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14 DE ABRIL DE 2022

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República (doravante PGR) parecer1 sobre a interpretação do artigo 8.º da Lei n.º 64/93, de 26 de agosto,

sendo o tema atualmente previsto na Lei n.º 52/2019, de 31 de julho.

Um dos casos tornados públicos e que a PGR menciona no seu parecer, é o do filho do Secretário de

Estado da Proteção Civil, ter uma participação social minoritária, e ter celebrado contratos com pessoas

coletivas de direito público que, no caso, não estavam em nenhuma relação de dependência administrativa ou

política com o mesmo Secretário de Estado. Tendo a PGR vindo a concluir que na sua interpretação não

haveria impedimento à contratação por não se tratar de negócio no âmbito da tutela do referido Secretário de

Estado.

A questão que se impõe, é se tal interpretação da lei cumpre os propósitos do regime de impedimentos ou

se a lei deve ser alterada. Vejamos.

O regime de impedimentos tem como objetivo a garantia da imparcialidade da atuação administrativa.

Recorrendo ao mesmo parecer, podemos ler Maria da Glória Garcia e Tiago Macieirinha, onde em anotação

ao artigo 69.º do Código do Procedimento Administrativo referem que: «Assim, os específicos impedimentos

vertidos no artigo 8.º destinaram-se a impedir que a suspeição do favorecimento pessoal ou familiar do titular

do órgão ou do cargo manche a imagem pública do próprio ente público, com prejuízo para a prossecução do

interesse público e para a consecução dos objetivos de imparcialidade e transparência que forçosamente o

devem nortear ou que, por seu turno, as empresas em cujo capital social participe, por si ou conjuntamente

com pessoas do seu círculo de confiança, não sofram o anátema de beneficiarem indevidamente de

vantagens inerentes à sua particular relação fiduciária com os titulares dos órgãos do poder e que, de outro

modo, alegadamente, não obteriam.»

Tendo a PGR determinado que no caso do já referido Secretário de Estado (e noutros como o dele) não

haveria qualquer impedimento na medida em que não se tratava de uma área tutelada por si. Assim, a

conclusão a que chegaram foi que «a formulação de juízos de desvalor é indissociável do facto de ser a

eventual intervenção do titular do cargo político que, em teoria, condicionou ou foi suscetível de ditar o

desfecho do concurso público. O que arreda da sua esfera de abrangência os casos, como os ‘hipotisados’ no

pedido de parecer, em que os concursos públicos foram abertos e tramitaram perante outros órgãos do Estado

e/ou pessoas coletivas públicas situadas fora da esfera de ação do governante e em que os subsequentes

contratos foram celebrados no termo de um concurso, após o escrupuloso cumprimento de todas as

formalidades aplicáveis, prescritas pelo Código dos Contratos Públicos».

Importa, no entanto, referir que tal posicionamento defrauda os objetivos do regime de impedimentos e,

havendo vontade de beneficiar um familiar, pode falar com um colega de Governo para pedir que a

contratação seja feita através da sua tutela e não da do próprio. É verdade que o referido regime dificulta, mas

não impede que tais situações ocorram.

O Chega defende que a Administração Pública deve fazer o que estiver ao seu alcance para que o regime

de contratação pública seja tão transparente quanto possível, bem como se deve procurar acabar com todo o

tipo de favorecimentos pessoais na esfera governamental.

A Organização das Nações Unidas aprovou a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, sendo

que nas medidas preventivas determina que «Cada Estado Parte deverá, em conformidade com os princípios

fundamentais do seu sistema jurídico, desenvolver e implementar ou manter políticas de prevenção e de luta

contra a corrupção, eficazes e coordenadas, que promovam a participação da sociedade e reflitam os

princípios do Estado de direito, da boa gestão dos assuntos e bens públicos, da integridade, da transparência

e da responsabilidade». Sendo, inequivocamente, uma obrigação do Estado português atuar nesta matéria. No

fundo, existe o reconhecimento por parte da ONU e, consequentemente, dos seus Estados-Membros, que a

corrupção coloca em causa a estabilidade e a segurança das sociedades, mina a confiança dos cidadãos tanto

nas instituições como nos valores democráticos; que os casos de corrupção envolvem, em muitos casos,

recursos dos Estados e que a aquisição ilícita de riqueza pessoal pode ser particularmente prejudicial para as

instituições democráticas, as economias nacionais e o Estado de direito. Tendo, portanto, impactos profundos

na nossa sociedade.

A isto acresce que, segundo os resultados do Barómetro Global de Corrupção2 de 2021, quase 90% dos

portugueses acredita que há corrupção no Governo, que os Deputados da Assembleia da República e os

banqueiros estão entre os mais corruptos e 41% dos portugueses considerou que a corrupção aumentou.

1 https://www.ministeriopublico.pt/pareceres-pgr/9319