14 DE OUTUBRO DE 2023
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controlo do respetivo acesso e exercício, à elaboração de normas técnicas e de princípios e regras deontológicos
específicos e a um regime disciplinar autónomo, por imperativo de tutela do interesse público.
O exercício de profissão liberal que requeira não apenas uma habilitação académica, mas a observância de
princípios deontológicos e de elevados padrões de complexidade técnica, em que o Estado enquanto tal não
tem capacidade de regular, levou à criação de ordens profissionais, não só em Portugal, mas também por outros
países europeus. Por isso, foi delegado nas associações públicas profissionais a regulação do acesso à
profissão, bem como a supervisão do seu bom exercício, através do poder disciplinar.
No entanto, o panorama do exercício das profissões liberais alterou-se, já que muitos profissionais inscritos
em ordens exercem a profissão no âmbito de uma relação laboral.
A multiplicação de ordens profissionais e a acusação de que têm sido alvo de defenderem mais os interesses
corporativos dos profissionais e não tanto o interesse público, restringindo de forma desproporcionada o acesso
às profissões, levou a que a Comissão Europeia e a OCDE recomendassem a sua reforma e tornou-se num
compromisso de Portugal no contexto do Plano de Recuperação e Resiliência.
A reforma das ordens profissionais foi iniciada com a alteração do regime jurídico de criação, organização e
funcionamento das associações públicas profissionais, através da Lei n.º 12/2023, de 28 de março.
As propostas de lei em apreço decorrem da aprovação da Lei n.º 12/2023, de 28 de março, diploma «que
estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais»,
a qual, por sua vez, teve como origem, entre outros, o Projeto de Lei n.º 108/XV/1.ª (PS), que, na votação final
global, teve o voto contra do Grupo Parlamentar do PSD.
As propostas de lei em apreço acarretam alterações profundas nas Associações Públicas Profissionais
atualmente existentes, afetando diretamente mais de 600 mil profissionais, mas também toda a população
portuguesa que recorre a estes profissionais, sendo vital — e com respaldo constitucional — garantir o interesse
público.
A primeira crítica vai para a forma, tendo em conta que foram condensadas, nestas duas iniciativas
legislativas, todas as alterações aos Estatutos das 20 Ordens Profissionais, num total de 700 páginas, causando
enorme dificuldade de análise e debate, com registo de erros ortográficos e de nomenclatura, com erradas
referências a órgãos.
A segunda crítica vai para o processo anteparlamentar. O Governo solicitou às ordens profissionais o seu
contributo relativamente ao anteprojeto da proposta de lei às 23 horas do passado dia 7 de junho, véspera de
feriado nacional, pedindo o envio da pronúncia pelas ordens até ao dia 13 de junho, feriado em Lisboa, cidade
onde se situam as sedes das ordens profissionais. Isto é, foi concedido um prazo de apenas 2 (dois) dias úteis
para envio de contributos, atitude desde logo especialmente reveladora do total e absoluto desrespeito
institucional que existe por parte do Governo face às ordens profissionais e aos profissionais por si
representados.
Terem as ordens profissionais sido chamadas a pronunciar-se em prazo manifestamente exíguo, o que
sempre acarretará um efetivo obstáculo à participação das mesmas no procedimento legislativo, de forma
maturada, como seria, naturalmente, desejável e expectável.
A terceira crítica vai para o processo parlamentar, em concreto a fase da especialidade. A 28 de setembro,
a Assembleia da República é informada por um ofício da Sr.ª Ministra dos Assuntos Parlamentares, referindo
que «estes diplomas são considerados pela Comissão Europeia como imprescindíveis para a verificação da
implementação da Reforma RE-r16 do Plano de Recuperação e Resiliência, relativa à redução das restrições
nas profissões altamente regulamentadas, que se integra no quarto pedido de pagamento do plano. Neste
âmbito, veja-se que o Governo irá entregar o terceiro e quarto pedidos de pagamento no dia seguinte à
aprovação da reprogramação do plano por parte do ECOFIN, de forma a garantir que aqueles terão luz verde
da Comissão Europeia até ao final do presente ano, em linha com os compromissos assumidos por Portugal.
Ora, considerando que o ECOFIN tem até quatro semanas para analisar a proposta de reprogramação após a
aprovação preliminar que foi feita pela Comissão, no dia 22 de setembro, deve esta aprovação ocorrer na reunião
deste órgão que está já marcada para o dia 17 de outubro, o que significa que a submissão dos pedidos de
pagamento deverá acontecer no dia 18 de outubro.»
Evidentemente, (i) o tempo disponível para as audições de entidades relevantes e partes interessadas, como
por exemplo, não foram ouvidas entidades como Conselho Económico e Social ou a Provedora de Justiça; (ii) o
tempo de maturação para apresentação de propostas de alteração por todos os partidos representados na
Assembleia da República; (iii) o tempo para a discussão, tanto das normas previstas nas duas iniciativas, como