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II SÉRIE — NÚMERO 50

emancipação e libertação da mulher ou uma via para a resolução dos problemas sociais.

Por outro lado, ao apresentar o presente projecto de lei não se pretende tomar parte em infindáveis discussões polémicas sobre o começo da vida. Não caberia, por certo, à Assembleia da República confirmar por decreto se é antes ou apôs a concepção que começa a vida. O que haverá que fixar é o prazo dentro do qual a interrupção voluntária da gravidez pode ser praticada. O critério a adoptar deve radicar-se não em considerações científicas ou filosóficas (ou simplesmente especulativas e até obscurantistas) sobre o começo de uma vida não autónoma, mas sim na exacta determinação do momento em que, do ponto de vista médico, a interrupção da gravidez possa acarretar para a mulher lesões da saúde física e psíquica que a lei não pode deixar de prevenir.

A essas preocupações se procurou dar resposta no presente projecto de lei.

Consagrar legalmente o direito de interrupção voluntária da gravidez, em condições bem delimitadas, não cria nenhuma obrigação àqueles que, pelas suas convicções religiosas, ideológicas ou filosóficas, não pretendam, em quaisquer circunstâncias, usufruir desse direito legal.

Que cada um possa decidir segundo a sua consciência — eis o que se pretende. Não uma obrigação, mas a liberdade de escolha. Para todos, sem excepção, afastando a penalização existente, que lança para a clandestinidade quem à interrupção voluntária da gravidez tenha que recorrer.

4 — Um novo regime legal que urge aprovar

De tudo o que se expôs decorre já claramente que não se propõe a «despenalização do aborto», a sua redução a um facto incondicionado da esfera pessoal. O PCP considera que neste domínio há também que dar expressão legal a imperativos de defesa objectiva da saúde da mulher, atender à dimensão e função social da maternidade e contribuir para que se ponha fim em Portugal ao uso tradicional do aborto como meio de controle dos nascimentos.

A — Condições em que & interrupção pode ser praticada

a) Circunstâncias e motivos atendíveis. — Ê com base nestes pressupostos que o presente projecto de lei prevê que a interrupção voluntária da gravidez possa ser praticada em certas circunstâncias, a começar por aqueles casos em que a gravidez tenha resultado de violação ou de outro crime contra a liberdade sexual da mulher, mas também quando a continuação da gravidez, o parto ou uma nova maternidade sejam susceptíveis de causar séria lesão da saúde física ou psíquica da mulher. Por outro lado, embora tenham quase sempre reflexos negativos na saúde da mulher, considera-se que devem ser encaradas autonomamente as situações que, derivando de causas económicas, sociais e familiares, tornem inexigível, por incomportável, a continuação da gravidez. Por isso se admite a interrupção quando a mulher, em razão da situação familiar ou de grave carência económica, esteja impossibilitada de assegurar ao nascituro condições razoáveis de subsistência e educação ou a gravidez seja

susceptível de lhe criar uma situação social ou economicamente incomportável.

Ê para enfrentar estas circunstâncias que se preconiza a legalização da interrupção voluntária da gravidez.

b) Responsabilidade da decisão, prazo e demais requisitos de segurança. — De um acto voluntário se tratando, não pôde deixar de atender-se acima de tudo à vontade da mulher, a nenhuma outra pessoa ou entidade se atribuindo poderes de apreciação vinculativa ou fiscalização das motivações e fundamentos invocados. Mas por isso mesmo se acautelam as condições necessárias à liberdade de escolha, prevenindo a coacção e a fraude e procurando fornecer a máxima informação útil a quem tem de optar.

Estabelecem-se, por outro lado, parâmetros destinados a garantir que, quando seja essa a decisão, a interrupção voluntária da gravidez venha a ser praticada em condições adequadas de saúde, segurança e humanidade. Eis por que se estabelece que a interrupção só pode ter lugar nas 12 primeiras semanas, sempre sob a direcção de um médico e exclusivamente em estabelecimento público ou privado que preencha determinados requisitos de qualidade e eficácia.

O prazo-limite de 12 semanas, dentro do qual a interrupção pode ser praticada, não assenta senão em considerações de ordem médica. Trata-se do limiar a partir do qual o risco de complicações e sequelas (esterilidade, prematuridade) aumenta sensivelmente.

Em todo o caso, a interrupção só pode ser praticada sob a direcção de um médico. Não porque exija meios pouco usuais ou envolva dificuldades técnicas invulgares, quando atempadamente realizada, mas porque importa garantir a detecção de situações de risco, sempre possíveis.

A atribuição da responsabilidade legal e técnica de tais intervenções a um médico afigura-se adequada à realidade das estruturas de saúde do país e constitui solução mais exigente do que a legalmente prevista para o parto, que em Portugal continua, de resto, a fazer-se legalmente sem assistência e com sérios riscos (em 31,5 % dos casos ao domicílio). A solução preconizada visa potenciar os recursos humanos diversificados de que dispomos, sem prejuízo da saúde da mulher e com vantagem para uma real acessibilidade dos cuidados a prestar, mesmo nas regiões mais carenciadas.

Dada a natureza da intervenção e a necessidade de garantir que a sua realização tenha lugar em condições sanitárias adequadas, determinou-se que é em estabelecimentos de saúde públicos ou privados especialmente autorizados que deve ser praticada. As normas regulamentares deverão, muito especialmente, assegurar a organização dos serviços públicos por forma tal que nas diversas regiões fique assegurada a possibilidade de exercício dos direitos que a lei a Codos igualmente reconhece.

B — O processo de decisão

As normas relativas ao processo de decisão procuram atender adequadamente a uma matéria em que se entrelaçam questões próprias da esfera de opção pessoal da mulher e imperativos sociais relevantes que aqui têm de encontrar expressão.

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