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8 DE JUNHO DE 2022

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filiação estabelecida durante a menoridade produz efeitos relativamente à nacionalidade».

Os proponentes invocam a necessidade de garantir o acesso dos netos de portugueses à nacionalidade

originária dos seus ascendentes e a simplificação da aquisição da nacionalidade por parte dos cônjuges de

cidadãos nacionais, bem como das pessoas cujos progenitores, pelas mais variadas razões, só reconheceram

a respetiva paternidade na sua idade adulta.

Os argumentos invocados são muito relevantes, sobretudo num país de emigração e aos mesmos pode

acrescer, por exemplo, o princípio da não discriminação de quem conhece a filiação já depois da maioridade.

Mas há também razões que militam em favor da manutenção da norma constante do artigo 14.º que, aliás,

se mantém inalterada desde a versão originária da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro.

Essas razões são assim sumariadas por RUI MOURA RAMOS: «O fundamento desta solução [do artigo

14.º] decorre das razões que estão na base quer do reconhecimento do «ius sanguinis» quer do relevo

reconhecido às hipóteses de filiação, mesmo adotiva, em sede de nacionalidade. Com efeito, não são

considerações de origem rácica ou biológica que determinaram o legislador, mas o reconhecimento da

circunstância de que os laços existentes entre pais e filhos permitem supor que estes últimos participarão

naturalmente do conjunto de conceções e de valores que identificam a comunidade nacional daqueles.»26

E continua: «Tal suposição funda-se evidentemente na influência educativa que pode ter lugar no interior

da família, e que apenas se verifica no período de formação da personalidade, período em que um caráter é

mais sensível à influência de terceiros. Desaparecendo tal situação em princípio com o acesso à maioridade,

facilmente se compreenderá que uma filiação estabelecida depois desse momento não possa valer como

presunção para revelar a integração psicológica e sociológica do filho na comunidade nacional dos pais.»27

Além disso, há ainda o receio de que o estabelecimento tardio da filiação tenha como objetivo exatamente

a obtenção da nacionalidade, numa eventual fraude à lei.

Ainda assim, e parecendo haver razões ponderosas em ambos os sentidos, uma solução possível é

admitir-se alguma relevância da filiação adquirida depois da maioridade, mitigada pela exigência de uma

ligação efetiva ou um prazo para a exercer o direito, como acontece na lei espanhola, entre outras soluções

que não cabe aqui desenvolver.

Parte III – Conclusões

1 – O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da

República o Projeto de Lei Orgânica n.º 40/XV/1.ª – Revoga o artigo 14.º da Lei da Nacionalidade, alterando a

Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na sua versão atual

2 – Esta lei assume a forma de lei orgânica e possui valor reforçado, sendo várias as especificidades

aplicáveis à sua aprovação e promulgação (artigos 168.º, n.º 4, artigo 166.º, n.º 2, artigo 168.º, n.º 5, artigo

278.º, n.os 4 e 5, todos da CRP).

3 – A Constituição confere alguma margem de liberdade ao legislador ordinário para tratar a matéria da

aquisição da cidadania portuguesa, nos termos do seu artigo 4.º

4 – São várias as soluções legislativas adotadas noutros países da União Europeia sobre esta matéria,

salientando-se a solução da lei espanhola que determina que quando a filiação só seja determinada depois

dos 18 anos ou em caso de adoção depois dessa idade, o interessado pode optar pela nacionalidade

espanhola de origem no prazo de dois anos a contar daquele facto (filiação ou adoção).

5 – Há razões ponderosas em ambos os sentidos: por um lado, a não discriminação de quem conhece a

filiação numa idade adulta, por outro lado, a eventual perda de uma ligação efetiva decorrente da inexistência

de laços de parentalidade durante a infância e adolescência.

6 – Face ao exposto no presente parecer, e não obstante as reservas suscitadas, a Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto de Lei n.º 40/XV/1.ª(PSD) reúne

os requisitos constitucionais e regimentais mínimos para ser discutido e votado em plenário.

26 V. RUI MOURA RAMOS, «Nacionalidade» in Estudos de Direito Portugues da nacionalidade, 2.ª edição, Coimbra, 2019, pág. 385. 27 RUI MOURA RAMOS, op. cit., pág. 386.