O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

5 DE JULHO DE 1984

3453

2 — A ideia de que a legislação que ora se pretende criar não deverá esquecer a sua integração na reforma global e inovadora de todo o sistema processual penal português é, no entanto, essencial, num momento em que a proposta governamental vem, além do mais, colocar sérias dúvidas quanto ao pretender-se, de uma vez por todas, ultrapassar a indifinição inerente à chamada «estrutura mista» ou «inquisitória moderada», que, pelo contrário, parece voltar a insinuar-se.

De acordo com Figueiredo Dias, entendemos que a estrutura fundamental que deve assumir o processo penal poftuguès terá de ser basicamente acusatória, integrada por um principio de investigação.

Entendemos esta estrutura como uma garantia de que o reconhecimento e aceitação de conflitos de interesses não obriga, sempre e em última instância, o interesse individual a ceder perante o interesse comunitário.

O fim e a razão do Estado hão-de ser a realização —e ao nível de cada pessoa — dos direitos humanos fundamentais, muitas vezes em causa no interesse do arguido.

E por assim ser que a eclosão do terrrorismo veio levantar um conjunto de questões que, na óptica em que ora nos inserimos, tem a ver com a própria essencialidade do processo penal.

3 — Começa hoje a reconhecer-se —e a tal respeito é esclarecedor muito do que disse no Congresso de Milão (Junho de 1983) comemorativo do 35." aniversário do Centro Nazionali di Prevenzionee Defesa Sociale— que algumas das reformas introduzidas de forma «reactiva e pontual, motivada por acontecimentos e necessidades concretas» como as justificava o Ministro da Justiça da RFA Vogel corresponderam a uma «excessiva e precipitada capitulação da ideia de Estado de direito» ou de uma «ida ao tapete do Estado de direito» (').

Na verdade, a tentação de responder ao «terrorismo contra o Estado» por um qualquer «terrorismo do Estado» implica; mesmo nas suas formas mais moderadas, a diminuição da ideia de que a função do processo penal é a da protecção dos direitos humanos, mesmo dos daqueles que pelos meios mais reprováveis os combatem.

A afirmação de que, em todas as circunstâncias, os direitos de cada.pessoa devem ser defendidos e a sua liberdade salvaguardada não é, afinal, a força maior da democracia?

Ou, como escreveu, Grünwald, «as medidas de excepção permanentes são uma 'vitória' do terrorismo: a confissão da impotência e da fragilidade democráticas, a ideia de que a segurança implica o retrocesso da democracia».

4 — Acresce que não foi comprovada —bem pelo contrário— a eficácia das legislações de excepção.

A suspensão da lei francesa dita Sécurité et liberte em Outubro de 1981 tem, entre outros fundamentos, a verificação feita com grande cuidado de que, para além dos seus efeitos perversos —a diminuição das garantias jurídico-processuais dos arguidos e a restrição dos poderes judiciais de escolha e de individualização da pena—, as leis não se tinham revelado eficazes instrumentos.

Aliás, de certo modo, o Governo assim terá pensado já que não foi buscar inspiração para a sua proposta, nem na legislação da RFA nem na legislação italiana.

5 — Assim sendo, justificada está a razão pela qual se não apresenta um projecto mais vasto ou profundo.

Pelo contrário, o que se nos afigura importante realçar é que não se justifica qualquer confusão entre a segurança interna e a protecção civil, como a indifinição de um conceito de segurança que possa servir para ac-

(') Dahs, Neue Juritische Woihenschrijt, 1976, pp. 2145 e segs.

tuações contra outras acções e actividades que hão seja a criminalidade organizada e violenta e, nomeadamente, o terrorismo.

Pelos motivos expostos, é naturalmente limitado o conteúdo deste projecto de lei.

Parte ele do pressuposto de que o Estado de direito tutela os interesses de pessoas do que decorrem limites inultrapassáveis à prossecução do interesse oficial na; perseguição e punição dos criminosos.

Quem se atreve hoje e aqui a sustentar abertamente a admissibilidade da tortura ou a perfilhar a tese dos «safanões dados a tempo»?

Mas o Estado de direito exige também a protecção das suas instituições e a viabilização de uma eficaz administração de justiça penal.

Por isso, e nos precisos termos consagrados na Constituição, as restrições aos direitos, liberdades e garantias se limitam, e devem limitar-se, ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

6 — Consequência lógica da opção feita, é a de o articulado proposto se limitar, na prática, a reproduzir preceitos constantes de outras iniciativas —nomeadamente do projecto de lei n." 367/111, de iniciativa do CDS— que merecem a nossa concordância.

Por esta forma se procurou, com clara vantagem sobre a apresentação de simples propostas de eliminação, evidenciar o quadro de actuações que nos parece possível.

Existindo permanentemente um juiz de instrução criminal de turno, não se vê dificuldade de maior na obtenção da sua autorização, sem prejuízo de a solução proposta pelo CDS —e que reproduzimos— ter o mérito de salientar as funções de defesa da legalidade e a independência que são essenciais ao ministério público.

No que ao restante dispositivo se refere, a clareza do articulado dispensará outras considerações.

Nos termos expostos e nos do n." I do artigo 170." da Constituição da República, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei sobre medidas especiais de prevenção do terrorismo:

ARTIGO I."

1 — Sempre que esteja em causa a perpetração de actos de terrorismo, compete ao Governo, pelo Ministro da Administração Interna, determinar, nos termos das leis em vigor, a aplicação das medidas consideradas necessárias e que não se incluam na definição de estado de sítio ou estado de emergência.

2 — Sempre que a aplicação das medidas referidas no número anterior interfira com o exercício das competências de serviços pertencentes a ministérios diferentes ao Ministério da Administração Interna, serão as mesmas comunicadas, para efeitos de execução, aos ministérios competentes.

ARTIGO 2."

1 — No exercício das suas funções, os funcionários e agentes das forças policiais, sempre que esteja em causa a perpetração de actos de terrorismo, poderão exigir a identificação de qualquer pessoa e tomarão as medidas adequadas para impedir que, nas vias e lugares públicos, se transportem ou utilizem ilegalmente armas ou outros meios de agressão.

2 — Os mesmos funcionários e agentes poderão pro-:eder à apreensão temporária de armas, explosivos ou outros instrumentos na posse de civis, embora transportados legalmente, em caso de fundado receio de que possam servir para perpetração de actos de terrorismo.