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3176 | II Série A - Número 074 | 06 de Março de 2003

 

ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento".
Apurada a legitimidade da invocação do direito, importa então verificar se eventualmente existe, face ao caso concreto em apreciação, um interesse preponderante em relação à importância atribuída a esse direito, o que, a acontecer, implicaria a obrigação de prestação de testemunho com quebra do sigilo profissional.
De facto, no n.º 3 do artigo 135.º estipula-se que "o tribunal imediatamente superior àquele onde o incidente se tiver suscitado (...) pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada face às normas e princípios da lei penal, nomeadamente face ao princípio da prevalência do interesse preponderante". A mesma norma estipula que se o incidente for suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, a apreciação compete ao plenário das secções criminais. Em qualquer caso, estabelece-se que a intervenção é suscitada pelo juiz, oficiosamente ou a requerimento.
A atribuição da competência para decidir sobre a quebra do sigilo a um tribunal diverso e superior em relação àquele onde o incidente processual se tiver suscitado tem sido interpretada como visando conferir maior independência a essa deliberação. Com o mesmo objectivo, o n.º 5 do mesmo artigo estabelece que a decisão judicial só pode ser tomada depois de ouvido o organismo representativo da profissão em causa - neste caso, o Sindicato dos Jornalistas.
Esta limitação ao sigilo profissional foi apreciada pelo Tribunal Constitucional. A requerimento do então Presidente da República, Mário Soares, o Tribunal pronunciar-se-ia pela constitucionalidade do articulado, considerando que a restrição ao sigilo estabelecida no Código de Processo Penal não constituía "uma agressão desproporcionada" ao segredo profissional "dados os valores em favor dos quais (…) é sacrificado e as cautelas de que se faz rodear a quebra do segredo" (cf. Acórdão n.º 7/87, Diário da República, I Série, 9 de Fevereiro de 1987).
A regulação do sigilo profissional dos jornalistas tem igualmente em conta as circunstâncias em que aqueles exercem a profissão.
Assim, no Estatuto do Jornalista, visa impedir-se a revelação indirecta da fonte, através de outras pessoas a quem o jornalista, por razões profissionais, tiver revelado a sua identidade.
Sendo natural que o jornalista informe os superiores hierárquicos sobre a identidade da fonte, o artigo 11.º, n.º 2, do Estatuto estipula que "os directores de informação dos órgãos de comunicação social e os administradores ou gerentes das respectivas entidades proprietárias, bem como qualquer pessoa que nelas exerça funções, não podem, salvo com autorização escrita do jornalista envolvido, divulgar as suas fontes de informação".
Estabeleceu-se igualmente um conceito de fonte mais amplo, face à anterior legislação, incluindo "os arquivos jornalísticos de texto, som ou imagem das empresas ou quaisquer documentos susceptíveis de as revelar" e igualmente o "material utilizado" e "os elementos recolhidos no exercício da profissão", o que é claramente o caso do material fotográfico, blocos de apontamentos, material informático, cassettes, etc. (artigo 11.º, n.os 2, 3 e 4).
Os jornalistas e as empresas não podem ser desapossados do material utilizado ou obrigados a exibir os elementos recolhidos, salvo por mandado judicial e nos demais casos previstos na lei, nomeadamente os artigos 174.º e seguintes do Código de Processo Penal.
A alteração verificada na regulamentação no direito ao sigilo profissional, com a entrada em vigor do Código de Processo Penal de 1987, não influenciou a opinião dos jornalistas face ao carácter absoluto do direito.
No n.º 6 do Código Deontológico do Jornalista, aprovado em assembleia geral do respectivo Sindicato em Maio de 1993, estipula-se que "o jornalista não deve revelar, mesmo em juízo, as suas fontes confidenciais de informação (...)".
Esta norma pode representar para os jornalistas um conflito insanável, uma vez que se o tribunal lhes impõe a prestação do testemunho com inerente quebra do segredo profissional, nos termos do Código de Processo Penal, o Código Deontológico, que os próprios jornalistas aprovaram, aponta-lhes um caminho oposto. Isto é, a deontologia profissional transformou esse direito num verdadeiro dever.
Do ponto de vista deontológico, sublinhe-se ainda que a mesma norma assinala a necessidade dos jornalistas respeitarem os compromissos estabelecidos com as fontes. O escrupuloso cumprimento destes compromissos constitui uma condição essencial para que os jornalistas possam aceder a um conjunto de informações, que não estaria muitas vezes disponível, caso não se garantisse o sigilo da fonte.
O n.º 6 do Código Deontológico do Jornalista estabelece todavia uma excepção: o jornalista fica moralmente desobrigado de silenciar a fonte ou de respeitar compromissos que com ela tiver assumido, caso as informações canalizadas sejam falsas.
A defesa do direito ao sigilo não impede que tenha sido estatuído no Código, no mesmo n.º 6, que "o jornalista deve usar como critério fundamental a identificação das fontes". De facto, a credibilidade da informação oferece maiores garantias se a sua origem estiver devidamente assinalada. No entanto, não sendo a sua revelação muitas vezes possível, nomeadamente por ser essa uma condição essencial para a obtenção da informação, o direito ao sigilo das fontes confidenciais assume uma evidente importância no conjunto dos direitos dos jornalistas.

III - Enquadramento internacional

Na Europa, a grande maioria dos países reconhece este direito. Alguns países conferem-lhe mesmo consagração constitucional (Suécia, Espanha e Portugal). Em relação ao seu grau de protecção, alguns países reconhecem um direito absoluto (Áustria, Finlândia, Alemanha e Suécia), enquanto outros admitem algumas excepções (Dinamarca, Noruega e Grã-Bretanha). Noutros países, a protecção ao direito tem natureza meramente deontológica (Bélgica, Grécia, Itália e Malta) ou jurisprudencial (Holanda) (Cf. Alexis Guedj (1998), "La protection des sources journalistiques", Bruylant, Bruxelas).
O direito ao sigilo foi igualmente reconhecido pela Declaração dos Direitos e Deveres dos Jornalistas, adoptada em Munique em 1971 pelos sindicatos dos jornalistas dos países que então compunham a Comunidade Europeia, através de um texto que seria no ano seguinte adoptado pela Federação Internacional dos Jornalistas.
Numa resolução de 18 de Janeiro de 1994, o Parlamento Europeu reconheceu igualmente que "o direito dos jornalistas a manterem a confidencialidade das suas fontes contribui para assegurar aos jornalistas uma melhor qualidade da informação".