pode torná-los, a muito curto prazo, também eles em empresas em dificuldade.
E porque não também os juros de mora? Porque não fomos capazes de tocar num ponto em que todo o País
falava, o perdão total dos juros de mora destas empresas, que, muitas vezes, não têm sequer condições para
pagar a água e a luz? Este é um passo que poderíamos ter dado e não demos.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.
O Sr. André Ventura (CH): — Termino já, Sr. Presidente.