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25 DE JULHO DE 1984

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Citaremos, por último, o decreto francês de 23 de Junho de 1789, que é o precedente mais claro quer da Europa, quer dos países tributários da tradição constitucional francesa, da constitucionalização das imunidades parlamentares.

Quando se não atente na ratio dos preceitos que nas diferentes Constituições, inclusive a nossa, consagram a inviolabilidade parlamentar, poderá supor-se que, por esta forma, se abre uma excepção, traduzida em privilégio, em relação ao princípio geral da igualdade dos cidadãos, que funcionaria a favor dos deputados.

Mas não é assim.

Com efeito, as imunidades parlamentares têm menos em conta a pessoa individual do deputado do que o Parlamento e a sua organização e funcionamento. As imunidades existem para assegurar a ininterrupção de funções, a defesa do órgão de soberania e o seu pleno e perroanenite funcionamento, ao abrigo da intervenção de outro órgão ou agentes, dentro de determinados limites.

A inviolabilidade é, assim, um factor de garantia da livre configuração da vontade parlamentar, na medida em que trava ou impede que essa mesma vontade seja posta em causa através da detenção, mais ou menos justificada, perante o direito comum, de um membro do parlamento. Não existe intuitu personae, não é, pois, um privilégio. Mas, como figura constitucional que é, a inviolabilidade dos deputados tem de ser sempre apreciada com a prevalência que sobre o direito comum e, de entre este, o direito penal, assume o direito constitucional.

Daqui deriva que a inviolabilidade parlamentar deverá funcionar como regra e que só por excepção podem os deputados ser submetidos ao direito comum (penal, entende-se), durante o exercício das suas funções,

Uma dessas excepções, contempladas na própria Constituição, verificar-se-á no caso de prisão em flagrante delito, pela prática de crime a que corresponda pena maior, o que bem se compreende e aceita, dada a natureza das infracções sujeitas a tais penas e perante as quais se entende então que o Parlamento se deve eximir quer à ponderação sobre o retardamento do respectivo processo criminal, quer mesmo à invocação de que é em seu nome e prestígio que as imunidades são atribuídas aos deputados, pois a manutenção da liberdade destes, em tais circunstâncias, comprometeria, antes, a configuração de uma autêntica e genuína vontade parlamentar.

.Mas do acima exposto deriva ainda que, gozando em regra o deputado e reflexamente, da inviolabilidade parlamentar, a ele compete, em primeira linha, tudo fazer quanto esteja licitamente ao seu alcance para evitar que outrem viole as imunidades parlamentares que, aproveitando-lhe, se acham garantidas na Constituição e no Estatuto dos Deputados, em consideração do órgão de soberania onde exerce funções, mais do que em consideração de si próprio.

E, assim sendo, perante a iminência de uma detenção ilegal o deputado deve usar de todos os meios para evitar a resistir mesmo à sua efectivação.

Nem sequer se pode colocar a questão em termos de o deputado, motu próprio, se não importar, ou mesmo desejar voluntariamente que se efective em

relação à sua pessoa uma ordem de detenção ou d© prisão.

O seu direito a não ser preso, nos termos em que lhe é reconhecido pela Constituição e pela Lei, é irrenunciável e a conduta que, por simples omissão, assuma perante uma prisão ilegal, por forma a não a impedir, traduz-se numa violação do dever de contribuir, pela sua diligência, para a observância da Constituição (artigo 15.°, alínea f) do Regimento da Assembleia da República].

Por sua vez, deve também a Assembleia da República, sempre que se verifique uma violação das imunidades parlamentares traduzida na detenção ilegal de um dos seus membros, providenciar pelos meios e termos próprios por que seja reposta a legalidade, e bem assim proceder na forma legal contra os infractores da Constituição e da lei, porventura incursos no disposto no artigo 417.° do Código Penal.

Citado o direito que nos rege em matéria de imunidades parlamentares, referida a ratio legis em que se funda e atentos os factos dados como provados no presente inquérito, a Comissão formula as seguintes conclusões:

a) Não houve violação das imunidades parlamen-

ta ies em relação ao Sr. Deputado Manuel Correia Lopes;

b) A detenção do Sr. Deputado Manuel Correia

Lopes poderia ter sido por si evitada se o mesmo se houvesse identificado no momento em que lhe foi dada a ordem de detenção, dado que a sua libertação se verificou imediatamente após o acto da identificação;

c) Todos os deputados têm o dever de velar pelo

cumprimento da Constituição e das leis e de impedir que sejam violadas as imunidades parlamentares, assim como todas as autoridades têm o especial dever de respeitar aquelas imunidades.

Palácio de São Bento, 19 de Junho de 1984.— Os Relatores: Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho — Manuel Filipe Correia de Jesus — António Monteiro Taborda.

Declaração de voto dos deputados do PS membros «£o Comissão Eventual de Inquérito ò Detenção do depute&t Manuel Lopes.

Os deputados abaixo assinados votaram favoravelmente o relatório e as conclusões dele constantes, com os fundamentos seguintes:

a) Por concordância total com a matéria de

facto referida no capítulo ii, perfeitamente apurada em função das provas produzidas durante o inquérito;

b) Por adesão à interpretação de natureza jtírf-

dico-constitucional, expressa no capítulo ih, relativa à interpretação do sentido, do significado e do valor do princípio da imunidade parlamentar;

c) Por apoio às conclusões expressas no relatório

e que clara e inequivocamente derivam das provas produzidas nos autos.

Os deputados abaixo assinados manifestam a sus satisfação pela forma construtiva como decorreram