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11 DE DEZEMBRO DE 2019

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vista judicial, mas também no âmbito laboral e no acesso aos cuidados de saúde, bem como dar resposta às

necessidades de prevenção e de sensibilização sobre a violência doméstica, e configura o estatuto de vítima de

violência doméstica, prevendo um conjunto de direitos e deveres. Desde a sua aprovação, esta lei foi alterada

cinco vezes, pelas Leis n.os 19/2013, de 22 de fevereiro, 82-B/2014, de 31 de dezembro, 129/2015, de 3 de

setembro, 48/2016, de 28 de dezembro e 24/2017, de 24 de maio.

Em causa em ambas as iniciativas está a alteração do artigo 33.º, que dispõe sobre as declarações para

memória futura da vítima de violência doméstica, artigo que sofreu até à data apenas uma alteração, pela Lei

n.º 129/2015, de 3 de setembro. Prevê-se neste artigo a possibilidade de o juiz proceder, a requerimento da

vítima ou do Ministério Público, à inquirição da vítima no decurso do inquérito para, se necessário, esse

depoimento ser tomado em conta no julgamento, e regula-se a forma como a tomada de declarações decorre.

O mesmo regime segue a tomada de declarações do assistente e das partes civis, de peritos e de consultores

técnicos e acareações e é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 352.º (afastamento do arguido

durante a prestação de declarações), 356.º (reprodução ou leitura permitidas de autos e declarações), 363.º

(documentação de declarações orais) e 364.º (forma da documentação) do Código de Processo Penal. Sempre

que for possível e tal não ponha em causa a saúde física ou psíquica de pessoa que deva prestar o depoimento,

esta tomada de declarações não prejudica a prestação de depoimento no julgamento.

As declarações para memória futura no processo penal encontram-se previstas no artigo 271.º do Código de

Processo Penal, correspondendo à possibilidade de que tais declarações sejam prestadas no decurso do

inquérito a fim de que possam, se necessário, ser tomadas em conta no julgamento. Esta possibilidade existe

quando doença grave ou deslocação para o estrangeiro previsivelmente impeça a testemunha de ser ouvida em

julgamento ou se se tratar de vítima de crime de tráfico de pessoas ou contra a liberdade e autodeterminação

sexual. No caso de vítima de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual de menor são obrigatórias.

Este regime jurídico constitui restrição ao princípio de que a audiência de julgamento é o «palco» para a

produção da prova que pode ser valorada pelo legislador: «a produção da prova que deve servir para fundar a

convicção do julgador tem de ser a realizada na audiência e segundo os princípios naturais de um processo de

estrutura acusatória: os princípios da imediação, da oralidade e da contraditoriedade na produção dessa prova»2.

«A recolha de declarações para memória futura constitui uma exceção ao princípio da imediação, pois as

provas recolhidas sob a égide do juiz de instrução podem ser tomadas em conta no julgamento. (…) Inicialmente

pensado pelo legislador como meio preventivo de recolha de prova suscetível de perder-se ou inviabilizar-se

antes do julgamento, o âmbito de recolha das declarações para memória futura foi posteriormente ampliado, já

não para prevenir o perigo de perda da prova, mas para proteção das vítimas, especialmente das menores»3.

O princípio da imediação pressupõe uma «relação de proximidade comunicante que deve ser estabelecida

entre o tribunal e os sujeitos e participantes processuais, por não ser apenas relevante o que se diz, mas também

a forma como se diz, nomeadamente para efeitos de formação da convicção do julgador», sendo que tanto o

princípio da imediação como o princípio da oralidade «são indissociáveis do princípio da acusação, do

contraditório, da livre apreciação da prova e da investigação, bem como de uma estruturação do processo

segundo um modelo acusatório, sem menosprezo da finalidade de descoberta da verdade e de realização da

justiça»4.

Através do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2017, de 11.10.2017, fixou-se a jurisprudência de

que «as declarações para memória futura, prestadas nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal,

não têm de ser obrigatoriamente lidas em audiência de julgamento para que possam ser tomadas em conta e

constituir prova validamente utilizável para a formação da convicção do tribunal, nos termos das disposições

conjugadas dos artigos 355.º e 356.º, n.º 2, alínea a), do mesmo Código».

Finalmente, deve ter-se em conta que, nos termos do artigo 152.º do Código Penal, comete o crime de

violência doméstica quem infligir, de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos

corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ao cônjuge, ex-cônjuge ou pessoa de outro ou do mesmo

sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos

cônjuges, ainda que sem coabitação; a progenitor de descendente comum em 1.º grau; ou a pessoa

2 José Damião da Cunha, O regime processual de leitura de declarações na audiência de julgamento (artigos 356.º e 357.º do CPP), RPCC, 1997, p. 405. 3 Henriques Gaspar, António, e outros, Código de Processo Penal Comentado. Coimbra: Almedina, 2014. 4 Maria João Antunes, Direito Processual Penal, 2.ª ed., Almedina, 2018, ps. 186-7.