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1611 | II Série A - Número 028 | 15 de Janeiro de 2004

 

associada ou federada (artigo 1.º, que é decalcado do artigo 1.º da Lei n.º 140/99).
Também as atribuições e as funções de polícia fixadas no projecto de lei são, no essencial, as constantes da Lei n.º 140/99.
Do mesmo modo, as funções de segurança a que se refere o n.º 2 do artigo 2.º mantêm a limitação estabelecida no n.º 3 do artigo 237.º no que respeita à cooperação na manutenção da tranquilidade pública e na protecção das comunidades locais.
No entanto, como já mencionado, algumas das alterações propostas exigem reflexão particular, destacando-se, pela relevância das suas implicações, a qualificação da hierarquia e dos agentes da polícia municipal como órgãos de polícia criminal, o alargamento da competência territorial e a criação de um estatuto disciplinar próprio.
Merecem igualmente atenção especial as alterações sugeridas quanto à dependência hierárquica e à coordenação.
a) Órgãos de polícia criminal:
O projecto de lei vem propor, como n.º 3 do artigo 3.º, que "para os efeitos estritamente conexos com as suas funções e o exercício das suas competências, a hierarquia e os agentes das polícias municipais consideram-se órgãos de polícia criminal para os efeitos previstos na lei processual penal".
De acordo com a definição estabelecida na alínea c) do n.º 1 do artigo 1.º do Código de Processo Penal (CPP), são órgãos de polícia criminal todas as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados pelo CPP.
Ainda de acordo com o CPP, compete aos órgãos de polícia criminal coadjuvar as autoridades judiciárias com vista à realização das finalidades do processo (n.º 1 do artigo 55.º) e, em especial, mesmo por iniciativa própria, colher notícia dos crimes e impedir quanto possível as suas consequências, descobrir os seus agentes e levar a cabo os actos necessários e urgentes destinados a assegurar os meios de prova (n.º 2 do artigo 55.º).
Diz, por sua vez, o artigo 56.º do CPP que, nos limites do disposto no n.º 1 do artigo 55.º, os órgãos de polícia criminal actuam, no processo, sob a direcção das autoridades judiciárias e na sua dependência funcional.
Por seu turno, a Lei n.º 21/2000, de 10 de Agosto (organização da investigação criminal), estabelece taxativamente como órgãos de polícia criminal de competência genérica a Polícia Judiciária, a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana (artigo 3.º, n.º 1), e como órgãos de polícia criminal de competência específica todos aqueles a quem a lei confira esse estatuto (artigo 3.º, n.º 2).
Ora, tomando apenas em consideração o artigo 3.º, n.º 3, poderia parecer que a iniciativa legislativa em apreço pretenderia modificar este estado de coisa, aditando a "hierarquia" (de forma algo imprecisa, diga-se) e os agentes das polícias municipais ao rol dos órgãos de polícia criminal. Esta intenção parece esbarrar com os limites constitucionais acima enunciados. As polícias municipais actuam, no âmbito da segurança interna, unicamente nos termos delimitados pelo n.º 3 do artigo 237.º da Constituição, isto é, na manutenção da tranquilidade pública e na protecção das comunidades locais, em cooperação com as forças de segurança, não dispondo de competências nem para a prevenção nem para a investigação criminal.
Afigura-se, pois, que as polícias municipais não podem ser qualificadas como órgãos de polícia criminal, mesmo para os efeitos estritamente conexos com as suas funções e o exercício das suas competência, uma vez que a Constituição lhes exclui competências que excedam os limites consignados no n.º 3 do artigo 237.º.
Sucede, porém, que o próprio projecto de lei não é consequente com essa qualificação das polícias municipais. A qualificação do artigo 3.º, n.º 3, não é concretizada ao longo do projecto com a atribuição de verdadeiras competências de prevenção e investigação criminal.
Com efeito, de acordo com a primeira parte da alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do projecto de lei (correspondente à alínea f) na lei actual), cabe aos polícias municipais denunciar os crimes de que tiverem conhecimento no exercício das suas funções, e por causa delas. Mas se é apenas isto, os agentes da polícia municipal estão simplesmente obrigados à denúncia nos precisos termos em que o estão os funcionários, de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 242.º do CPP, uma vez que as entidades policiais estão obrigadas à denúncia de todos os crimes de que tomem conhecimento (alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo).
Por outro lado, a prática dos actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova até à chegada do órgão de polícia criminal competente, prevista na parte final da citada alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º, corresponde ao dever de tomar as medidas necessárias para impedir o desaparecimento da prova ou de proceder a apreensão de objectos a que se referem os artigos 48.º e 48.º-A do regime geral das contra-ordenações.
Não podem os polícias municipais, no entanto, proceder às diligências do artigo 249.º do CPP que impliquem investigação, designadamente exames dos vestígios do crime, porque para isso não estão autorizados, até por esta mesma alínea (que só lhe atribui competência para a prática de actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova).
Acresce que se a polícia municipal tem competência para actuar meramente "até à chegada do órgão de polícia criminal competente", isso só pode ser interpretado como significando que ele própria não é um órgão de polícia criminal.
Também a detenção a que se refere a alínea f) do artigo 4.º do projecto de lei (correspondente à alínea e) na lei em vigor) não é cometida exclusivamente aos órgãos de polícia criminal, uma vez que, ao abrigo do disposto no artigo 255.º do CPP, qualquer pessoa o pode fazer se não estiver presente nem puder ser chamada em tempo útil qualquer autoridade judiciária ou entidade policial. Aliás, ao estar obrigada à entrega imediata do detido às autoridade judiciárias ou às entidades policiais, a polícia municipal assemelha-se mais com uma "qualquer pessoa" do que com um órgão de polícia criminal.
Da mesma maneira, nos termos do artigo 14.º do projecto de lei (igual ao da lei actual) as polícias municipais apenas podem identificar "infractores", mas já não "suspeitos", que o artigo 250.º do CPP reserva aos órgãos de polícia criminal.
Deste modo, a identificação permitida pelo artigo 14.º mais não é do que o poder de identificação que prevê o artigo 49.º do regime geral das contra-ordenações.
Ficamos assim perante uma situação invulgar do ponto de vista jurídico-constitucional: o projecto de lei anuncia que pretende atribuir à "hierarquia" e aos agentes das polícias municipais a natureza de órgãos de polícia criminal, intenção que contenderia com a lei fundamental se