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II SÉRIE-A — NÚMERO 177

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Os atrasos, que são do conhecimento público, para os quais a Provedora de Justiça vem, aliás, insistentemente alertando há longo tempo1, e que com a pandemia por COVID-19 se agravaram ainda mais — por vezes de modo irreversível — colocam as pessoas a quem o diploma se aplica numa circunstância de desproteção que é imperioso combater.

A temática, de resto, tem constituído preocupação do Livre, que se alinha com o Relatório, de 2016, do Comité das Nações Unidas da Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência2, onde é recomendado ao Estado português que «reveja os critérios para a determinação do grau de deficiência de uma pessoa, em conformidade com a Convenção, regulamentando adequadamente esta questão na sua legislação e nas suas políticas», recomendando também «que o Estado Parte garanta que todas as pessoas com deficiência consigam obter a certificação da sua deficiência e tenham acesso aos programas e esquemas de proteção social e apoio, assegurando assim a igualdade de tratamento»3. Assim, a Lei n.º 12/2022, de 27 de junho, que aprovou o Orçamento do Estado para 2022, determinou, por proposta do Livre, que o Governo investisse no aumento e no reforço das juntas médicas de avaliação da incapacidade, tendo em vista eliminar o atual passivo de processos em lista de espera e capacitá-las a cumprir os prazos definidos no Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, na sua redação atual (artigo 128.º). Posteriormente, a Lei n.º 12/2022, de 27 de junho, que aprovou o Orçamento do Estado para 2022, determinou, por proposta do Livre, que o Governo criasse um grupo de trabalho com a incumbência de avaliar as circunstâncias que devem dispensar a realização de junta médica de avaliação de incapacidade, tendo em vista a emissão de atestado médico de incapacidade multiuso, atendendo às condições congénitas ou outras, que conferem grau de incapacidade permanente.

No contexto da pandemia por COVID-19, foi publicado o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, que no artigo 5.º estabelece um regime excecional de composição das juntas médicas de avaliação das incapacidades das pessoas com deficiência. Foi ainda, por outra via, publicada a Lei n.º 14/2021, de 6 de abril, que estabeleceu um regime transitório para a emissão de atestado médico de incapacidade multiuso para os doentes oncológicos. Ambos os diplomas tiveram por objetivo mitigar os efeitos da pandemia e salvaguardar os direitos de pessoas com deficiência e de doentes oncológicos, nomeadamente em matéria de atribuição dos benefícios sociais, económicos e fiscais previstos na lei.

O Governo, através da Proposta de Lei n.º 45/XV/1.ª, pretende agora revogar aquela Lei n.º 14/2021, de 6 de abril, justificando-se com a caducidade das medidas, destinadas a «vigorar durante um período justificado de tempo». Sucede, todavia, que a necessidade de um regime transitório para emissão de AMIM se mantém, porventura até agravada, atentos os atrasos que a pandemia, precisamente, foi impondo à realização de juntas médicas, muito por conta da afetação dos médicos ao seu combate. Mais uma vez, aliás, no mês de fevereiro agora findo, a Provedora de Justiça emitiu um alerta sobre o tema, pedindo inclusive a prorrogação da validade dos atestados multiusos4.

Sendo o prazo legal para a realização de junta médica de 60 dias, que se contam da data da entrega do requerimento respetivo (cfr. n.º 5 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, na sua redação atualizada), o qual tem sido largamente ultrapassado, e o tema a doença incapacitante — cuja existência e evolução não se compadecem com atrasos — o Livre considera essencial manter o regime transitório de emissão de atestado médico de incapacidade multiuso para os doentes oncológicos, até que se verifique a recuperação daquele atraso, i.e., até que, a nível nacional, se verifique que o tempo que medeia entre o requerimento e a realização da junta médica se situa nos 60 dias, que é o prazo legal. Mas mais: sendo a deficiência uma circunstância igualmente incapacitante que ao Estado cabe apoiar, o presente projeto de lei estende o regime de validade dos atestados já emitidos até que haja uma nova avaliação, assim garantindo a proteção destas pessoas no que toca ao acesso e manutenção das medidas e benefícios sociais, económicos e fiscais legalmente previstos.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o seguinte projeto de lei:

1 Já em 2021, a Provedora da Justiça, no Relatório à Assembleia da República 2021, alertou para o facto de continuar a receber queixas relacionadas com atrasos na realização das juntas, havendo denúncias de quem esteja há dois anos à espera para ser avaliado. Provedor de Justiça - Relatório à Assembleia da República. 2021, página 132. 2 Recomendações da ONU a Portugal sobre direitos das pessoas com deficiência (ulisboa.pt) 3 Comité Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência - Observações finais sobre o relatório inicial de Portugal: 20 de maio de 2016, página 2. Disponível em 1608132 (ministeriopublico.pt)1608132 (ministeriopublico.pt) 4 Provedora de Justiça pede prorrogação da validade de atestados médicos multiusos – Observador