26 DE MARÇO DE 2021
55
É que, no meio da pressa, ficou para trás o real objetivo que devia nortear a política de resíduos: melhorar o
serviço às populações, reduzir os resíduos e elevar os padrões ambientais. E ficou para trás o respeito pela
autonomia do poder local.
Foram precisamente estas as razões que levaram o PCP a requerer a apreciação parlamentar deste decreto-
lei.
Um diploma estruturante na área do ambiente não pode ser tratado assim, quer pelo alcance do conteúdo
que encerra, quer pela multiplicidade de regimes que altera, quer pela sua extensão.
O Governo deu 15 dias aos implicados e aos cidadãos para se pronunciarem sobre um documento de 268
páginas. Não obstante os alertas da impossibilidade de analisar convenientemente o decreto, o Governo não
olhou para trás e ignorou o pedido da Associação Nacional de Municípios Portugueses para que se desse mais
tempo à discussão pública. Avançou, e avançou na lógica habitual, transferindo custos para as pessoas, taxando
as populações!
Sem fazer um balanço do regime em vigor e das alterações introduzidas nos últimos anos, optou pela receita
mais utilizada, aumentando a TGR, aumentando a fatura de cada família. Ora, nenhum dos argumentos para
justificar isto colhe.
Quando introduziram a TGR defenderam que esta serviria para melhorar a gestão de resíduos, para estimular
o cumprimento dos objetivos nacionais e melhorar o desempenho do setor. Mais de uma década depois, não se
conhece um investimento nos sistemas feito por conta da receita da TGR. A taxa serviu unicamente para
financiar o funcionamento de serviços da administração central.
Quanto à redução de resíduos e cumprimento dos objetivos nem seria preciso dizer muito, porque está à
vista. A quantidade de resíduos produzidos manteve-se sensivelmente a mesma e quanto aos destinos dados
aos resíduos continuamos com taxas de recolha seletiva e de reciclagem a rondar os 10%, enquanto persistem
valores de deposição em aterro esmagadores.
Não é por uma pessoa passar a pagar mais na fatura que vai haver mais valorização, mais reciclagem, mais
aproveitamento. Para isso, é preciso investimento nos sistemas de recolha e de tratamento.
As pessoas não controlam a produção, as opções de mercado e de embalamento, onde os que apoiam as
taxas não querem intervir e, por isso, chumbaram as propostas do PCP e continuam a desbaratar os recursos.
Este é o erro génese das soluções que afunilam na responsabilização individual.
Há situações em que se o município repercutir na fatura o aumento que agora se propõe, o valor pago pelas
famílias aumenta 480%, e os municípios que queiram absorver a taxa para não aumentar o valor para a
população ficam absolutamente estrangulados.
Vejamos o caso de Setúbal: seriam 3 milhões com que o município ficaria a menos para investir, são 3
milhões que o Governo e todos os partidos que apoiam a taxa querem retirar às pessoas e às populações.
E muito mais haveria para dizer sobre o diploma e sobre a transferência de mais e mais responsabilidades
para os municípios, sem qualquer atribuição de verbas ou de meios correspondente. Vai desde a recolha de
resíduos de construção e demolição, à recolha de resíduos perigosos, de caráter hospitalar, por exemplo, aos
novos fluxos específicos de vária ordem.
Srs. Deputados, perante um processo precipitado, em que trataram a participação pública como mera
formalidade, em que a opinião dos municípios foi ignorada, perante um aumento do custo de vida inaceitável no
momento que atravessamos, perante a inexistência de visão ambiental, de ambição para a redução efetiva de
resíduos, propomos a cessação da vigência deste diploma e que se inicie um processo de discussão pública
séria, que permita uma discussão comprometida com o ambiente e com a qualidade de vida.
Aplausos do PCP e do PEV.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Secretária de
Estado do Ambiente, Inês Costa.
A Sr.ª Secretária de Estado do Ambiente (Inês dos Santos Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:
Hoje debatemos as iniciativas legislativas dos grupos parlamentares do PSD, do Bloco de Esquerda e do PCP
de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, que aprovou o novo regime geral