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II SÉRIE-A — NÚMERO 18

tado —, procedendo à identificação dos titulares de órgãos do Estado e de outras individualidades que as devem integrar, ainda que não ignorem a necessária ponderação da sua dimensão. É neste sentido, por exemplo, que Mendonça e Cunha afirma que «a comitiva será tão reduzida quanto possível, sem prejuízo da dignidade e utilidade que deve ter» (cfr. Regras do Cerimonial Português, Lisboa, 1989, p. 76).

Do mesmo modo, assume particular significado para a discussão da matéria em apreço o entendimento corrente de que o cerimonial a seguir nas visitas do Chefe de Estado ao estrangeiro deve ser regulado de harmonia com o protocolo do país visitado, o qual não é totalmente estranho à composição da comitiva presidencial (neste sentido parece pronunciar-se José Calvet de Magalhães, Manual Diplomático, 2." ed., Lisboa, 1991, p. 148).

6 — Também não se conhecem no direito comparado quaisquer disposições legais equivalentes às propostas no projecto de lei n.º 52/VTl

Uma consulta feita aos parlamentos nacionais dos principais países da União Europeia limitou-se confirmar esta ideia, sendo elucidativo o que a este propósito responderam os serviços competentes do Congresso dos Deputados espanhol:

[...] em Espanha não existe limite máximo, legal ou consuetudinário, escrito, convencional ou pactuado, ao número de pessoas, sejam autoridades, funcionários ou quaisquer outras pessoas, que possam integrar a comitiva, séquito ou acompanhamento do Chefe de Estado, do Presidente do Governo ou de qualquer outra autoridade em viagens ao estrangeiro.

Na referida resposta, os mesmos serviços não deixaram, porém, de salientar que, embora nada tendo a ver com a noção ou a existência de um limite máximo de carácter gerai, as comitivas oficiais são por vezes reduzidas ao número mínimo indispensável de pessoas, uma vezes por razões de natureza orçamental, outras por razões de ordem política, outras ainda simplesmente por imperativos de lógica e racionalidade. -

De igual modo, e segundo os serviços competente* da respectiva Assembleia Nacional, em França não existe qualquer disposição regulamentar relativa à composição das comitivas oficiais do Presidente da República em deslocação aò estrangeiro, sendo a mesma fixada pelo próprio por acordo com o país de acolhimento.

7 — O enquadramento legal e doutrinário.do tema em debate há-de ser feito, assim, por referência quase exclusiva ao estatuto próprio de cada um dos órgãos de soberania, mediante o confronto das disposições do projecto de lei em análise com o respectivo quadro de funções constitucionais.

Com efeito, as disposições constantes do projecto de lei n.°52/Vn constituem seguramente disposições de natureza estatutária, dado que, ao imporem limites à composição de comitivas oficiais em deslocações ao estrangeiro dos titulares dos referidos órgãos, interferem com o funcionamento dos mesmos, delimitando negativamente o âmbito das respectivas competências ou, pelo menos, restringindo o seu livre exercício.

Ora, conforme salientam Gomes Canotilho e Vital Moreira, no artigo 113.°, n.°2, da Constituição estabelece-se o «princípio da reserva ou exclusividade constitucional quanto à formação, composição, competência e funcionamento dos órgãos de soberania» (cf. Constituição Anotada, 3* ed., Coimbra, 1993, p.494), pelo que apenas por sua expressa autorização ou remissão normativa podem os respectivos estatutos ter assento na legislação ordinária.

É a existência dessa autorização ou remissão normativa que importa, caso a caso, verificar.

8 — O Presidente da República representa a República Portuguesa (cf. artigo 123." da Constituição da República Portuguesa), cabendo inquestionavelmente neste domínio a respectiva representação externa, sem prejuízo das competências próprias do Governo em matéria de definição e condução da política externa (v. artigos 185.°, 200.°, n.° 1, alíneas b), c) e g), da Constituição da República Portuguesa e 203.°, n.° 1, alínea a)]; sobre estas funções e a concordância prática do seu exercício v., em especial, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Os Poderes do Presidente da República, Coimbra, 1991, pp. 84 e segs. e 110 e segs.).

São, por isso, pertinentes as reservas levantadas pelo Presidente da Assembleia da República, na medida em que nada se dispõe na Constituição nem nenhum dos seus preceitos autoriza ou remete para a lei o estabelecimento de limites ao exercício dos poderes compreendidos nessa função, designadamente os de livremente fixar a composição das comitivas que devam acompanhar as suas deslocações ao estrangeiro.

Se, conforme entende maioritariamente a doutrina, as competências do Presidente da República não podem ser ampliadas por lei, por maioria de razão «também não podem ser restringidas por efeito da lei» (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Os Poderes do Presidente da República, Coimbra, 1991, p. 40).

A esta conclusão não obsta, no caso em apreço, a circunstância de se exigir ao Presidente da República, nos termos do artigo 132." da Constituição, assentimento da Assembleia da República para se ausentar do território nacional.

De acordo com uma leitura prudente do princípio da separação e interdependência de poderes (v. artigo 114.° da Constituição da República Portuguesa), tal assentimento não pode ser entendido como compreendendo um poder de fiscalização política da Assembleia relativamente ao exercício da função de representação externa do Presidente (em sentido contrário, v. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Consft-tuição Anotada, 3.' ed., Coimbra, 1993, p. 573). Mais do que avaliar do mérito da sua deslocação ao estrangeiro, do que se trata é de aferir da oportunidade da sua ausência do território nacional.

Não é, pois, possível legitimar materialmente a vnidativa constitucional do Partido Popular numa qualquer «restrição implícita» contida no artigo 132." da Constituição da República Portuguesa.

9 — O mesmo juízo de inconstitucionalidade material se aplica relativamente às normas que estabelecem toutes à composição de comitivas oficiais em deslocações ao estrangeiro de membros do Governo, a quem, como já se viu, compete a definição e a condução da política externa, bem como a administração diplomática [v. artigos 185.', 200.°, n.° 1, alíneas b), c) e g), e 203.°, n.° 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa; na doutrina, v., por todos, Jorge Miranda, «As competências constitucionais no domínio da política externa», in Nação e Defesa, ano v, n.° 14, 1980, pp. 35 segs.).

Neste caso, acresce especialmente o facto de a matéria respeitante à organização e funcionamento do Governo ser da sua exclusiva competência legislativa, nos termos do artigo 201.°, n.° 2, da Constituição, o que naturalmente determinaria também a inconstitucionalidade orgânica das normas que lhe respeitam, caso viessem a ser aprovadas.

10 — Tal como o Governo, a Assembleia da República goza de uma ampla autonomia no que respeita à sua autc-organização e que se manifesta através da adopção do seu