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24 DE JUNHO DE 2022

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profissionais, incapacidade de garantir escalas de funcionamento de serviços fundamentais, encerramento de

urgências, aumento muito significativo do número de utentes sem médico de família.

Neste momento a prestação de cuidados de saúde está prejudicada e existem já cerca de 1,4 milhões de

utentes sem médico de família. Para além dos problemas hospitalares, nomeadamente nas urgências de

obstetrícia e ginecologia, que se tornaram mais visíveis nos últimos dias, existe uma quase total inacessibilidade

a serviços de saúde oral, mental ou visual, o tempo de espera para juntas médicas é completamente inaceitável,

como são as listas de espera para especialidade ou para procedimentos de procriação medicamente assistida.

Os problemas do SNS não são novos, como admitiu a própria Ministra da Saúde, mas o facto é que o Governo

nada fez para os resolver ou para prevenir situações de rutura a que temos assistido.

Sabia-se há muito das dificuldades de captar profissionais, mas o Governo conviveu bem com os concursos

crescentemente desertos; sabia-se há muito das dificuldades de garantir escalas em urgências, mas o Governo

preferiu adensar o recurso a tarefeiros, um dos principais problemas do SNS; sabia-se há muito que existiria um

aumento de aposentações de médicos de família, mas o Governo deixou andar e num ano duplicou o número

de utentes sem médico de família. Mesmo agora tudo o que tem para oferecer são planos de contingência e

medidas que remendam, mas não resolvem.

Os problemas crónicos não foram atacados pelo Governo e a degradação acentuou-se. A recusa de medidas

como a autonomia, a exclusividade ou a criação e melhoria de carreiras foram sempre recusadas. Em alternativa

intensificou-se o recurso a convenções, externalizações e contratualizações. 40% das receitas do SNS são

gastas com fornecimentos e serviços externos, qualquer coisa como 4,5 mil milhões de euros. O recurso a

convencionados para meios complementares de diagnóstico e terapêutica aumento 24% desde 2019, a compra

de internamento a privados aumentou 10% e os acordos com misericórdias e IPSS aumentaram 12%. Já os

gastos com tarefeiros atingiram valores históricos: 142 M€, mais 20% do que em 2019 e mais 31% do que em

2018.

Quando não se tem medidas para o SNS e para os seus profissionais, quando não se quer investir em

tecnologia e equipamentos e não se quer melhorar carreiras e condições de trabalho e se prefere usar o

orçamento do SNS para pagar a privados o resultado só pode ser um: a degradação do SNS. O País está a

viver o resultado dessas opções.

O Governo do Partido Socialista optou pelo caminho da direita e até se vangloria de ter feito mais PPP; as

medidas liberais incentivadas pelo PS têm sido a desgraça do SNS. Veja-se o caso da prestação de serviços

médicos à hora, um verdadeiro leilão do trabalho médico, indigno da profissão e que só traz problemas ao SNS.

Em vez de apostar em carreiras e na sua progressão, em vez de avançar com um modelo de exclusividade com

incentivos associados, incentivou-se um verdadeiro mercado na prestação de serviços comandado pela lei da

oferta e da procura. Destruíram-se equipas e vínculos com o SNS e só restou o livre mercado, a consumir cada

vez mais recursos para cada vez menores resultados.

Como escreveu um antigo secretário de Estado da Saúde sobre as propostas do atual Governo para o

Orçamento do Estado para 2022: «Paradoxalmente, a proposta do Orçamento do Estado prevê um acréscimo

de remuneração para quem efetue mais de 500 horas suplementares. Não se percebe a estratégia. Os

profissionais não o desejam e este tremendo esforço tem um impacto negativo na sua saúde, na estabilidade

familiar e na segurança dos doentes. (…) Por outro lado, o mesmo Estado que não dá autonomia às instituições

para a contratação e não qualifica os vencimentos, oferece valores cinco vezes superiores a quem se

disponibilize a trabalhar em prestação de serviços. O sinal pode não ser o pretendido, mas a direção é clara e

aponta-lhes a porta de saída, desestruturando de forma irremediável o SNS».

Facto é que o Governo insiste nestas não-soluções, que apenas apontam para a porta de saída do SNS.

Veja-se a atual negociação que está a fazer com os trabalhadores médicos: em vez de rever e melhorar as

carreiras, propõe pagar um valor mais elevado se os médicos trabalharem para lá do limite legal definido.

Também na autonomia pouco ou nada se avança. Sobre este assunto o Presidente da Associação Portuguesa

de Administradores Hospitalares é categórico: «Falta autonomia. Os hospitais não podem contratar profissionais

de saúde, não podem fazer nenhum investimento, não podem comprar um equipamento de determinado valor

sem pedir autorização à tutela de Saúde e à tutela das Finanças. Isto cria problemas graves no funcionamento

das instituições.»

Um Governo em modo de contingência não serve ao País, o aprofundamento da liberalização e do desvio

de recursos para o setor privado não serve nem ao SNS nem aos utentes. É toda essa lógica que tem de mudar.

Para a mudar a presente iniciativa legislativa estabelece uma série de medidas para valorizar os profissionais