I SÉRIE — NÚMERO 74
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Por isso, debater política cultural neste Parlamento, como hoje está a acontecer, é sempre um momento para
premiarmos o seu valor, respeitando as diferenças, e para discutirmos no presente o seu futuro.
A cultura tem um Ministério neste Governo, Sr. Deputado Paulo Rios de Oliveira, porque a política cultural é
parte crucial da agenda governativa, projetada segundo uma dimensão setorial, mas também transversal, em
conexão fértil com outras áreas em que a cultura igualmente se realiza.
Este é um ponto de ancoragem fundamental quando se refletem ou avaliam orientações políticas, que à
cabeça destacaremos no encerramento desta interpelação ao Governo. Mas vejamos alguns marcos dessa
política cultural que hoje podemos evidenciar.
A pandemia introduziu a emergência na política cultural. E a emergência é imperativa, impondo novas
medidas ou o reforço das linhas de ação em execução, capazes de amparar um setor fragilizado.
O Governo agiu, e agiu de imediato em março de 2020, com medidas especialmente vocacionadas para as
entidades e profissionais da cultura, complementadas, ao longo do tempo, com outras medidas, em função da
gestão da crise.
A par de diversas medidas setoriais, foram também criados apoios transversais, intencionalmente
desenhados para serem adaptáveis a este setor, como o layoff simplificado, o APOIAR.PT e, fundamentalmente,
o apoio extraordinário à retoma progressiva da atividade.
A cultura — e isto é algo importante e que temos de ter muito bem presente — foi o único setor de atividade
que teve uma dupla dimensão de apoios, setoriais e transversais, acumuláveis entre si. Esses apoios foram
desenhados numa lógica que procurou ser a mais abrangente possível, abarcando as diversas categorias
profissionais, grupos informais, entidades artísticas e empresas da cultura.
Em janeiro deste ano, face às novas medidas restritivas, o Governo avançou com novos apoios, entre os
quais o Programa Garantir Cultura, a fundo perdido, destinado ao tecido cultural para o desenvolvimento de
projetos artísticos, de criação e de programação em todas as áreas.
A resiliência do setor e a retoma económica foram assumidas, pois, pela área governativa da cultura como
prioridades políticas, com apoios diversos em valores que ultrapassaram, na sua globalidade, os 240 milhões
de euros.
A cultura foi apoiada nessa fase, e bem. A emergência exige ação e esta exige a quem governa uma
compreensão global do País, equilíbrio e equidade. Mas a ação política não foi só de emergência e eixos
centrais, já aqui hoje evidenciados, pois também foi criada a Rede Nacional de Teatros e Cineteatros e foi feita
a revisão do modelo de apoio às artes, medidas potenciadas pelas possibilidades abertas pelo PRR na
reabilitação do património cultural, material e imaterial, na modernização e capacitação da infraestrutura
tecnológica da rede de equipamentos culturais e na digitalização de conteúdos — acervos, exposições,
virtualização de espólios —, viabilizando a implementação, de modo mais assertivo e profundo, de medidas há
muito projetadas.
Um forte investimento na transição digital no domínio das artes e do património cultural terá impacto imediato
no desenvolvimento de novos processos produtivos e de novos modos de organização e de circulação de
conteúdos, favorecendo a articulação entre instituições culturais, redes de pessoas e conhecimento.
Por último, o estatuto dos profissionais da cultura é, seguramente, a pedra de toque de uma política cultural
atenta às pessoas, aos direitos dos trabalhadores, à justiça social, elaborada em equipa interministerial e com
a auscultação dos representantes das entidades, durante um longo processo de concertação social.
O estatuto enquadra, num regime jurídico autónomo e abrangente, quer a regulamentação das múltiplas
situações laborais próprias do setor, quer um modelo de proteção social que os apoie nas diferentes
eventualidades.
Esta é uma medida há muito almejada, mas nunca realizada. O projeto de decreto-lei apresentado não está
acabado, contrariamente ao que aqui foi afirmado logo na abertura do debate. Ele beneficiará dos contributos
da consulta pública e de uma nova agenda de análise com as entidades representativas do setor, como já foi
anunciado. Essas entidades, por sua vez, integrarão a comissão de acompanhamento da implementação do
projeto. Continua, pois, em aberto o espaço de diálogo e aperfeiçoamento.
E é em abertura e em respeito pelo pluralismo que entendemos que matérias cruciais à democracia, como a
RTP e os objetivos de serviço público que presta, devem ser discutidos.
As responsabilidades atribuídas à RTP requerem estabilidade organizativa e financeira, requerem o
compromisso responsável de todos na procura de soluções e requerem convergência, para que a empresa
possa responder a velhos problemas e novos desafios num clima de bem-estar social.