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28 DE ABRIL DE 2023

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PROJETO DE LEI N.º 743/XV/1.ª

CRIA O TIPO LEGAL DE CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL E DE ASSÉDIO SEXUAL QUALIFICADO,

REFORÇANDO A PROTEÇÃO LEGAL DAS VÍTIMAS

Exposição de motivos

O assédio sexual é uma realidade cada vez mais exposta na sociedade, que atravessa gerações, assume

múltiplas formas e é exercida em contextos diversos. Constituindo uma das muitas manifestações da violência

contra as mulheres, os atos de assédio sexual invadem a vida das suas vítimas, desde os ambientes laborais e

académicos ao mundo digital, ao simples facto de utilizar transportes públicos ou de andar na rua.

No campo laboral, já em 2016, o estudo promovido pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no

Emprego, intitulado Assédio sexual e moral no local de trabalho em Portugal, concluiu que as mulheres são as

principais vítimas de assédio moral (16,7 %) e de assédio sexual (14,4 %) no local de trabalho. Referiu, ainda,

que 12,6 % da população ativa em Portugal já sofreu pelo menos uma vez durante a sua vida profissional uma

forma de assédio sexual no trabalho.

Da mesma forma, um estudo da OIT concluiu que a violência e o assédio no trabalho afetaram mais de uma

em cada cinco pessoas, sendo que as mulheres jovens são duas vezes mais suscetíveis do que os homens

jovens de serem vítimas de assédio e violência sexual e que, no caso das mulheres migrantes, a probabilidade

é duas vezes superior à das outras mulheres.

Por seu turno a APAV revelou que quase 2 em cada 10 pessoas admitiu ter sido vítima de assédio sexual no

local de trabalho, sendo a larga maioria mulheres (88 %). Adianta, agora, que as denúncias de assédio sexual

e moral cresceram mais de 150 % nos últimos quatro anos, estimando que os números reais sejam seguramente

mais elevados.

A Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência, que vincula o Estado

português, define assédio sexual como «qualquer tipo de comportamento indesejado de natureza sexual, sob

forma verbal, não verbal ou física, com o intuito ou o efeito de violar a dignidade de uma pessoa, em particular

quando cria um ambiente intimidante, hostil, degradante, humilhante ou ofensivo», exortando os Estados Parte

a adotar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que este tipo de

comportamento seja passível de sanções penais ou outras sanções legais.

Ora, o certo é que quase dez anos volvidos desde a entrada em vigor da Convenção de Istambul no

ordenamento jurídico português, e apesar de todos os avanços e recuos que houve nesta matéria, o assédio

sexual é uma realidade que, não obstante conhecida, ainda não mereceu o devido reconhecimento por parte do

poder político.

Neste campo, há muito que a realidade ultrapassou a lei, não podendo o debate político e teórico paralisar a

ação legislativa acerca da criminalização do assédio sexual, quando todos os dias surgem novas vítimas.

Também há muito que o mundo judiciário reclama legislação que venha colmatar este vazio legal, que clarifique

e ponha fim aos esforços interpretativos e subjetividades por parte de quem tem de aplicar a lei. Não há, aqui,

qualquer precipitação legislativa.

Reconhecidos e condenados pela generalidade da população os comportamentos que constituem o assédio

sexual, entende o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda que é mais do que tempo de lhe conferir a devida

censurabilidade jurídica e dignidade penal, autonomizando-o enquanto crime próprio. Entende-se que os

comportamentos tipificados no crime de «importunação sexual» são manifestamente insuficientes para fazer

face à realidade do assédio sexual, sendo certo que toda a importunação sexual constitui assédio sexual. Assim,

e por melhor responder às exigências penais da atualidade, à variedade de comportamentos que se pretendem

criminalizar e ao bem jurídico a proteger, altera-se a epígrafe do normativo em causa e clarificam-se os concretos

factos que podem consubstanciar o tipo de crime de assédio sexual. Acresce que a autonomização deste tipo

legal de crime, e consequente maior visibilidade no ordenamento jurídico-penal português, tem um potencial

dissuasor junto da sociedade que deve ser valorizado.

Pretende-se, ainda, estabelecer circunstâncias em que a prática de assédio sexual assume especial

censurabilidade, designadamente quando se verificam relações desiguais de poder e com consequências mais

gravosas na vida das vítimas.