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II SÉRIE-A — NÚMERO 6

PROJECTO DE LEI N.° 445/V

REFORMA 00 IRS E 00 IRC

1 — Devemos distinguir, no último processo de reforma da tributação directa, dois periodos: o que decorre até Maio de 1988 e o que se prolonga depois, até à publicação dos principais diplomas.

Da documentação disponível, relativa ao primeiro período, salienta-se a exposição de motivos que acompanha a proposta de lei n.° 3/V, publicada no diário das sessões de 16 de Outubro de 1987. Deixava antever-se progresso, na técnica e nos princípios, justificativo de uma expectativa favorável; os reparos surgidos poderiam ser removidos sem excessivas dificuldades.

Caminhava-se, então, para o imposto único e progressivo.

Que entendia o Governo, nessa fase, por imposto único e progressivo?

Na exposição de motivos, responde: «[...] a inovação central reside na substituição do actual sistema misto [...] Pela fórmula de tributação unitária, atingindo globalmente os rendimentos individuais» porque «[...) só a perspectiva unitária permite a distribuição da carga fiscal segundo um esquema racional de progressividade, em consonância com a capacidade contributiva.» (n.° 3 da exposição, de motivos).

Com esta configuração, presente à Assembleia da República, parte significativa da Constituição e dos melhores valores éticos da tributação estavam salvaguardados.

Mas, sem explicações, não se legislou nestes termos.

2 — O imposto acaba, afinal, por não atingir a globalidade dos rendimentos individuais; a tributação é compartimentada, e não unitária, como já o era; há diferentes esquemas de tributação e não um esquema racional de progressividade. Tudo o que deixou de ser concretizado visava, nomeada e principalmente, um fim essencial: a distribuição da carga fiscal em consonância com a capacidade contributiva.

O imposto adoptado não é, assim, único e progressivo, ao contrário da própria definição descritiva que dele foi feita.

Portugal ficou a reger-se, depois da reforma, por diversos impostos directos sobre os rendimentos, cujo elemento aglutinador é apenas corpóreo e resulta da publicação em um único volume. Temos uma miscelânea de impostos pessoais e impostos reais; de impostos progressivos, proporcionais e mistos; temos categorias, formas de determinação da matéria colectável, taxas, modalidades de liquidação e de pagamento diferentes. Tudo é plural.

O abandono do modelo escolhido e anunciado desencadeia consequências sérias no plano do tratamento dos contribuintes, que ficam discriminados uns em relação aos outros, e a discriminação nada depende da capacidade contributiva de cada um. Acresce também que estão desde já propiciadas novas discriminações como efeito da coexistência de proporcionalidade, progressividade e inflação continuada. Mais ainda: a pesada tributação indirecta, completada pela proporcionalidade em algumas áreas da directa, não contribui para a eliminação da forte regressividade que caracteriza o sistema fiscal português.

É este o núcleo central das desigualdades e injustiças, que a reforma traz consigo própria, não denunciado com clareza e veemência: os interesses de uns são servidos pelo silêncio; os de outros encontram poucos canais que o expressem.

Ficam assim abandonados os índices de justiça de qualquer sistema fiscal: não há igualdade horizontal e a vertical chega a ser invertida!

Temos a injustiça sob a forma de lei.

3 — O tratamento conferido ao aforro omite a prometida preocupação de eficiência económica. Peça essencial do desenvolvimento e da moderação da procura global, a reforma subalterniza-a e apenas prossegue o objectivo da eficiência financeira. As taxas de juro líquidas das aplicações em depósitos a prazo — quase três biliões de contos! — são inferiores a zero. O imposto dito sobre o rendimento acaba por recair sobre o capital, corroendo-o: decorrido o prazo do depósito o aforrador-depositante recebe realmente menos capital do que depositara.

Este traço, quase permanente, das nossas políticas monetária e fiscal, que se esperaria banido por uma reforma que assume, sem hesitações ou reservas, o objectivo da eficiência económica, vai manter-se com consequências nefastas para todos. Nalguns casos — a maioria em volume? — o fenómeno agravar-se-á mesmo com a subida da taxa do imposto sobre os juros, de 15 % para 20 %.

Consideramos que o problema só tem solução passando a ter em conta os juros reais e englobando-os com o conjunto dos outros rendimentos. Este critério, únito justo, exige, no entanto, para salvaguarda das finanças públicas, condições de estabilidade e rigor na política monetária até agora inexistentes. Nestes termos, mantemos como solução transitória uma taxa liberatória de 15 % sobre os juros dos depósitos à ordem, ou a prazo, bem como das obrigações e títulos de natureza similar, esperando que, a curto prazo, se criem as condições que permitam com segurança adoptar a solução acima referida.

4 — A tendência universal vigente vai no sentido da redução das taxas dos impostos. Em Portugal tinham atingido níveis legais que colocavam a nossa fiscalidade entre as mais pesadas do mundo, conforme o afirma um relatório recente da OCDE.

Naturalmente que, de tão exageradas, acabavam por aplicar-se apenas ao número restrito de agentes económicos sem condições de fuga. Perante este panorama, que o Estado nunca revelou capacidade para enfrentar, aconteceu o que sempre ocorre em tais casos: sobrecarregou-se de tal modo os que ainda pagavam que alguém pôde afirmar, sem contestação oficial, que o nosso país se encontrava em estado de terrorismo fiscal legalizado.

Ao contrário do que se tem afirmado as taxas não sofrerão reduções, em geral e com qualquer significado.

Desde logo, os encargos fiscais sobre as pessoas colectivas tornar-se-ão em regra mais pesados.

Quanto às pessoas físicas que trabalham, pequeníssimas ou nenhumas vantagens terão nesta sede.

A visão financeira que notoriamente dominou a reforma atinge, em termos por agora irremediáveis, princípios de equidade e de eficiência económica; mas terá sequelas sociais, porque as distorções profundas que