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24 DE ABRIL DE 1981

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para que, em vez de, neste país, andarmos em querelas constitucionais, procurar-mos enfrentar os nossos antigos e presentes reais problemas (a educação, a saúde, as desigualdades) e os nossos reais problemas (a energia, o ambiente, a integração europeia, a defesa da língua portuguesa).

Nem com isto advogamos, muito longe disso, a neutralidade ideológica da Constituição. Porque não há constituições neutras: não o eram, por exemplo, as constituições liberais oitocentistas, que punham a propriedade a par da liberdade e se desinteressavam da ordem económica e social e assim a aceitavam; nem o era a Constituição de 1933, que proclamava Portugal uma «República corporativa». Não advogamos a neutralidade, nem a eliminação do carácter programático que possuem numerosas normas constitucionais. Nenhuma constituição de estado social poderia deixar de as conter.

O que advogamos é, sim, uma depuração de linguagem, uma maior abertura de pistas de solução, uma desconfessionalização, uma acentuação do pluralismo, uma clarificação de vários preceitos. O que advogamos é, em suma, um aperfeiçoamento do texto constitucional e, talvez mais do que isso, um afeiçoamento dele de harmonia com mais e melhor democracia — mais e melhor democracia política, económica, social e cultural. [Ibidem, n.° 27, de 6 de Fevereiro de 1981, pp. 915 e 916.]

5:

Uma constituição não é um repositório de princípios políticos, um livro doutrinário, uma cartilha ideológica, um programa de partidos ou de coligação de partidos. Uma constituição é um complexo de normas e princípios jurídicos, sobre que se ergue a organização colectiva, a base de todo o ordenamento.

Uma constituição deve ser a carta das liberdades e o estatuto da soberania, mas não pode ser, no nosso tempo e no nosso país, apenas isso; assim como, em contrapartida, não pode ser concebida como específico modelo de sociedade. Quadro institucional do presente e do futuro, traça as linhas programáticas da caminhada para esse futuro, mas tem de encerrar sempre a capacidade de livre decisão acerca dessas linhas.

Nenhuma constituição é neutra, qualquer constituição tem de formular opções. Contudo, uma constituição democrática tem que estar aberta ao pluralismo, aos contrastes e ao diálogo de filosofías e ideologias diversas e ao sentido que a vontade popular lhe queira imprimir, no respeito das suas formas de legitimidade.

Uma constituição é fundamento do poder, não pode ser instrumento ou balanço de poder. Adaptável às circunstâncias, não pode oscilar, porém, de qualquer modo e sob qualquer pretexto, por mera inversão conjuntural de relações partidárias. Pacto da sociedade política, envolve compromisso para durar e que ninguém pode unilateralmente romper. Regra do jogo da maioria e das minorias, não pode ser por uma ou por outras apro-

priada ou conformada, pois tem de garantir os direitos de uma e de outras na dinâmica da alternância. [Intervenção aquando do 5.° Aniversário da Constituição em 2 de Abril de 1981, ainda não publicada.]

III

6 — No acordo da revisão constitucional da Frente Republicana e Socialista os partidos subscritores obrigam-se a preservar o «sistema fundamental de ideias consagradas na Constituição» — o que entendemos, não num sentido cristalizador, puramente defensivo e imobilista, mas sim num sentido dinâmico e evolutivo. Só assim uma revisão exerce plenamente a sua função de garantia.

Este «sistema fundamental de ideias» é esboçado no artigo 2.° da Constituição, tal como consta do acordo, do seguinte modo:

A República Portuguesa é um Estado de direito democrático baseado na soberania popular, no respeito e na efectivação dos direitos fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas, que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.

No presente projecto, tomando os grandes princípios que assim se enunciam, procura-se imprimir-lhes um mais perfeito desenvolvimento e uma mais nítida harmonia, à luz dos valores primordiais ligados ao respeito pela dignidade da pessoa humana e pela vontade popular.

7— Deste modo, na perspectiva de reforço do Estado de direito, o projecto preconiza como alterações mais significativas:

A explicitação do princípio da não retroactividade das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias (artigo 18.° da Constituição);

A consagração do direito de recurso contencioso de actos administrativos quando violem os direitos dos cidadãos, e não apenas quando sejam ilegais (artigos 20.° e 269.° actuais);

Um maior apuramento das garantias de direito e de processo penais (artigos 27.°, 29.°, 30.º e 32.º);

A referência ao planeamento familiar em termos de direito dos cidadãos (artigo 67.°);

A consagração do princípio da não retroactividade da lei tributária (artigo 106.°);

A regulamentação dos actos legislativos (um novo preceito do título I da parte III);

A eliminação da possibilidade de expropriações de grandes latifundiários e accionistas sem indemnização (artigo 82.°);

A eliminação da possibilidade de alargamento da jurisdição dos tribunais militares a crimes dolosos equiparáveis aos crimes essencialmente militares (artigo 218.°);

A prescrição da necessidade de fundamentação expressa dos actos administrativos que respeitem a direitos e interesses dos cidadãos (artigo 269.°);