O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

18 DE NOVEMBRO DE 1989

175

vêm do passado nela não encontram antídoto. O agravamento quase sistemático que atinge os trabalhadores não sofre qualquer correcção com significado.

Como no passado, os contribuintes que puderem não vão sofrer resignadamente: da adopção de processos sofisticados de fuga até à grosseira e generalizada remuneração em espécie, de tudo se usara um pouco ... e quase por toda a parte.

O evidente e enorme nível de fuga fez da nossa vida fiscal uma deplorável ilusão: temos uma lei e uma prática que com aquela não coincide, com excessiva frequência, nos aspectos substanciais.

O sistema que passou a vigorar caracteriza-se, assim, pela continuidade das principais opções. Não poderá ter-se uma razoável expectativa de melhoria. Isto não invalida a forte probabilidade de, nos primeiros anos, prevalecer o efeito precaução, que se traduz na acomodação prudente dos comportamentos, até compreender melhor o que se passa. Depois ... O imposto sobre consumos supérfluos (1961), o imposto de transacções (1966) e, eventualmente, o IVA aí estão, lançando um sério sinal de aviso.

5 — O alto encargo fiscal decorrente de taxas verdadeiramente insensatas (40 °Jo acima de 3000 contos!) é ainda acentuado com as deduções e os abatimentos insignificantes que o IRS prevê.

De tudo resulta que, comparadas as cargas tributárias para quem trabalha, não se registam diferenças dignas de menção antes e depois de 31 de Dezembro de 1988.

É facílimo comprová-lo desde que:

á) Se actualizem, por aplicação das taxas acumi-ladas de inflação, as deduções e os escalões de rendimentos que vinham do passado;

b) Se evite o casuísmo que a tudo pretende responder, não o fazendo com exactidão a coisa nenhuma, passando a raciocinar em função de situações tipo. Ver-se-á que pouco ou nada melhora.

Não deixa de ser exacto afirmar um abaixamento significativo das taxas efectivas para rendimentos que superem os 6000/7000 contos; aí, a percentagem de contribuintes conhecidos (±. 0,30 %), segundo os dados oficiais; não chega para afirmar uma tendência. Esta amostra constitui apenas um expressivo retrato do altíssimo grau de fuga, situada sobretudo nos mais elevados estratos de rendimentos.

Faltou sagacidade ao legislador, que continuou a agir como o do passado. Não obterá, assim, melhores frutos.

Continuarão a economia subterrânea desmedida, a conflitualidade latente entre a Administração e o contribuinte, a paralisia dos tribunais, a convicção reforçada da espoliação e o sentido geral da injustiça.

6 — Pretendeu-se ampliar os casos de retenção na fonte, o que, em abstracto, é positivo: antecipa receitas, aproximando-as do momento de realização do ganho; previne em alguma medida a evasão.

Levou-se, todavia, demasiado longe esta técnica de cobrança; causa-se incómodos que a ninguém aproveitam e que, por isso, ninguém compreende.

Atente-se no caso de senhorios de inquilinos comerciais, tratados de forma diversa da dos demais senhorios e com trabalho burocrático inexplicável para os própiros arrendatários. Observe-se o caso dos trabalha-

dores independentes que, além da retenção na fonte, efectuam o pagamento por conta, constituindo bizarramente e em abstracto a única categoria de contribuintes sujeitos a esta dupla precaução (artigos 94.° e 95.° do IRS). Caricata a situação: financeiramente, trata--se de contribuintes que, no conjunto, nada pesam; como processo de controlo já acontece que são os únicos trabalhadores independentes que não podem fugir, porque remunerados por entidades com escrita organizada!

Descuido ou preconceito de trabalhadores por conta de outrem?

7 — O legislador, apoiado em razões que só ele próprio descortina, enfrentou a questão das sociedades de simples administração de bens do modo mais surpreendente e desastrado. Os próprios sócios de tais sociedades viam com receio aproximar-se a reforma: esperavam ter um tratamento fiscal discriminatoriamente agravado. Saiu o contrário do que pensavam, por certo sem perceber porquê.

Qualquer cidadão que conheça um pouco, só um pouco, das razões geralmente determinantes da criação destas sociedades sabe tratar-se de um mero instrumento de evasão; um paraíso fiscal dissimulado! Quem possua um património valioso transfere-o para a sociedade e afasta-se do imposto sobre as sucessões e doações, espécie tributária de efeitos mortíferos sobre os herdeiros. Também no domínio dos ganhos, eles pouco aparecem porque a sociedade de simples administração de bens é um centro de imputação de gastos de toda a espécie. Não é difícil retirar ainda meios adicionais que constituem a liquidez necessária ao quotidiano.

Um pouco por tudo isto, a notícia de uma reforma fiscal não era tranquilizadora para os sócios — normalmente o sócio único —, mais ainda quando anunciada como implacavelmente moralizadora e persecutória de todas as anomalias!

Afinal, deixam de estar sujeitas a IRC e entram na larga zona de não sujeição ao imposto sobre as sucessões e doações; este já nem precisa de parecer que funciona.

A perplexidade é grande para os que pensam nestes problemas.

8 — As chamadas despesas confidenciais têm tido, em Portugal, um tratamento oscilante, que não importa aqui rever.

Por força do CIRC passam, sem limites expressos, a estar sujeitas ao IRC (artigo 41.°). Daí por diante, e pela natureza das coisas, nada mais é possível saber ou fazer. Exemplifique-se: alguém recebe dividendos de uma sociedade, pelo que antes incidiu o IRC e depois incidirá o IRS (por englobamento ou taxa liberatória); pense-se, agora, que o mesmo indivíduo levanta dinheiro a título de despesa confidencial, pelo que sobre ele incidiu IRC mas depois nada mais incidirá. Na primeira situação tínhamos IRC + IRS (sendo este maior que zero); na segunda, temos IRC + zero.

Mesmo um não fiscalista percebe logo que a segunda via, com esta lei, é menos onerosa. Alguns teimam em dizer que não, mas estão mal informados, como é evidente.

Por este e por outros mecanismos, que geralmente todos conhecem, os dividendos foram rareando na vida portuguesa, por excessivamente dispendiosos no plano fiscal. Em 1984, uma estimativa aponta mesmo para 0,8% do rendimento nacional!