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26 DE ABRIL DE 1990

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tendentes a generalizar e a assegurar o gozo efectivo desse direito, através da definição de princípios e normas de organização política e administrativa de cuja execução resultarão necessárias condições objectivas de realização.

Não se imagina que possa ser outra a função da lei num campo em que os preceitos constitucionais dispõem de eficácia jurídica particularmente acentuada (designadamente: directa aplicabilidade, vinculação de todas as entidades — acarretando para os entes púbicos a especial obrigação de respeitarem e velarem pela sua realização —, proibição de restrição e de suspensão arbitrárias, etc, e em que existem múltiplos instrumentos jurídicos que, a diversos níveis, regulam modalidades muito distintas do direito de petição, tendo em conta incontáveis diferenças. Basta pensar no quadro específico existente em regiões caracterizadas pela interioridade ou pela insularidade — esta particularmente acentuada no caso da Região Autónoma dos Açores, exigindo complexas medidas de apoio, sem as quais a própria expedição de petições se torna problemática e o respectivo direito uma coisa desconhecida em «ilhas desconhecidas» (Raul Brandão).

3 — A contribuição do PCP apresenta características que a singularizam e pontos comuns com projectos de lei apresentados por outros partidos e forças políticas (incluindo-se, felizmente, entre os pontos comuns, os que se relacionam com o cumprimento das disposições emergentes da 2." revisão constitucional).

São muito variadas as principais inovações do regime proposto.

3.1 — O projecto do PCP opta desde logo por uma noção ampla do direito de petição, que surge considerado como direito de participação na vida política (nessa medida exclusivo dos cidadãos portugueses) e, simultaneamente, como direito subjectivo de carácter não necessariamente político (extensivo, pois, a estrangeiros e apátridas, mas também a nacionais que, por qualquer razão, não gozem de plenitude dos seus direitos).

Tem-se, de facto, por plenamente compatível com o quadro constitucional tal solução, que, no fundo, retoma e renova a histórica distinção entre petições--queixa (pétitions-plainte) e petições políticas, o que, na fórmula lapidar da Constituição Francesa de 1791, conduzia à atribuição universal da primeira e ao reconhecimento da segunda aos titulares de direitos políticos («la plainte est le droit de tout homme; la pétition est le droit du citoyen»).

Razoavelmente, tem-se em conta que opção contrária conduziria a privar do direito de petição quem dele pode precisar instantemente, para justa defesa de direitos e interesse legítimos. Porquê, na verdade, vedar petições a jovens de idade inferior a 18 anos? Porquê recusar a quem viu limitada a capacidade de exercício de direitos a possibilidade de pedir providências de que necessite e que possa exprimir?

Em bom rigor, os requisitos da maioridade e do pleno gozo e exercício dos direitos civis e políticos só adquirem plena pertinência se referidos aos artigos 48.° e 49.° da Constituição, que corporizam direitos políticos mas também um dever cívico que torna exigível aos seus detentores uma particular qualificação. Tal não se afigura, porém, exigível para outros direitos políticos e menos ainda para direitos subjectivos sem tal carácter. Seria contrário ao próprio escopo do instituto pe-

ticionai e expressão de um «fechamento» constitucionalmente indesejado e indesejável vedar, por exemplo, ao falido ou ao preso a possibilidade de apresentar petições.

Nem se vislumbra, de resto, como fazer acatar a regra da proibição se não ao preço (incomportável!) de impor aos peticionários um volume arrasador de certidões — certidão de nascimento narrativa completa, certidão de eleitor, certidão negativa de registo de tutela, certificado de registo criminal ... Apenas para pedir!

Ao optar por uma noção abrangente, o projecto do PCP visa contribuir para que a futura lei aposte decisivamente, não na restrição, mas na extensão do direito de petição.

3.2 — 0 projecto do PCP obedece à preocupação dominante de informatizar, simplificar e desburocratizar o exercício do direito de petição. Não contém, pois, exigências descabidas, nem sobre requisitos conducentes à desmobilização do aspirante a peticionário ou ao fácil indeferimento liminar de petições. O objectivo basilar consistiu, antes, em eliminar o mais possível obstáculos, sem deixar de garantir a certeza e segurança jurídicas imprescindíveis nas relações entre os cidadãos e os órgãos de soberania e autoridades.

A apresentação de petições surge definida, aliás, não como uma mera liberdade, mas como um verdadeiro direito, que acarreta para os destinatários uma obrigação de registo, exame e resposta (e, no caso da Assembleia da República, um dever de apreciação em Plenário, o que confere ao direito de petição dos cidadãos um estatuto reforçado em comparação com os próprios projectos de lei cujo agendamento automático não é obrigatório).

Prescindiu-se deliberadamente de buscar definições, classificações e tipificações das petições possíveis, esforço que tendo, sem dúvida, utilidade doutrinária, nesta sede não se justifica. Tais classificações não poderiam razoavelmente ser adoptadas com valor vinculativo, sob pena de a nova lei vir a representar, não um factor de promoção do acesso ao direito de petição, mas um poderoso obstáculo adicional — mais um! — a ultrapassar pelos cidadãos.

Para quê, na verdade, definir, sequer a título indicativo, o conteúdo das petições, se, no largo quadro constitucional, múltiplas outras são pelo menos tão pertinentes (se não mesmo mais imaginosas) do que as prefiguradas pela inspiração humanamente limitada do legislador?

Conhecida a realidade e abundando na doutrina e na jurisprudência as classificações de petições em função do seu conteúdo, não seria difícil enveredar por qualquer das aventadas, que são, aliás, muitas e desigualmente rigorosas. Seria certamente possível aceitar, por exemplo, a grande distinção entre petições de interesse público e petições de interesse privado:

A) Petições de interesse público — as que para defesa da constituição da legalidade democrática visem, nomeadamente:

1) Denunciar:

a) Normas viciadas por inconstitucionalidade orgânica, formal ou material, ou casos de inconstitucionalidade por omissão, bem como de ilegalidades;

b) Actos ou omissões que firam princípios e regras constitucional e legalmente consagrados, designadamente violações de direitos