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II SÉRIE — NÚMERO 83

Este preceito não se limita a uma reafirmação pura e simples do princípio consagrado no artigo 41.° do Código Civil, uma vez que a arbitragem em matéria cível ou comercial não versa necessariamente sobre obrigações voluntárias, e é ao domínio destas que se reporta a referida norma de conflitos que reconhece o princípio da autonomia da vontade em direito internacional privado.

Mas afigurou-se que, versando a arbitragem voluntária sobre direitos disponíveis, se aconselhava estender — dc acordo com a orientação que aflora em muitas legislações mais modernas — o referido princípio de autonomia para além do seu âmbito de aplicação tradicional.

A fórmula adoptada não parece, todavia, abarcar a possibilidade de as partes submeterem o litígio a regras que não sejam as de um dado sistema jurídico (ou de vários sistemas jurídicos).

Na querela que hoje tão vivamente divide as legislações, as jurisprudências e os autores quanto à possibilidade de subtrair a resolução do litígio internacional à aplicação de qualquer lei estadual, confiando essa resolução à lex mercatoria ou a princípios ou regras escolhidas ad hoc, entendeu-se não dever admitir-se tal possibilidade.

Sem entrar na discussão dos méritos e deméritos das soluções que ficaram evocadas, ponderou-se que elas tem sido defendidas para o domínio do comércio internacional, em sentido técnico, quando não, mais restritamente, para o domínio das relações entre comerciantes: deve ter-se presente que a regulamentação proposta, como adiante se sublinhará, cobre um campo de aplicação mais vasto do que o que ficou referido.

Para a hipótese de faltar a escolha pelas partes do direito aplicável, a nova lei não impõe aos árbitros o recurso ao sistema português de normas de conflitos de leis, designadamente ao artigo 42.° do Código Civil, que consagra uma solução que hoje geralmente se tem por desajustada aos interesses da vida privada internacional. Antes se determina que o tribunal arbitral aplique o direito mais apropriado ao litígio (artigo 22.°, n.° 2, segunda parte).

Por esta forma se exclui que os árbitros possam submeter o litígio a regras que não sejam as de um sistema jurídico estadual (ou de mais de que um sistema jurídico estadual), à semelhança do que vale para a escolha feita, pelas partes do direito aplicável.

Mas note-se que com a solução adoptada na parte final do n.° 2 do artigo 22." o legislador também foi levado a tomar partido numa questão altamente controversa no direito positivo e na doutrina, tanto estrangeiros como internacionais, na medida em que, em vez de confiar aos árbitros a escolha das normas de conflitos a quem caberia determinar o sistema local aplicável, lhes atribuiu antes o poder de directamente elegerem o direito material chamado a regular o litígio, por ser o direito mais apropriado. Crê-se que a solução envolve maior simplicidade e transparência de processo na definição do resultado final.

A prática dos tribunais e à doutrina caberá, em todo o caso, um papel importante na explicitação dos critérios que levam a descobrir qual seja o «direito mais apropriado ao litígio».

Importa finalmente apontar que a lei definiu o que deve entender-se por «arbitragem internacional», para

o efeito de determinar o direito aplicável pelos árbitros, nos termos do n.° 2 do artigo 22."

O n.° 3 do mesmo artigo 22.° adopta neste contexto a noção lata —recentemente acolhida pela lei francesa— segundo a qual se considera arbitragem internacional aquela que «põe em jogo interesses do comércio internacional».

Parece evidente que a expressão «comércio internacional» há-de ter-se neste passo por correspondente a tráfego jurídico-privado internacional ou a relações da vida privada internacional, em sentido lato, e não apenas a relações comerciais stricto sensu, ou a relações entre comerciantes.

8 — Dentro dos parâmetros gerais que ficaram traçados, algumas soluções específicas da nova regulamentação proposta merecerão ainda uma bteve referência.

Observar-se-á, para começar, que essa disciplina não introduz inovações de fundo quanto à delimitação dos litígios cuja resolução pode ser cometida a tribunal arbitral voluntário. Nos termos do n.° 1 do artigo l.u, qualquer litígio em matéria c/vel ou comercial, desde que não respeite a direitos indisponíveis, pode ser objecto de convenção de arbitragem, a menos que por lei especial se ache submetido exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária.

A convenção de arbitragem poderá revestir a modalidade de compromisso, se tiver por objecto um litígio actual, ainda que já afecto a tribunaJ, ou a modalidade de cláusula compromissória, se visar litígios eventuais emergentes de uma determinada relação jurídica contratual ou extracontratual (artigo 1.°, n.° 2).

Manteve-se neste passo a terminologia tradicional entre nós (cláusula compromissória), mas é fora de dúvida que a convenção de arbitragem que se reporta a litígios eventuais tanto poderá revestir a forma de cláusula num contrato como a de uma convenção autónoma: é o que resulta inequivocamente do facto de se ter admitido que a convenção de arbitragem tenha por objecto litígios eventualmente emergentes de uma relação extracontratual.

O litígio a submeter aos árbitros deve ser determinado com precisão no compromisso arbitral e a cláusula compromissória deverá especificar a relação jurídica a que respeitem os litígios cometidos a tribunal arbitral (artigo 2.°, n.° 2).

Consoante ficou já referido, no caso de, surgido um litígio entre as partes, estas não acordarem na determinação do seu objecto, impõe-se para tanto o recurso ao tribunal judicial: da decisão deste caberá recurso de agravo, o qual subirá imediatamente (artigo 12.°, n.° 4).

9 — Uma vez definido que a arbitragem voluntária se reporta a litígios sobre direitos disponíveis, em matéria cível ou comercial, não pareceu necessário qualquer disposição especial sobre a capacidade de pessoas singulares e colectivas de direito privado para celebrarem convenção de arbitragem. Mas afigurou-se conveniente especificar as condições em que o Estado e outras pessoas de direito público podem recorrer ao instituto da arbitragem, tal como a nova lei o estrutura: a isso vem o n.° 3 do artigo 1."

10 — Pelo que toca à disciplina da forma da convenção de arbitragem, manteve-se a exigência da re-