29 DE OUTUBRO DE 2020
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Perante este cenário, os Governos procuram conter a progressão da doença e anunciam novas e exigentes
restrições, perante o cansaço dos povos e a oposição crescente de algumas franjas da opinião pública. Mas,
por toda a Europa, independentemente de sistema de governo ou de orientação partidária, os números crescem
e as sociedades procuram responder à emergência.
A situação é grave em toda a Europa. Por muito planeamento, por muitos recursos que tenham à sua
disposição, Alemanha e França acabam de anunciar medidas mais restritivas.
Por isso, no mundo, em Portugal, o combate à pandemia, na frente sanitária e na frente económica e social,
continua a constituir a questão central que a nossa sociedade enfrenta e na discussão e votação do próximo
Orçamento do Estado tem de ser esta, também, a questão central.
Na frente sanitária, o reflexo desse objetivo, no Orçamento, está no reforço substancial dos serviços públicos,
com o SNS à cabeça; na frente económica e social, sublinha-se o reforço dos apoios ao emprego, dos estímulos
às empresas e das políticas sociais inovadoras.
Durante este debate, muito se discutiu o modo como a proposta de lei do Orçamento responde — mal,
disseram alguns — às necessidades dos serviços públicos e aos problemas sociais.
Agora, permitam-me que me detenha com mais atenção sobre a resposta na frente económica, cuja
discussão me pareceu singularmente distorcida nestes dois dias. E, para isso, tenho de partilhar com as Sr.as e
os Srs. Deputados três notas distintas, que são também respostas a questões levantadas durante o debate.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Benzam-se os liberais!
O Sr. Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital: — A primeira nota diz respeito à forma como são afetadas as nossas empresas, na frente económica. Para uma nação fortemente exportadora, como
Portugal se tornou nos últimos anos, a quebra da procura nos nossos principais mercados determinou um
impacto devastador.
As exportações caíram, de janeiro a agosto, 23,6% em termos homólogos. O investimento privado, perante
a incerteza da evolução da situação sanitária, decresceu significativamente e o consumo privado, tendo em
conta a quebra de rendimentos e o receio do futuro, contraiu para níveis de há vários anos.
Durante o debate, ouvimos alguns Srs. Deputados referirem que o Orçamento se esqueceu da economia,
que apenas «distribui o que tem e o que não tem» e se esquece da criação de riqueza, que as empresas é que
investem e criam emprego e que o Governo devia ter optado por apoiar as empresas através da redução de
impostos, ao invés de reforçar a despesa pública ou as transferências sociais.
Temos, no entanto, de ser francos. Se, nos últimos cinco anos, o crescimento da nossa economia foi
impulsionado pelas empresas, que investiram, exportaram, criaram emprego, a verdade é que, nos próximos
tempos, perante a incerteza da situação sanitária, não será o setor privado a puxar pela retoma.
Perante uma economia que cai, as empresas, se entregues a si próprias, cortariam custos — a começar
pelos custos do trabalho, despedindo ou reduzindo salários — e adiariam decisões de investimento. As
empresas mais sólidas poderiam, talvez, aguentar, à espera de melhores dias. As demais, particularmente as
micro, pequenas e médias empresas, que constituem 99% do nosso tecido empresarial, viriam a encerrar ou a
tornar-se insolventes, deixando de cumprir os seus compromissos com terceiros.
Em qualquer caso, as consequências económicas seriam devastadoras: desemprego galopante, destruição
de poupanças e de conhecimento acumulado, pobreza em crescimento e crise duradoura.
Perante uma economia que cai, as empresas não terão lucros; baixar o IRC, um imposto sobre os lucros, em
ano em que a crise vai apagar a rentabilidade, seria não só inútil, seria uma ironia cruel.
Hoje, as empresas sabem que não encontram num mercado em retração a possibilidade de sustentar a sua
atividade. Pelo contrário, empresas bem geridas, que vinham crescendo e criando empregos antes da pandemia,
reclamam, hoje — e bem! —, apoios do Estado: apoios ao pagamento de salários, apoios à dinamização da sua
atividade, apoios à sua capitalização, apoios à adaptação das suas instalações às novas regras sanitárias.
Por isso, perante uma economia em contração, é necessário que a política económica sustente o tecido
empresarial de uma forma que não pode vir do mercado. E é essa, precisamente, a opção do Governo.
Aplausos do PS.