I SÉRIE — NÚMERO 46
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Com a pandemia, a cultura foi das áreas mais prejudicadas. Alguns espaços culturais estão encerrados há
mais de um ano, muitos projetos ficaram por realizar, muitos concertos não aconteceram e milhares de
trabalhadores ficaram entregues a si próprios.
Apesar de todos os apelos, das propostas, da realidade da miséria em que alguns destes trabalhadores
vivem, os apoios tardam em chegar e, mais vezes do que seria de esperar, são recusados, ficando tantos sem
acesso a qualquer apoio social.
Os Verdes já muitas vezes afirmaram que não é possível continuarmos a adensar os problemas que a
pandemia nos trouxe e que é urgente apoiar todos os que necessitam de ajuda, de apoio para viver e não só e
apenas para sobreviver.
Em pleno século XXI não é possível que se aceite a imagem do artista de chapéu estendido à espera de
umas moedas para comer.
Já aqui o dissemos e voltamos a repetir: a cultura não é um bem de luxo, não é um produto supérfluo de
consumo; a cultura é um bem, cada vez mais essencial para quem cria, mas também para quem dela usufrui.
Espera-se que no tal planeamento do desconfinamento se tenha em atenção a área da cultura e se permita
que voltemos a ter acesso a ela com todas as regras de segurança que já se demonstrou ser possível
concretizar.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Gambôa.
A Sr.ª Rosário Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista reconhece,
como é óbvio, as imensas dificuldades dos trabalhadores da cultura e manifesta profunda preocupação com os
seus problemas. Esses trabalhadores vivem uma abrupta queda de rendimentos, queda de rendimentos essa
agravada sobre uma condição dominante de precariedade. Sabemos isso.
Manifestamos igualmente a nossa solidariedade para com todos os trabalhadores e todos os portugueses
que vivem dificuldades graves decorrentes da situação pandémica.
Também manifestamos a nossa sensibilidade para com a motivação que levou os Grupos Parlamentares do
PCP, do Bloco de Esquerda e do PAN e a Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues a trazerem hoje algumas
propostas legislativas ao Parlamento.
Porém, há que haver ponderação e realismo quando, meses após o Orçamento do Estado, se apresentam
novas propostas de apoios extraordinários sem avaliar e ter em conta os impactos orçamentais daí decorrentes,
ou sem, sequer, prever um teto-limite para a despesa que essas propostas implicam.
Algumas das medidas propostas nestas iniciativas legislativas não só vão contra a norma-travão como raiam
a inconstitucionalidade ao definirem no próprio diploma que este prevalece sobre todas e quaisquer outras
normas, inclusive do Orçamento do Estado.
Há desproporcionalidade em algumas das medidas propostas, há sobreposição com medidas constantes do
Orçamento do Estado para 2021, como, por exemplo, o Estatuto dos Trabalhadores da Cultura ou o seu
mapeamento, ou outras recentemente anunciadas.
Há medidas nos projetos de lei em apreciação que, ao estenderem no tempo e em valores alguma da
legislação que está em vigor, nem sequer acautelam os riscos que daí podem advir, riscos esses que podem
desvirtuar as intenções dos proponentes. Refiro-me a alguns casos da extensão do Decreto-Lei n.º 10-I/2020,
de 26 de março.
Mas também encontramos — e este é um ponto importante que gostamos de afirmar — razoabilidade em
algumas das medidas que integram as propostas e encontramos sugestões positivas que podem e devem
constituir a base futura para retomar um diálogo construtivo.
Foi na base deste diálogo que foi possível, com os contributos do PAN, da Deputada não inscrita Cristina
Rodrigues, do PEV e, especialmente, do PCP, melhorar muitas das propostas do Orçamento do Estado para
2021, numa postura democrática onde, contrariamente, o Bloco de Esquerda faltou à chamada, não apresentou
uma única proposta para a cultura no Orçamento de Estado, demitindo-se da participação democrática e das
responsabilidades que tanto apregoa defender face ao setor cultural, vindo apresentar propostas depois do
Orçamento do Estado.
Em democracia, Srs. Deputados, há sempre tempo e espaço para a crítica, como há tempo e espaço para o
diálogo, para o trabalho de cooperação e convergência. Contudo, importa evidenciar que a ponderação que é