28 DE OUTUBRO DE 2020
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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Em segundo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, queria deixar-lhe uma outra observação.
O Sr. Primeiro-Ministro animou a sua bancada parlamentar — o que é perfeitamente legítimo, entenda-se
—, alegando que o Bloco de Esquerda «deserta da esquerda para se juntar à direita no voto deste Orçamento
do Estado».
Pois muito bem, Sr. Primeiro-Ministro, queria falar-lhe de uma deserção sistemática do PS para se juntar à
direita. Queria, justamente, falar-lhe da aliança sistemática entre o Partido Socialista e a direita em matéria de
leis do trabalho.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O que salta à vista é a determinação inamovível do Governo em manter, neste Orçamento, os ataques ao trabalho que foram impostos pela troica e pelo Governo do PSD e do
CDS-PP, e isso merece a nossa crítica frontal, bem o sabe.
Se há coisa que aprendemos com esta última crise, Sr. Primeiro-Ministro, foi que a compressão dos direitos
do trabalho foi parte essencial da estratégia de afundamento da nossa economia e da nossa sociedade.
Entre 2015 e 2019, juntámos forças com quem quis inverter esse caminho e fazer dos direitos do trabalho
uma alavanca essencial da reconstrução da economia e da aposta na coesão social. Um caminho que foi
começado, mas que, rapidamente, evidenciou limites que o Partido Socialista entendeu nunca franquear.
Agora que a crise social mais exige que o aprofundamento deste caminho seja o centro da política, esta
proposta de Orçamento do Estado desvia-se dele e mostra um Governo determinado em manter na lei os
ataques que a troica e o Governo das direitas impuseram ao mundo do trabalho.
A tal ponto é assim que o Governo rejeitou a proposta tradicional do Partido Socialista de calcular o valor
do subsídio de desemprego sobre o salário e não sobre o IAS. Mais ainda, o Governo rejeitou a proposta do
Bloco de Esquerda de voltarmos ao valor das compensações por despedimento anteriores a 2012.
Nessa data, 2012, em que o PSD e o CDS foram além da troica e passaram esse valor de 20 para 12 dias
de salário por cada ano de antiguidade, o PS exprimiu com clareza a sua indignação — uma indignação, aliás,
justíssima.
Dizia, na altura, o Sr. Deputado Nuno Sá: «Nunca o PS assumiu esse compromisso no memorando de
entendimento. Isto é que é rigor, isto é que é a verdade…».
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, creio que o meu tempo poderá descontar no tempo geral da bancada. Pedia-lhe essa tolerância.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, desconta no resto do tempo, mas as regras são de 2 minutos de tempo para pedir esclarecimentos e já vai no dobro.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Com certeza, Sr. Presidente. Vou terminar. Dizia, pois, o Sr. Deputado Nuno Sá: «Nunca o PS assumiu esse compromisso no memorando de
entendimento. Isso é que é rigor, essa é que é a verdade. Continuamos a não estar de acordo com esta
proposta».
E Vieira da Silva vincava: «É falso que o que estava previsto no memorando seja concretizado por esta
legislação, porque ninguém o reconhece, nem sequer os parceiros sociais».
Isto era em 2012. Agora, fazem vossa a proposta que foi além da troica.
Esta é, evidentemente, uma questão do PS consigo próprio, mas a esquerda não pode silenciar esta
escolha do PS e ser complacente com ela. Pela nossa parte, deixamos-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, uma
pergunta muito simples, para a qual pedimos uma resposta muito direta: por que razão rejeitou o Governo a
proposta de revogar esta norma humilhante, que nem a troica quis e que associa o PS ao pior do Governo
PSD/CDS-PP?