19 DE DEZEMBRO DE 2020
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A ajuda tem de ocorrer mediante o pedido de um Estado soberano e Portugal deve responder em função
desse pedido. É, pois, crucial que Portugal utilize os instrumentos que tem ao seu dispor, como o Instituto
Camões ou como a SOFID (Sociedade para o Financiamento do Desenvolvimento), que tem desenvolvido
projetos muito importantes para o financiamento e apoio de empresas portuguesas que criam riqueza e que, em
termos simples, capacitam a população através do acesso à literacia, à saúde e a um maior rendimento.
A falha no acesso a estes níveis socioeconómicos é o que causa situações que permitem atos como estes,
que se vão instalando e incrementando, ganhando uma escala e uma dimensão evidentemente preocupantes.
Este Parlamento dá hoje um importante sinal de uma disponibilidade histórica de Portugal que esperamos
possa corresponder através dos instrumentos que existem, porque esses instrumentos de cooperação são
fundamentais não só para poder ajudar a médio e longo prazo mas também para garantir que não voltemos a
esta mesma situação.
Pena é que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não tenha dado esse sinal quando aqui esteve aquando
da discussão do Orçamento do Estado e tenha apenas feito comentários sobre a política nacional. É muita pena
ter-se perdido essa oportunidade, e muito bem está hoje este Parlamento, enquanto órgão de soberania, ao
fazer a presente discussão para corrigir essa falha no que é uma política histórica na cooperação que Portugal
tem com Moçambique e que é fundamental reforçar a cada passo.
É essencial que Portugal olhe também para a Presidência da União Europeia e consiga manter esta rota de
importância nos PALOP. É fundamental que Portugal o faça em cooperação com Moçambique e através das
instituições que tem no terreno e que são muito valiosas no sentido da vontade de a União Europeia alargar a
sua ótica de intervenção em Moçambique através da cooperação delegada.
Muito bem, pois, esteve este Parlamento. Infelizmente, outros estiveram muito mal e desajustados face à sua
intervenção no Parlamento.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cabo Delgado está, desde há três anos, sob ataque de insurgentes. A violência tem provocado uma crise humanitária, e já há a lamentar 2000
mortes e 500 mil pessoas deslocadas. Sem habitação, sem alimentos, apenas com a roupa que trazem no corpo,
as pessoas concentram-se junto da capital da província.
A complexidade da situação e as graves violações dos direitos humanos resultam da ação de diferentes
grupos armados: extremistas religiosos, contrabandistas, unidades e forças de segurança do Estado, empresas
de segurança privada ao serviço das grandes empresas extratoras de gás, rubis, ouro e grafite. Há ainda a
presença de mercenários internacionais, como o Grupo Wagner.
A província é apetecível por causa dos recursos naturais. As companhias mais poderosas dos países mais
ricos já porfiam a exploração das reservas de gás.
África já foi dada como o continente perdido. É mais do que certo que guerras, ditaduras, plutocracias,
nepotismos, fomes, doenças, epidemias são consequências da colonização, que nunca reconheceu os povos e
as nações.
Milhões de pessoas foram escravizadas ao longo de mais de cinco séculos e usadas como mão de obra nas
grandes plantações do continente americano. Só este facto já deveria dar direito a reparações aos povos
africanos para todo o sempre.
O advento da industrialização exigiu a posse de territórios em África. As riquezas naturais são extraídas
utilizando mão-de-obra local barata, de uma população que vive de um modo já distante dos ancestrais.
Depois da independência, o continente continua apetecível para parte dos países mais ricos e para grandes
empresas. O saque continua até aos dias de hoje e quase nada reverte para as populações.
A mortalidade infantil é assustadora, faltam cuidados básicos de saúde e a fome grassa. Muitos fogem da
fome e da guerra e buscam locais onde possam criar os seus filhos. Ironicamente, os locais mais seguros estão
nos países que se desenvolveram à custa da exploração das suas riquezas.