0014 | II Série A - Número 110S | 04 de Julho de 2003
Ora, é justamente o desiderato estabelecido na norma do artigo 2.º, alínea a), da Lei n.º 107/88, que se realiza nas normas dos artigos 26.º a 33.º do Decreto Lei n.º 64-A/89. Aqui, o Governo exerce uma competência normativa que tem os limites e se ordena aos fins ditados na lei de autorização.
Nas normas dos artigos 26.º a 33.º do Decreto Lei n.º 64-A/89, o legislador exige, no sentido da Constituição, uma motivação justa, processualmente adequada, judicialmente controlável e com pagamento de uma indemnização para os despedimentos por causa objectiva. Para isso, explicita as causas (motivos económicos ou de mercado, motivos tecnológicos, motivos estruturais (artigo 26.º, n.ºs 1 e 2)), impõe a verificação cumulativa de certas condições (artigo 27.º, n.º 1, alíneas a), b), c), d) e e)) e também critérios para a "concretização dos postos de trabalho a extinguir" (artigo 27.º, n.º 2).
Dentre as condições a que se subordina a cessação do contrato de trabalho relevam, em especial, a de não imputabilidade dos motivos invocados a culpa do empregador (artigo 26.º, n.º 1, alínea a)), a de impossibilidade prática da subsistência do vínculo (artigo 26.º, n.º 1, alínea a)) e a não existência de contratos a termo para as tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto (artigo 26.º, n.º 1, alínea a)), para além da garantia - que mais se afirma como garantia a posteriori - de uma indemnização. E relevam porque aí se revêem os traços essenciais da justificação que a garantia constitucional de segurança no emprego exige aos despedimentos por causa objectiva: a não disponibilidade do empregador sobre a relação de trabalho, a emergência da resolução do contrato como "imperativo prático" (Monteiro Fernandes), a inexistência de formas contratuais a termo para as tarefas correspondentes ao posto de trabalho a extinguir, aqui se consubstanciando um "controlo de prognoses" (Gomes Canotilho e Vital Moreira) sobre a permanência no futuro das causas de extinção do vínculo.
A condição de impossibilidade prática de subsistência do contrato (artigo 26.º, n.º 3) é mesmo especialmente concretizada por forma a poder se constituir em critério de valoração para o controlo do despedimento. Esse critério - que é, de novo, explicitado na norma do artigo 30.º, n.º 1, alínea b) - é o da inexistência de uma alternativa razoável à cessação do vínculo (sublinhado no original).
Mas no sistema das normas em análise relevam ainda garantias adequadas de procedimento: a entidade empregadora deve comunicar às estruturas representativas dos trabalhadores a intenção de extinguir os postos de trabalho em causa (artigo 28.º). Essas estruturas e o trabalhador podem "em caso de oposição à cessação, emitir parecer fundamentado" e "solicitar a intervenção da Inspecção Geral do Trabalho" (artigo 29.º).
A decisão de despedimento deve ser fundamentada, entre o mais, com a indicação dos motivos e "justificação de inexistência de alternativas à cessação do contrato do ocupante do posto de trabalho extinto" (artigo 30.º) e comunicada ao trabalhador e seus representantes e também à Inspecção Geral do Trabalho.
O Decreto Lei n.º 64 A/89 define ainda as causas de nulidade do despedimento cujo controlo é cometido ao tribunal (artigo 32.º) e institui a providência cautelar da suspensão de cessação do contrato (artigo 33.º). Finalmente, garante ao trabalhador os direitos a aviso prévio, crédito de horas e compensação pecuniária por despedimento (artigo 31.º, remetendo para os artigos 21.º, 22.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 23.º).
A cessação do contrato de trabalho por causas objectivas, prevista nas normas dos artigos 26.º a 33.º do diploma anexo ao Decreto Lei n.º 64-A/89, não afronta a garantia constitucional da segurança no emprego. Aí estão suficientemente determinadas as causas objectivas e a sua ligação à circunstância da impossibilidade prática de subsistência do vínculo laboral, aí se afasta expressamente a liberdade de "disposição" do empregador, aí se estabelecem garantias adequadas de procedimento. Essas normas radicam a cessação do contrato de trabalho na ideia de que a manutenção do trabalho deixou de ser possível ou proporcionada em certas situações. E têm a determinabilidade exigível para oferecer ao juiz critérios de controlo dos despedimentos concretamente declarados."
A evocação da anterior jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a presente problemática não pode prescindir de referência a dois aspectos tratados no Acórdão n.º 64/91, emitido em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade do Decreto da Assembleia da República n.º 302/V: um relativo à prestação de trabalho em comissão de serviço e o outro relativo à cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador.
Quanto ao primeiro aspecto, o diploma em causa, propondo se regular pela primeira vez em Portugal o desempenho de funções em comissão de serviço no âmbito de um contrato de trabalho subordinado, previa três situações: (i) desempenho dessas funções por trabalhador da empresa, (ii) desempenho por pessoa estranha à empresa mas com simultânea colocação em lugar ou categoria existente ou a criar na empresa e (iii) desempenho por pessoa estranha à empresa com previsão da cessação do contrato com a cessação da comissão de serviço. Podendo o desempenho de funções em comissão de serviço (para o exercício de cargos de administração, de direcção directamente dependentes da administração e de secretariado pessoal relativas aos titulares desses cargos) cessar em qualquer momento por decisão de qualquer das partes, a violação da garantia da segurança do emprego não se colocava nas duas primeiras situações: cessada a comissão de serviço por iniciativa do empregador, o trabalhador da empresa regressava à categoria anteriormente detida (ou àquela a que entretanto devesse ter sido promovido) e o trabalhador recém admitido assumiria o lugar ou a categoria para que fora simultaneamente contratado. Só na terceira situação se colocavam as questões do eventual desrespeito da aludida garantia constitucional e da admissibilidade da disposição pelo trabalhador de um direito irrenunciável. A essas questões a maioria do Tribunal emitiu então pronúncia de não inconstitucionalidade com a seguinte fundamentação:
"Foi entendido que os cargos dirigentes ou a eles equiparados se revestem de um evidente carácter fiduciário, de tal forma que, pela sua natureza, são exercidos pelos titulares de forma precária, estando subjacente sempre uma ideia de que a todo o tempo pode cessar a comissão, por decisão de qualquer das partes no contrato. Não está legalmente excluído que as partes possam apor um termo a este contrato. Em algumas dessas funções, nomeadamente nas funções de administração, tem se predominantemente entendido que se não está perante um contrato de trabalho, mas antes perante um contrato de mandato ou de prestação de serviço