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15 DE JUNHO DE 2021

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pela monitorização das sentenças judiciais por crimes ambientais desde 2016, segundo a qual, «na última

década, apesar das autoridades terem registado cerca de 82 mil crimes ambientais, apenas 6% dos casos de

poluição e danos contra a Natureza foram julgados13».

Estas potencialidades inequívocas são também acompanhadas de um conjunto de riscos para os

denunciantes, que são objeto de preocupantes retaliações, que vão desde o despedimento, às transferências

forçadas de serviço, despromoções, estigmatização profissional, imposição de sanções disciplinares, práticas

de blacklisting, até à instauração de ações judiciais que visam tão-somente condicionar a ação do denunciante

e a sua liberdade de expressão – conhecidas como strategic lawsuit against public participation (SLAPP). O

recurso às ações sob a forma de SLAPP são práticas que, sendo retaliatórias, são legais no nosso país e são

frequentemente utilizadas contra denunciantes cujas denúncias atinjam canais externos, como a comunicação

social. Constituem, por isso, um fator de inibição para a denúncia, a par de colocar o denunciante em situação

de extrema vulnerabilidade. Conforme explica a Associação Cívica Transparência e Integridade14, esta situação

transmite «uma forte incoerência e desproporcionalidade, providenciando aos agentes suspeitos de crime ou de

má conduta os meios necessários para agirem contra alegações que considerem injustas, sem estabelecer

mecanismos igualmente eficazes ou céleres para a proteção dos denunciantes contra retaliações ou pressões».

No nosso país, esta forma de retaliação, que visa sujeitar o denunciante à exposição pública num moroso e

dispendioso processo judicial, tem sido particularmente frequente no âmbito dos denunciantes de crimes

ambientais, podendo a perversidade deste mecanismo ser demonstrada pelo caso emblemático de Arlindo

Marques, ativista do movimento ambientalista Protejo, conhecido como o «guardião do Tejo». Neste caso,

ocorrido em 2017, a Celtejo, empresa de Vila Velha de Ródão que, até já havia reconhecido publicamente ter

ultrapassado os limites legais de controlo dos efluentes lançados no Tejo, intentou uma ação judicial em que

exigia uma indemnização de 250 mil euros a Arlindo Marques por difamação, a qual, por pressão da sociedade

civil, acabou por ser retirada em 2019.

Deverá sublinhar-se ainda que, segundo um estudo realizado para a Comissão Europeia em 201915, a falta

de proteção dos denunciantes na União Europeia tem impactos financeiros significativos, com a perda de

benefícios potenciais no âmbito da contratação pública na ordem dos 5.8 a 9.6 mil milhões de euros por ano no

conjunto da União Europeia.

Cientes das potencialidades do whistleblowing, das fragilidades a que estão expostos os denunciantes e para

assegurar uma política criminal assente nos princípios da responsabilização e da transparência, diversos

organismos internacionais têm incentivado os diversos países à consagração generalizada do whistleblowing

enquanto instrumento de política criminal e têm vindo a conferir uma cada vez maior proteção dos denunciantes.

No plano da Organização das Nações Unidas, deverá destacar-se a Convenção das Nações Unidas contra

a Corrupção, assinada em 9 de dezembro de 2003 e ratificada por Portugal por via da Resolução da Assembleia

da República n.º 45/2007, de 21 de setembro, dispõe no seu artigo 33.º que «cada Estado-Parte deverá

considerar a incorporação no seu sistema jurídico interno de medidas adequadas para assegurar a proteção

contra qualquer tratamento injustificado de quem preste às autoridades competentes, de boa-fé e com base em

suspeitas razoáveis, informações sobre quaisquer fatos relativos às infrações estabelecidas em conformidade

com a presente Convenção».

No domínio do Conselho da Europa, podemos destacar como relevantes os seguintes instrumentos. Em

primeiro lugar, temos a Convenção Penal sobre a Corrupção, do Conselho da Europa (ETS 173), assinada em

30 de abril de 2003 e aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 68/2001, de 26

de outubro, que menciona no seu artigo 22.º dispõe que «cada Parte adotará as medidas que se revelem

necessárias para assegurar uma proteção efetiva e adequada: a) às pessoas que forneçam informações

relativas às infrações penais previstas nos artigos 2.º a 14.º ou que, de outro modo, colaborem com as

autoridades responsáveis pela investigação ou pela instauração do procedimento criminal». Em segundo lugar,

a Convenção Civil sobre a Corrupção (ETS 174), adotada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em

4 de novembro de 1999, estabelece no seu artigo 9.º que «cada Parte adotará as medidas que se revelem

necessárias para proteger os trabalhadores que, tendo fundamentos razoáveis para suspeitar corrupção,

13 Disponível em: https://www.publico.pt/2021/02/22/sociedade/noticia/crimes-ambientais-nao-sao-punidos-tribunais-penas-prisao-1951646 14 Transparência e Integridade – Associação Cívica (2013), Uma Alternativa ao Silêncio: A proteção de denunciantes em Portugal, página 5. 15 Rodrigo Serra Lourenço (2019), «Aprender a denunciar na era da técnica: O whistleblowing e o impacto da sua consagração legal para as organizações e relações de trabalho», in Revista do Centro de Estudos Judiciários, n.º 2, 2.º semestre de 2020, página 185.