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5 DE MARÇO DE 1986

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termos de estrutura e de sequencialidade, a que corresponde uma organização temporal, e normalmente espacial, em consonância.

A segunda consiste na capacidade formal e legal que é atribuída à escola para certificar as qualificações aí obtidas, implicando a existência de processos avaliativos objectivamente organizados.

A importância fundamental que é dada à certificação deriva da sua utilização social no sistema de ocupações e de empregos, e daí o poder social que a escola passou a disputar.

Estrutura, sequência e processamento racionalizado do saber e certificação da aquisição deste são, portanto, o que caracteriza a educação escolar. A educação não escolar representa assim o seu reverso. Nem a racionalidade formal nem a certificação são características determinantes dela.

Por isso, enquanto a educação escolar é possuída por uma formalidade assim caracterizada, o que lhe confere uma certa rigidez e inércia, que lhe dificultam a flexibilidade necessária, a educação não escolar aparece como o seu contraponto, o sistema regulador e compensador que permite, no seu conjunto, o desenvolvimento da capacidade de resposta mais atempada e mais variada às necessidades educativas.

Será assim o espaço privilegiado para a compensação humanista em relação ao cientifismo da racionalidade da educação escolar, que no nosso tempo tem sido dominante.

O equilíbrio entre as duas formas é tão importante que por isso mesmo lhe foi dado espaço diferente neste projecto.

Se à educação não escolar fosse dada a mesma extensão, ter-se-lhe-ia conferido um espartilho legislativo que a tornaria numa reprodução paradigmática da educação escolar, o que importaria de todo o modo evitar.

4 — Alguns princípios

Em primeiro lugar, a flexibilidade do sistema e a diversidade de soluções em obediência ao princípio fundamental do direito à diferença.

A unidade de sistema nacional de educação não se confunde com a uniformidade monótona e injusta, mas ambas se realizam pela conjugação dos vários e dos diferentes, vários e diferentes como são as pessoas e os grupos.

E bem sabido que a diversidade conflitua com o centralismo jacobino e prejudica a racionalidade niveladora da norma burocrática. E é também sabido como estas são preponderantes no Pais e asfixiam a educação autenticamente realizadora da pessoa humana. Mais uma razão para libertar a educação daqueles jugos.

Também em nome de um igualitarismo pretensamente democrático se tem cultivado a uniformidade como tradução da unidade. Na verdade, a igualdade de oportunidade em educação só tem realização plena quando se considera a diferença e o seu potencial aproveitamento quando se respeita o que distingue um do outro. A uniformidade niveladora não conduz à igualdade senão a uma desigualdade de esforços e daí a uma estratificação de capacidade, o que significa portanto um efeito que nada tem a ver com a democratização da educação.

No que respeita à educação escolar há que considerar três aspectos determinantes para esta democratização. A passagem de uma educação escolar selectiva, elitista e subordinada aos interesses dos que desfrutam

da possibilidade de esgotar as virtualidades do sistema para uma escola de massas com preocupações igualitaristas e autenticamente democráticas exige que esses três aspectos se cumpram.

Já foi referido que a educação escolar se caracteriza pela existência de uma sequencialidade da organização da aprendizagem. Só que a sequencialidade em modelos elitistas e selectivos tendem a subordiná-la ao seu termo, isto é, ao ensino superior. O que se procura deste modo é verdadeiramente operar uma selecção progressiva dos que aí podem ter acesso. Tudo o resto não importa ou importa pouco.

A igualdade de oportunidades, tão democraticamente defendida, torna-se neste caso falaciosa e mítica. O verdadeiro respeito pelas possibilidade reais de cada um, reconhecidas que são também as limitações de ordem social e económica, obriga a considerar a sequencialidade em patamares sucessivamente autónomos e finalizantes em si. Este projecto de lei foi construído nessa base.

Um outro aspecto diz respeito a uma questão controversa: o ensino básico, a sua universalidade e a escolaridade obrigatória.

O ensino básico é uma designação eufemistica que em Portugal é utilizada para abarcar a sequência de dois ensinos que pouco têm a ver um com o outro e é também um artificialismo que foi encontrado para impedir o alargamento do ensino primário, medida óbvia de democratização da educação. A despeito disto, aquela designação presta-se à elaboração de um conceito fundamental na educação escolar. O ensino básico pode assim ser entendido como um nível de ensino que se espera possa constituir a base da educação escolar acessível a todos e por todos conseguida. O conceito contém assim a universalidade e o sucesso como características inerentes. Isto requer ainda que, para isso, o ensino básico seja também autónomo e com finalidades próprias. É verdadeiramente um ensino de massas.

A obrigatoriedade escolar é um meio, entre outros, de tornar universal a frequência desse ensino e não mais do que isso. Não é, por exemplo, garantia do seu sucesso. A história tem demonstrado que em Portugal esta medida legal de natureza compulsória não tem tido os efeitos pretendidos. Para não ir mais longe, o alargamento da escolaridade obrigatória para seis anos, decretada em 1964, vinte anos depois continua a estar longe de se ter tornado efectiva. É assim uma medida ineficaz e obsoleta. O conhecimento de que assim é levou já o Estado a considerar outras medidas não compulsórias, mas de apoio, com vista a ser realizada a universalidade da frequência do ensino básico e não só.

A universalidade é de facto um objectivo, enquanto a obrigatoriedade é apenas um meio para a atingir. Transformar a obrigatoriedade num objectivo é uma perversão do processo, um fingimento e uma fuga à realidade. Daí que o alargamento da escolaridade obrigatória, na situação actual de ainda profundas diferenças de capacidades individuais, causadas muitas delas por desigualdades sociais e económicas, constitua de facto um anacronismo e é, objectivamente, uma ingenuidade. O que verdadeiramente importa é conseguir uma universalidade, não só da frequência do ensino básico, mas também do seu sucesso, e isto a obrigatoriedade escolar não resolve. Mais ainda, fácil é demonstrar que o alargamento escolar nas presentes condições poderia ser causador de um agravamento do insucesso