I SÉRIE — NÚMERO 31
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Por isso, apresentamos três propostas. Desde logo, uma moratória ao aumento da TGR, para que o mesmo
ocorra apenas depois dos efeitos da pandemia no setor dos resíduos.
Propomos ainda que 30% da verba da TGR seja atribuída diretamente às autarquias — aliás, esta medida é
bastante importante, porque as autarquias estão obrigadas a implementar, até 2023, um sistema e um fluxo de
biorresíduos. Diga-se, ainda, que este fluxo de biorresíduos irá reduzir, em muito, a deposição em aterro e, por
essa via, reduzir o valor global da TGR a pagar.
Finalmente, propomos que seja implementada uma medida de transparência, a de que todas as despesas e
investimentos feitos com base na TGR sejam apresentados num relatório público.
O nosso objetivo é o de introduzir melhorias sistémicas, garantindo a redução e valorização dos resíduos.
São estas as nossas propostas, que esperamos possam ter caminho, em sede de especialidade.
Mas devemos olhar para o setor dos resíduos que incumpre todas — repito, todas! — as metas ambientais
a que está obrigado. O valor baixo da TGR é um dos problemas. Em Portugal, esse valor é de 11 €, quando, na
generalidade dos países da União Europeia, é de 80 €. Esta situação e a ausência de regras contribuiu para
uma transformação da estrutura económica do setor. Portugal transformou-se no caixote do lixo da Europa, mas
não só, pois também a Nigéria e Omã exportaram resíduos para Portugal, porque era barato.
Mas vejamos outros exemplos. A maior parte das empresas de resíduos sólidos urbanos deposita resíduos
a mais em aterro. Ora, isto tem um custo escondido: vamos ter de construir aterros antes do esperado.
A Cimenteira de Alhandra, por exemplo, está a mudar os seus fornos para queimar mais e para que o seu
grande negócio seja a coincineração, e já declarou que se não houver resíduos suficientes para queimar na
cimenteira não haverá problema, porque importará 60% dos resíduos.
Olhemos para a Valorsul. A Valorsul tem os seus principais proveitos na produção de energia elétrica a partir
da queima de resíduos: 31 milhões de euros, 55% do total das suas receitas. No entanto, esta queima de
resíduos é financeiramente insustentável. Assim, se antes era subsidiada diretamente através de um extra que
toda a população pagava na tarifa da eletricidade, agora, perante a oposição do setor a este sistema, o Governo
mudou a regra e passou a ser o Fundo Ambiental a financiar diretamente esta queima de resíduos. Pois bem,
temos o Fundo Ambiental a financiar algo que, ambientalmente, é negativo.
Parece irónico mas não é, é a essência do setor. Aconteça o que acontecer, sai sempre o jackpot à Mota-
Engil. E quanto pior é a sua performance, maiores são os seus rendimentos.
A política vigente para o setor tem sido um desastre ambiental e o Governo insiste no caminho de entregar
ao mercado as políticas públicas. No passado dia 10, o Governo entregou a definição das metas de reutilização
de embalagens às empresas produtoras, nomeadamente à Coca-Cola. Está bom de ver qual vai ser o resultado.
Por isso, anuncio, desde já, que o Bloco de Esquerda irá apresentar uma apreciação parlamentar à lei geral
de gestão de resíduos.
Concluo dizendo o seguinte: a privatização da EGF, durante o Governo de Passos Coelho, foi um erro
colossal e é urgente corrigi-lo. A privatização teve um forte impacto negativo nas finanças das autarquias, mas
também na gestão do ambiente, em Portugal.
Não há qualquer dúvida, o mercado está a falhar às pessoas. Sim, precisamos de uma empresa pública, e é
esse o caminho que vamos fazer também.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Hugo Pires, do PS.
O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O aquecimento global está fora de controle. A subida do nível do mar está à vista de toda a gente; os oceanos são cada vez
mais um depósito de lixo; o desaparecimento de espécies em todo o globo é uma realidade; os eventos extremos
sucedem-se, como, por exemplo, os incêndios que já sofremos em Portugal; a seca extrema, o degelo ou as
inundações são uma evidência um pouco por toda a parte; a qualidade do ar que respiramos, da água que
bebemos e dos alimentos que comemos são cada vez mais uma preocupação.
É pelo que acabei de enunciar que o combate às alterações climáticas deveria reclamar de todos os
Deputados e de todos os partidos desta Câmara mais ambição e mais coragem: a ambição de deixarmos um