I SÉRIE — NÚMERO 63
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E porque é que isto aconteceu? Isto aconteceu porque nas estufas que proliferam nesta região o modo de
produção de agricultura intensiva destrói os recursos ecológicos, destrói o tecido social e também destrói a
coesão social, porque, ao não responder adequadamente às condições de vida das pessoas migrantes,
consegue fomentar ou promover ou não fazer nada sobre o crescimento de reações xenófobas e racistas
relativamente às pessoas migrantes.
Portanto, é preciso olhar para as condições em que estas pessoas trabalham. Muito antes da pandemia já
havia relatos de casas sobrelotadas, muito antes da pandemia sabíamos que as pessoas pagavam várias
centenas de euros por casas insalubres, degradadas, onde viviam amontoadas.
O Bloco de Esquerda e as organizações de defesa das pessoas migrantes alertaram para esta situação antes
da pandemia, mas também alertaram quando a pandemia se instalou. Isto porque as condições eram propícias
para potenciar contágios entre as pessoas que viviam naquelas condições e, por isso, criavam uma situação de
risco a que era preciso responder. O Governo nada fez, o Governo não olhou nem respondeu às condições em
que estes trabalhadores se encontravam.
Nós questionámos o Governo, questionámos as Câmaras de Odemira e de Aljezur sobre as medidas que
tinham para melhorar as condições de vida dos trabalhadores em situação de confinamento e ainda não
obtivemos resposta.
Vozes do PS: — Ah!…
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — A generalidade das empresas agrícolas que operam no Perímetro de Rega do Mira, para responder à carência habitacional, optaram por alojar os trabalhadores em contentores
instalados nas explorações agrícolas. Esta solução de habitação precária foi regulamentada pelo Governo. O
Governo regulamentou, aceitou e legalizou a ilegalidade. Habitações ilegais para pessoas estrangeiras foi o que
o Governo aceitou na resolução do Conselho de Ministros de 2019, normalizando e permitindo a guetização das
pessoas estrangeiras, isolando-as do tecido social das localidades mais próximas, negando-lhes condições
dignas de habitação e dificultando o seu acesso ao espaço urbano, a transportes e a serviços públicos.
O Bloco de Esquerda acha que esta resolução deve ser revogada e aplicada uma moratória à instalação e
expansão de explorações agrícolas no Perímetro de Rega do Mira, até que se encontrem soluções ambientais
e sociais adequadas, como recomendou ao Governo num projeto de resolução que apresentou na anterior
Legislatura.
Este assunto assume agora uma prioridade muito grande, porque, se já era importante resolver as condições
de habitação destes trabalhadores, soma-se, agora, a necessidade de se rever os modos de produção agrícola.
Não podemos continuar a incentivar a produção de agricultura intensiva e também não podemos continuar a dar
dinheiros públicos àqueles que exploram trabalhadores, alojam trabalhadores em condições indignas e que,
além disso, promovem a destruição de recursos ecológicos fundamentais.
A solução para esta carência de habitação não passa por aumentar o número de contentores, não passa por
regulamentar os contentores nem por criar guetos e promover a sobrecarga do litoral. A prioridade deve ser a
habitação digna para todas as pessoas, espalhada pela malha urbana e sem recurso a aldeias de contentores.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Outra questão que importa aqui destacar é a condição destas pessoas no País. Muitas destas pessoas estão em situação irregular,…
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — … que se prolonga há vários anos e que precisa de ser corrigida. É preciso a regularização extraordinária de todas estas pessoas para que elas não fiquem vulneráveis às
máfias e possam defender os seus direitos.
Aplausos do BE.