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5 DE JUNHO DE 1993

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jurídicos e dos meios humanos e materiais adequados a uma acção de prevenção e de pronta responsabilização da corrupção e da criminalidade económica em geral.

Trata-se, porém, de uma área em que o legislador esbarra com particulares escolhos e dificuldades.

Em primeiro lugar estamos perante uma criminalidade não convenciona] em que se utilizam os meios mais insidiosos e em que a ocultação conluída de corruptor e corrompido dificulta a sua descoberta.

Pensamos que importa (e é este, de certo modo, o propósito da proposta de lei em apreço) criar instrumentos do âmbito mais vasto da criminalidade económica.

Na verdade, desde logo no artigo 1.° da proposta de lei referem-se os seguintes crimes:

Corrupção, peculato e participação económica em negócios;

Administração danosa em unidade económica do

sector público; Fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção

ou crédito;

Iitfracçôes económico-financeiras cometidas de forma organizada, com recurso à tecnologia informática;

Infracções económico-financeiras de dimensão internacional ou transnacional.

Pena é que, como assinalavam o Prof. Figueiredo Dias (in Introdução ao Direito Penal Económico, ano ra, n.° 1, 1977) e o Dr. Costa Andrade (in Problemática Geral das Infracções contra a Economia Nacional, separata do Boletim do Ministério da Justiça, n.° 262), o conceito de «delito económico» está longe de ser unívoco no âmbito do direito penal comparado, variando de país para país, quando não varia mesmo no direito penal interno.

Tal circunstância impede uma recolha mais aprofundada ou uma inspiração útil no direito comparado.

Na verdade, como assinala Tiedemann, referindo-se aos conceitos de «direito penal económico» e de «delito económico», «apesar dos numerosos e prolongados esforços científicos dedicados à ciência do direito, à criminologia, à política criminal e ao direito penal», tais conceitos não são claros nem unívocos, acrescentando que «esta discrepância obstaculiza o desenvolvimento do pensamento científico, o intercâmbio de experiências e o incremento das reformas penais».

Embora a corrupção encontre terreno mais fértil nos regimes ditatoriais, nem por isso as democracias estão livres de tal criminalidade.

Naturalmente que em democracia tais situações são, felizmente, mais facilmente denunciáveis e acessíveis à opinião pública.

Trata-se de uma matéria que tem estado na ordem do dia em vários países e em particular na Itália, França e Espanha, com conhecidas repercussões políticas, que têm proporcionado quer à comunicação social quer às magistraturas um protagonismo moralizador e um discutível papel de reserva ética.

Os fluxos financeiros comunitários de que Portugal tem beneficiado, e muito embora as instituições comunitárias refiram que, comparativamente com outros países, tal acontecerá em escala bem menor, não deixaram de dar lugar a alguns casos indiciados como de corrupção.

É ponto assente que desde que o homem se organizou colectivamente e passou a existir o que politicamente se designa por «Poder», surgiu também a corrupção.

Isto significa que a tutela penal de tal figura perdeu-se já na memória dos tempos, sendo certo que o direito romano, pelo menos por volta dos século vi, já a consagrava.

Aliás, foi esse direito que inspirou as nossas ordenações e designadamente as Ordenações Filipinas, que previam já o crime de corrupção (v. livro v, título lxxi).

Por sua vez, quer o Código Penal de 1852 quer o Código Penal de 1886 também tratavam deste crime (artigos 315.° e seguintes), bem como de outra figura criminal próxima, a «concussão», que o Prof. Cavaleiro Ferreira distinguia da corrupção por força do elemento violência ou temor que caracterizava a primeira — «Metus publicae protestatis» (in Stiencia Jurídica, 1961).

Não deixa de ser interessante registar aqui, pela sua actualidade, o que afirmava um comentador do Código Penal de 1852 a propósito da corrupção: «Desgraçadamente é este um cancro, dos mais profundos, que corrói e enferma as sociedades modernas.» (Silva Ferrão, in Theoria do Direito Penai, Lisboa 1856).

O Código Penal de 1982 ocupa-se igualmente nos seus artigos 420.° a 422.° dos crimes de corrupção activa e passiva.

Tal não impediu, porém, que o legislador viesse a aprovar, entretanto, o Decreto-Lei n.° 371/83, de 6 de Outubro, que pretendeu, então, dar resposta a indícios de acentuação do fenómeno da corrupção entre nós, ampliando o seu âmbito de modo a abranger a «tentativa» e agravando as sanções, designadamente, com penas acessórias.

De entre as medidas de prevenção e de combate à corrupção criou-se, através da Lei n.° 45/86, de 1 de Outubro, para funcionar junto da Assembleia da República, a Alta Autoridade contra a Corrupção.

Tratou-se de uma entidade que pretendeu dar resposta a um período e situação conjuntural e que teve actuação meritória, vindo, porém, a ser extinta pela Lei n.° 26/92, de 31 de Agosto.

Não havendo uma relação directa entre a extinção daquele organismo e a presente proposta de lei, a verdade é que a extinção da Alta Autoridade contra a Corrupção acentuou a necessidade de reequacionar os instrumentos jurídicos e os meios adequados ao combate à corrupção e à criminalidade económica.

No âmbito das chamadas «infracções antieconómicas», salienta-se o Decreto-Lei n.° 28/84, de 20 de Janeiro.

Muito embora, como já se referiu, a proposta de lei em apreciação disponha não apenas sobre o crime de corrupção, mas também sobre infracções económicas e financeiras, não nos parece que estejamos ainda face a uma verdadeira «lei quadro do direito penal económico e social», que alguma doutrina reclama e que se nos afigura desejável.

Porém, compreende-se que a amplitude e profundidade de um tal diploma exija algum prolongado trabalho preparatório, sendo certo que as alterações que estão a ser introduzidas no Código Penal atenderão em parte a tais preocupações, o mesmo acontecendo com os diplomas relativos ao branqueamento de capitais.

Aliás, no projecto de alteração ao Código Penal são introduzidas alterações às disposições respeitantes ao crime de corrupção.

Sendo certo que, nesta matéria, não haverá mal em ler presente a máxima de Tácito: «Corruptíssima Republica Plurimae Legis» (in Anais).