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II SÉRIE-A — NÚMERO 25

próprios. De qualquer modo, os europeus ocidentais não podem definir a sua identidade exclusivamente em oposição aos EUA. A Europa Ocidental tem sobressaído tradicionalmente mais a criticar ou a condenar as iniciativas americanas do que a conseguir entender--se para formular alternativas coerentes.

III — A mudança da politica americana

A construção de uma identidade europeia de defesa, neste fim do século xx, levanta problemas complexos e exige respostas a questões contraditórias, como a escolha das instituições, a cooperação técnica, os custos económico-financeiros e a planificação estratégica. Mas, adiada desde o fim da II Guerra Mundial em termos institucionais adequados a todas as eventualidades, para que os Europeus pudessem, responder às ameaças concretas ou eventuais, ela não pode deixar de avançar. Exigem-no os interesses específicos da Europa e exige-o o interesse do seu principal aliado, os EUA.

A estrutura de segurança do pós-guerra na Europa foi estabelecida entre 1947 e 1951, baseada no quadro da política americana, em que sobressaía a ideia de vulnerabilidade e importância dos aliados, a percepção clara da ameaça do adversário, a capacidade dos EUA para responder a essa ameaça e a contabilização positiva dos custos e benefícios associados e tal política. O compromisso com a Europa, encarnado no Tratado do Atlântico Norte, implicava a instalação de tropas americanas na Europa e uma estratégia baseada na vontade de usar as armas nucleares em resposta a uma agressão convencional e era parte de um acordo transatlântico que obrigava os Europeus a melhorar as suas forças convencionais (para reduzir a confiança-recurso na garantia nuclear americana) e a dar apoio à luta global contra a ideologia que subjazia na ameaça que motivava a Aliança. Este acordo mantinha uma grande ambiguidade quanto à actividade e ao suporte futuros a carrear para a organização. Nos últimos anos tem vindo a crescer o descontentamento americano com a invocada falta dos Europeus em se conformarem com as obrigações subentendidas no acordo inicial, o que, conjugado agora com um novo contexto internacional e a mudança das politicas americana e soviética, significa que os Europeus não podem esperar durante muito mais tempo com o mesmo suporte ou o apoio a um nível de forças instaladas a que estavam habituados.

A nova ordem americana já não pode ser hoje tão favorável à Europa Ocidental. Se a paz permite a política externa mais económica, a procura desta por parte dos EUA não favorece necessariamente as relações in-teratlânticas, como se vê pelas negociações recentes com a URSS. Com efeito, para regularizar as suas relações com o Leste, os Estados Unidos negociaram, sem consideração pelos aliados europeus, na Cimeira de Rei-quejavique, onde declararam aceitar a desnuclearização da Europa e o afastamento americano do nosso sistema de defesa. Os Europeus criticaram a opção zero sobre os euromísseis e acabaram por ter de aceitar a assinatura pelos americanos de um tratado com uma dupla opção zero, restando-lhes mostrar-se contentes por terem evitado a opção triplo zero, a qual, excluída isoladamente, tem sido fonte de grandes tensões intra--europeias, por singularizar a RFA em termos de perigo de destruição nuclear.

E a seguir a política americana terá de normalizar completamente as relações com o Japão, o que, pro-

cessando-se embora ao nível do económico, irá ter profundas implicações estratégicas. A evolução das relações bilaterais dos EUA com o Japão será um dado novo para a Europa, não só porque tenderá a falsear as relações multilaterais no seio do GATT, no que respeita ao comércio, como porque levará a uma repartição das responsabilidades militares mundiais, até aqui assumidas pelos EUA, com as potências da zona do Pacífico, o que vai apanhar a Europa institucionalmente desprovida de capacidade para reajustar rapidamente as suas posições para responder aos seus próprios interesses.

A procura de uma nova ordem americana que responda aos seus actuais interesses levará os EUA a operar uma redistribuição dos seus recursos em função da dispersão dos seus interesses globais. Mesmo que a ameaça soviética sobre a Europa Ocidental se mantivesse (e o processo libertador no Leste não é irreversível sem uma democratização da Rússia e a solução das graves crises económico-sociais), a defesa da Europa não poderá continuar a absorver, directa ou indirectamente, à volta de metade do orçamento americano na defesa, o qual, por sua vez, constitui cerca de um terço do seu orçamento do Estado.

E porque haveria a Europa de escapar ao movimento geral de descomprometimento, quando os meios de presença dos EUA têm sido cortados em todo o mundo: das 7000 bases instaladas após a II Grande Guerra hoje apenas se mantêm 700, ou seja, 10%. Tanto política como financeiramente é difícil aos Americanos manter posições no Terceiro Mundo. Em 1988, 42 programas de ajuda económica e militar a desenvolver em 30 países foram cancelados. Os conselheiros no Terceiro Mundo diminuíram consideravelmente, de tal modo que a URSS vinha tendo aqui 30 vezes mais conselheiros que os EUA e no estrangeiro em geral duas vezes mais militares. Os Estados Unidos treinam menos um terço de militares oriundos do Terceiro Mundo do que há 20 anos atrás. E o apelo soviético a uma gestão multilateral dos conflitos internacionais fará recuar os Estados Unidos, onde estes ainda ocupam o primeiro lugar.

E a própria evolução da Europa para um mercado comum, fruto de uma vontade concretizada recentemente no Acto Único Europeu, também preocupa os Estados Unidos e orientará a sua atitude face aos Europeus. Apesar de ela ocorrer em momento difícil, com uma fase de transição entre as legislações nacionais e o sistema comunitário que se escalonará até 1 de Janeiro de 1993 e durante a qual irão aparecer as naturais dificuldades e crises de adaptação nos diferentes países, os dirigentes europeus terão de simultaneamente discutir os problemas que interessam à sua segurança e ao seu principal aliado, como a modernização da OTAN e a regularização das trocas comerciais com a América do Norte.

Quanto à modernização da Aliança, bloqueada pela não aceitação da Carta Atlântica de Kissinger na década de 70, ela está na ordem do dia durante este mandato do Presidente Bush, dada a evolução técnica das armas, a mudança das doutrinas de emprego soviéticas, os acordos de desarmamento previsto para o presente ano e a transformação das relações entre as superpotências, que impõem no imediato a revisão das bases da Aliança, como se constata pelas declarações