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II SÉRIE-A — NÚMERO 74 24

O exercício das responsabilidades parentais é um poder funcional e, por isso, um poder vinculado e

controlado.1

A Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, que altera o regime jurídico do divórcio, originária dos projetos de lei n.º

486/X/3 (BE) e n.º 509/X/3 (PS), introduziu profundas alterações ao regime de exercício das responsabilidades

parentais.

A regra é, por força do disposto no n.º 1 do artigo 1906.º Código Civil, a de que as responsabilidades parentais

relativas às questões de particular importância são exercidas em comum por ambos os progenitores, nos

mesmos termos que vigoram na constância do matrimónio.

O afastamento desta regra ocorre apenas quando o exercício em conjunto se mostre contrário aos interesses

da criança – n.º 2 do artigo 1906.º do Código Civil –, e só o tribunal, através de decisão fundamentada, pode

determinar que as responsabilidades parentais sejam exercidas apenas por um dos progenitores.

A definição de questões de particular importância não foi objeto de qualquer definição ou enumeração por

parte do legislador, pois só no caso concreto e em face das características e necessidades particulares de cada

menor se pode determinar o que integra ou não o conceito de particular importância. Foi confiada à doutrina e

à jurisprudência a definição das situações que podem consubstanciar os atos e as questões de particular

importânciapara a vida do filho que podem dar origem a um conflito entre os progenitores e que deve ser

resolvido pelo tribunal.

Mesmo o projeto de lei n.º 509/X (3.ª) (PS), na sua exposição de motivos, refere-se ao exercício conjunto das

responsabilidades parentais nos seguintes termos: 5. Responsabilidades parentais -Impõem-se o exercício

conjunto das responsabilidades parentais, salvo quando o tribunal entender que este regime é contrário aos

interesses do filho. O exercício conjunto, porém, refere-se apenas aos “atos de particular importância”; a

responsabilidade pelos “atos da vida quotidiana” cabe exclusivamente ao progenitor com quem o filho se

encontra. Dá-se por assente que o exercício conjunto das responsabilidades parentais mantém os dois

progenitores comprometidos com o crescimento do filho; afirma-se que está em causa um interesse público que

cabe ao Estado promover, em vez de o deixar ao livre acordo dos pais; reduz-se o âmbito do exercício conjunto

ao mínimo –aos assuntos de “particular importância”. Caberá à jurisprudência e à doutrina definir este âmbito;

espera-se que, ao menos no princípio da aplicação do regime, os assuntos relevantes se resumam a questões

existenciais graves e raras, que pertençam ao núcleo essencial dos direitos que são reconhecidos às crianças.

Pretende-se que o regime seja praticável – como é em vários países europeus – e para que isso aconteça pode

ser vantajoso não forçar contactos frequentes entre os progenitores. Assim se poderá superar o argumento

tradicional de que os pais divorciados não conseguem exercer em conjunto as responsabilidades parentais.

Para os autores da publicação mencionada, não é difícil determinar que a prática de atos de violência

doméstica seja uma questão de particular importância da vida da criança, para que o tribunal decida do exercício

exclusivo das responsabilidades parentais.

Refira-se, ainda, que se aplica o disposto nos artigos 1901.º a 1908.º Código Civil, relativos ao exercício das

responsabilidades parentais, nas situações de cônjuges separados de facto (artigo 1909.º do Código), quando

a filiação se encontra estabelecida relativamente a ambos os progenitores e estes vivam em condições análogas

às dos cônjuges (artigo 1911.º) e quando a filiação se encontra estabelecida relativamente a ambos os

progenitores e estes não vivam em condições análogas às dos cônjuges (artigo 1912.º).

Os autores do projeto de lei em análise salientam o disposto no artigo 152.º do Código Penal no sentido do

reforço da proteção das vítimas de violência doméstica, alargando a abrangência do crime e assumindo a

importância das penas acessórias. Redação introduzida pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro, originária da

proposta de lei n.º 75/XII (1.ª) e do projeto de lei n.º 194/XII (1.ª) (BE).

Para a doutrina2, o artigo 152.º – violência doméstica, está simultaneamente, integrado no Título I, dedicado

aos “crimes contra as pessoas”. A ratio do tipo não está na proteção da comunidade familiar ou conjugal, mas

sim na proteção da pessoa individual e da sua dignidade humana. Que a ratio deste tipo legal não é a defesa

da subsistência da comunidade familiar ou conjugal é o que resulta, desde logo, do próprio facto de este crime

1 PODER PATERNAL E RESPONSABILIDADES PARENTAIS. Autores: Procuradora da República, Ana Teresa Leal e Procuradora-adjunta da República Felicidade D’Oliveira e Juízes de Direito: Helena Gomes de Melo, João Vasconcelos Raposo, Luís Baptista Carvalho e Manuel do Carmo Bargado. Editora Quid Juris. e Guia Prático do Divórcio e das Responsabilidades Parentais – Centro de Estudos Judiciários. 2 Prof. Dr. Jorge de Figueiredo Dias. Comentário Conimbricense do Código Penal. Parte Especial, Tomo I. Porto Editora.