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6 DE FEVEREIRO DE 1982

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a) Fases do processo. — Tal qual se encontra definido, o processo de decisão comporta duas fases fundamentais:

1) A consulta inicial, durante a qual o médico

deve fornecer a mulher informação sobre os resultados do exame clínico a que procedeu, as condições e locais em que a interrupção voluntária da gravidez pode ser praticada, as regras e métodos de contracepção, os serviços sociais e outros organismos especializados a que a mulher poderá recorrer caso se decida pela continuação da gravidez;

2) A declaração da vontade de interromper a gra-

videz, após um prazo de reflecção de, pelo menos, 7 dias.

A obrigatoriedade de um exame médico inicial não tem, evidentemente, finalidades de julgamento ou delegação no médico de decisões que à mulher devem caber. Visa muni-la de elementos de informação sem os quais seria, por certo, afectada a liberdade de escolha.

Por outro lado, o auxílio, apoio e participação daqueles que, nas circunstâncias concretas, o possam prestar utilmente, não fica de modo algum excluído. Mas não se impõe por lei aquilo que, inevitavelmente, só a realidade pode facultar ou recusar à mulher.

b) Prazo de reflexão. — O que se afigura indispensável é garantir um prazo de reflexão, que estimule a responsabilidade e fomente a ponderação das alternativas reais, diminuindo o risco de decisões precipitadas.

Seria, porém, contraproducente estabelecer abundância de trâmites, penosos e sem qualquer eficácia dissuasora, de forma tal que à complexidade natural da decisão fossem aditadas sucessivas peripécias burocráticas, numa verdadeira corrida de obstáculos, susceptíveis de desembocar, as mais das vezes, no recurso a circuitos clandestinos, que aí encontrariam um forte factor de subsistência.

c) Realização da intervenção. — Prevê-se, pois, que, decorrido o prazo mínimo, e se tal vier a ser a sua vontade, a mulher formule o respectivo pedido, por escrito, junto de estabelecimento de saúde adequado, apresentando a documentação comprovativa dos exames que haja realizado. Embora as consultas e pedidos formulados junto dos serviços públicos gozem do regime de urgência, é previsível que se torne inevitável um compasso de espera. Este não poderá, em todo o caso, ser tal que exceda o prazo-limite de 12 semanas, devendo os serviços providenciar por forma a que seja dada resposta aos vários pedidos de acordo com o seu grau de urgência e demais circunstâncias concretas.

d) Garantia de sigilo e protecção da intimidade. — .Contribuirá, por certo, para a eficácia do novo regime a garantia legal de que as informações respeitantes às intervenções praticadas gozam da protecção decorrente do dever de sigilo profissional e de outros dis* positivos da legislação atinente à defesa dos cidadãos contra a utilização abusiva ou contrária à dignidade humana de informações relativas às pessoas e famílias. Não se ignora, porém, que se trata de matéria erri que ainda é necessário adoptar providências legislativas específicas e sobretudo medidas práticas que

estimulem a confiança dos cidadãos e assegurem, neste plano, a defesa dos seus direitos, como determina o artigo 33.°, n.° 2, da Constituição.

e) A situação da menor solteira. — Ê de referir, finalmente, que a interrupção de gravidez de menor solteira apresenta em relação ao regime geral uma especialidade. O pai ou a mãe, segundo indicação da menor, devem ser informados da sua situação, tendo em vista a prestação do auxílio a que a menor tem direito. Ê a esta, porém, que cabe a opção.

E solução a que se chegou após cuidadosa avaliação da realidade portuguesa e das consequências a que poderia conduzir a aplicação de mecanismos que e não tivessem em devida conta.

Na verdade, não oferece dúvidas (e é o que resulte do próprio direito vigente, altamente restritivo em tudo o que diz respeito a menores) que, em caso de risco para a saúde ou integridade física da menor, esta deve ser assistida medicamente, independentemente das regras gerais sobre incapacidade jurídica. Assim sucede, de resto, quando se apresente num serviço de saúde em trabalhos de parto ou em acidente pós-aborto.

Mas, nas restantes situações, é à menor que deve caber a decisão, com justificação igualmente ponderada.

Por um lado, a lei não pode ser indeferente ao facto de a gravidez se ter verificado. É um facto novo, do qual há que extrair ilacções na esfera da capacidade jurídica. Por outro lado, são conhecidas as particularidades que rodeiam a gravidez de uma menor, não só no plano médico, como no plano social e psicológico. Reveste-se da máxima importância preservar a saúde física e psíquica da jovem, que a gravidez põe em risco, muitas vezes de forma dramática, com consequências negativas para o seu desenvolvimento. Mas importa também, e acima de tudo, evitar que, face a uma situação familiar real, que a lei não pode transmutar ou ignorar, a jovem seja arrastada a pagar com a saúde ou com a vida, nos meandros do aborto clandestino, o preço de eventual oposição familiar (por vezes de um só familiar), manifestada ou simplesmente temida.

Sem ficções perigosas, dentro dos limites que a realidade (que bem importa alterar) impõe hoje à lei, a solução preconizada visa incentivar a prestação de todo o auxílio de que a menor carece e a que tem direito.

C — Interrupção da gravidez por motivos terapêuticos

Diferente nos seus pressupostos e processo de decisão, a interrupção da gravidez por motivos terapêuticos obedece a critérios e regras de carácter médico. É segundo as regras e conhecimentos da medicina que deve ser ajuizada a sua necessidade para remover «perigo de morte ou de grave lesão da saúde da mulher» ou enfrentar «séria probabilidade de doença ou mal formação de particular gravidade do nascituro» não detectada nas 12 primeiras semanas.

A interrupção da gravidez só pode ser praticada em tais casos se for confirmada, antes da intervenção, por 2 médicos, que devem formalizar por escrito o seu parecer, justificando a necessidade da intervenção e fixando o prazo em que deva ter lugar. A interrupção não pode ser realizada em caso de oposição da mulher, estabelecendo-se as regras processuais e penais tendentes a garantir a livre expressão da sua vontade.

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