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I SÉRIE — NÚMERO 76

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Em suma, como se processará a fiscalização da lei quando se trata de autocultivo?

Estas perguntas sem resposta devem alertar-nos para o melindre extremo de que se reveste a possibilidade

de se abrirem as portas ao autocultivo. Pode ser prático, mas ninguém acreditará que é fiscalizável…

Valerá, por isso, a pena pensar bem — e pensar mesmo muito bem — sobre se tem sentido permitir que

uma pessoa, qualquer pessoa maior de 18 anos possa cultivar em casa canábis, alegando que o faz para

consumo próprio.

Repito: o autocultivo de canábis, mesmo sujeito a regras e limites, é de muito difícil, senão mesmo impossível,

controlo, convidando a práticas ilegais que rapidamente tornarão obsoletas as restrições legalmente impostas.

Dito isto, no mais que ao cultivo para uso pessoal se refere, curiosamente, o projeto de lei do Iniciativa Liberal

secunda as propostas do Bloco de Esquerda quer no que respeita, por exemplo, aos limites à aquisição da

canábis ou aos locais onde o seu consumo é proibido.

Já quando se trata da comercialização da canábis, avultam naturalmente as diferenças entre o Bloco e o

Iniciativa Liberal, inspirando-se aquele no modelo «quase soviético» dos preços tabelados —…

Risos do PCP.

… como se a canábis fosse um bem essencial — e preferindo esta a desregulação de mercado, como se a

canábis fosse um qualquer bem de consumo.

Outro aspeto diz respeito à venda online prevista tanto no projeto do Bloco de Esquerda como no do Iniciativa

Liberal.

Já em sede de regime criminal, os dois diplomas apresentam soluções idênticas, quase, diria, amoralmente

idênticas.

É disso exemplo a proposta de punir a comercialização ilegal de canábis com pena de prisão de 4 a 12 anos,

paradoxalmente uma pena mais grave do que a de 3 a 10 anos aplicável ao crime de violação!

Esta incongruência — mais esta! — que se pretende introduzir na lei penal evidencia bem a confusão de

valores ou a falta de ponderação que perpassam tanto no diploma do Bloco de Esquerda como no do Iniciativa

Liberal.

Controversa será, ainda, a proposta do Iniciativa Liberal de atribuir às freguesias o poder de proibir os

estabelecimentos de venda ou disponibilização de canábis não medicinal, uma flagrante ofensa à liberdade de

estabelecimento e à própria autonomia da iniciativa privada que aquele jovem partido tanto diz defender! Já em

sede de registo criminal, os dois diplomas apresentam soluções idênticas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há apenas três anos, este Parlamento aprovou — aliás, por uma

larguíssima maioria — a lei através da qual se admitiu e regulou a utilização de medicamentos, preparações e

substâncias à base da planta da canábis para fins medicinais.

O Partido Social Democrata, que votou favoravelmente a referida lei, não se revê em proibicionismos quando

estão em causa comportamentos sociais de natureza intrinsecamente individual.

Somos um partido social-democrata e reformista, assente em valores personalistas e humanistas.

Acreditamos numa ética de responsabilidade, tendo por base a liberdade de escolha e em que cada um

assume as consequências das suas opções pessoais.

Porém, não ignoramos os riscos que o consumo sem prescrição médica e para fins que não os medicinais,

especialmente no caso de consumo continuado, pode ter para a saúde humana, designadamente em termos de

patologias mentais, como são os casos da esquizofrenia ou da ocorrência de surtos psicóticos.

Consideramos mesmo, e reiteramo-lo frontalmente, que o consumo não terapêutico de canábis é negativo

para a saúde humana.

Apesar disso, não rejeitamos a discussão desta matéria, estando preparados e disponíveis para uma reflexão

séria, alicerçada na evidência científica, na responsabilidade e no equilíbrio político, por isso rejeitando o

radicalismo de uns e a manipulação social desejada por outros.

Esta pode ser, sem dúvida, uma oportunidade para se refletir sobre os impactos que uma mudança de

paradigma poderia ter para os consumidores e para a própria sociedade, não escamoteando, por outro lado, os

efeitos que essa mudança poderia acarretar para a saúde pública.

Se assim é, saiba também hoje o Parlamento português estar à altura do seu dever!