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II SÉRIE-A — NÚMERO 47

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1,3 gigatoneladas de emissões de carbono.

De resto, dado que o Brasil é o maior parceiro comercial de entre os Estados-Membros do Mercosul,

continuar a negociar o acordo de livre comércio UE-Mercosul com o governo de Jair Bolsonaro, sem fazer

quaisquer considerações aos persistentes atropelos aos direitos humanos e à própria Constituição Brasileira,

seria sentenciar a UE e o Estado português a uma postura conivente para com os ataques à sustentabilidade

ambiental, aos direitos humanos e à democracia que vão tendo lugar naquele país.

Da aprovação deste acordo advirão igualmente consequências nefastas para o setor agrícola e para o

consumidor final.

Por um lado, tanto na União Europeia quanto nos países pertencentes ao Mercosul, os pequenos

agricultores e as cooperativas locais poderão vir a sofrer grandes perdas com este acordo, sobretudo com a

materialização da monocultura impulsionada pelo agronegócio. Os agricultores europeus, especialmente os

produtores de carne e grãos, serão assim obrigados a competir com as importações de grandes empresas do

agronegócio dos países do Mercosul, que conseguem baixar os seus custos através do uso de pesticidas e

outros químicos. É provável, por isso, que o acordo UE-Mercosul possa resultar numa maior dependência de

produtos importados e na substituição dos pequenos agricultores e negócios locais pela grande indústria.

Por outro lado, nos países do Mercosul as regulamentações sobre o uso de pesticidas, antibióticos e

organismos geneticamente modificados (OGM) são muito mais ténues do que no seio da UE. No caso do

Brasil, foi aprovado o uso de 200 pesticidas que são proibidos na União Europeia, com 30 destes a serem

considerados «muito perigosos» pela Organização Mundial de Saúde; na Argentina, entre os 150 pesticidas

usados na cultura da soja, 35 são proibidos na UE.

No caso de outros acordos firmados no passado, verifica-se que quando um acordo de comércio livre é

implementado, os controlos de segurança alimentar conduzidos nas fronteiras da UE não aplicam normas com

rigor suficiente para impedir a entrada de produtos perigosos na UE. Alternativamente, os acordos comerciais

poderiam ser usados para melhorar os padrões de segurança alimentar entre os parceiros comerciais da UE,

mas sem que haja uma mudança radical nestas políticas, é provável que grandes volumes de produtos não

saudáveis sejam enviados para a UE, resultando numa redução significativa da segurança alimentar para os

consumidores finais.

O mercado de trabalho também será seriamente afetado por este acordo UE-Mercosul. Como resultado da

implementação do acordo de livre comércio UE-Mercosul e da competição desenfreada e desleal que daí

surgirá, são esperadas grandes vagas de desemprego nas indústrias automóvel, metalúrgica, química e têxtil,

com particular destaque para o Brasil e a Argentina, enquanto que para o Uruguai e Paraguai, países menos

industrializados do Mercosul, a forte concorrência de mercado das importações europeias poderá vir a

impossibilitar a industrialização destes países num futuro próximo.

No caso da Argentina, um estudo de dezembro de 2017 revelou que o país estaria em risco de perder 186

mil empregos em consequência da ratificação do acordo e com o subsequente aumento das exportações

europeias nos setores de componentes automóveis, maquinaria, indústria química, têxteis e calçado. Neste

quadro laboral, o Brasil destaca-se novamente pela negativa, encontrando-se atualmente entre os Estados

que mais têm violado as convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho.

Ao mesmo tempo, e tal como ocorreu aquando da ratificação de outros acordos comerciais de larga escala,

pretende-se avançar para a implementação de sistemas de justiça paralela (ISDS) através de tribunais

arbitrais à margem dos ordenamentos jurídicos dos países, que existirão, essencialmente, para defender os

interesses das multinacionais contra decisões dos Estados que possam afetar os seus lucros.

Isto significa, efetivamente, uma retirada de poder político ao Estado e do seu livre arbítrio para optar por

políticas públicas em benefício dos seus cidadãos, em detrimento dos interesses económico-financeiros das

grandes corporações, já que, com estes acordos, as empresas estrangeiras passam a ter o poder de

processar o Estado, sempre que considerem que alguma decisão ou medida por ele aprovada tem

interferência nos seus lucros.

Os exemplos já existentes permitem vislumbrar como podem ser utilizados perniciosamente no futuro: o

grupo americano Renco processou o Peru porque este país decidiu limitar as emissões tóxicas e a

multinacional considerou que isso era uma restrição à sua atividade; a Philip Morris processou o Uruguai e a

Austrália pelas legislações antitabaco aprovadas nestes países; a Vattenfall processou a Alemanha quando

esta decidiu abandonar os projetos de energia nuclear. Nestes tribunais e com os mecanismos previstos no