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II SÉRIE-A — NÚMERO 31

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autor da sucessão, ou aproveitar-se de algum desses factos.

Os artigos 2035.º a 2038.º regulam outros aspetos da indignidade: momento da condenação e do crime

relevantes para este efeito (artigo 2035.º); prazo e legitimidade para propositura da ação (artigo 2036.º); efeitos

da declaração de indignidade (artigo 2037.º); e reabilitação do indigno (artigo 2038.º).

Como determinado no artigo 2037.º, a indignidade é declarada pelo tribunal, em ação a isso destinada ou

oficiosamente, pelo tribunal, na sentença de condenação penal pelo crime referido na alínea a) do artigo 2034.º

(homicídio doloso). Esta última possibilidade foi introduzida pela Lei n.º 82/2014, de 30 de dezembro, que, a

propósito do crime de violência doméstica, aditou ao Código Penal um novo artigo 69.º-A nesse sentido. Para

além disso, a Lei n.º 82/2014 aditou dois novos números ao artigo 2036.º do Código Civil, atribuindo legitimidade

ao Ministério Público para intentar a ação destinada a obter a declaração de indignidade sempre que o indigno

seja o único herdeiro e determinando a comunicação obrigatória ao Ministério Público, para efeitos de

propositura da ação, da condenação pelo crime de homicídio doloso [nos termos da alínea a) do referido artigo

2034.º], sempre que a indignidade sucessória não seja declarada na sentença penal.

A ação destinada a obter a declaração de indignidade pode ser intentada no prazo de dois anos a contar da

abertura da sucessão ou de um ano a contar da condenação nos crimes que determinam a indignidade ou do

conhecimento das causas previstas nas alíneas c) e d) do artigo 2034.º (dolo ou coação sobre o autor da

sucessão relativamente ao testamento e atos sobre o próprio documento).

O crime de violência doméstica encontra-se tipificado no artigo 152.º do Código Penal, consistindo em infligir,

de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade,

ofensas sexuais ou impedir o acesso ou fruição aos recursos económicos patrimoniais próprios ou comuns, a

pessoas do círculo familiar do agente elencadas naquele artigo, desde logo o cônjuge».

PARTE II – Opinião da relatora

A iniciativa legislativa é muito semelhante ao Projeto de Lei n.º 515/XV/1.ª, apresentado pelo PAN na

Legislatura passada e também próxima, na sua finalidade, do Projeto de Lei n.º 678/XV/1.ª do CH, igualmente

apresentado na Legislatura passada, de cujo parecer fui relatora. Por isso, reitero nesta sede a opinião já antes

manifestada no que respeita à intenção de alargamento das circunstâncias conducentes à indignidade

sucessória através de uma alteração do artigo 2034.º do Código Civil. Tal opção sujeita-se à crítica de que

encurta a liberdade na disposição de bens, parecendo muito duvidoso que por essa via se contribua para a

proteção dos direitos fundamentais das pessoas idosas.

Como bem se sublinhava na pronúncia apresentada pela APAV na Legislatura passada, o propósito,

manifestado pela Associação no relatório Portugal Mais Velho, apresentado em outubro de 2020, deve ser antes

«a criação de uma política de família que passe, entre outras medidas, pela revisão do direito sucessório de

modo a permitir uma maior liberdade na disposição de bens (garantindo que numa situação em que os

descendentes de uma pessoa idosa não a apoiem ou até maltratem possam ser “deserdados”».

Nesse parecer da APAV, apresentado na Legislatura anterior, chamava-se ainda a atenção para um prévio

parecer da Procuradoria-Geral da República a propósito de iniciativa semelhante do Grupo Parlamentar do CDS-

PP (Projeto de Lei n.º 246/XIII/1.ª), «por levantar uma questão que nos parece muito relevante e que acreditamos

ser necessário discutir. Aí se refere estar «em causa uma opção política que eliminará a liberdade de decisão e

a vontade do futuro de cuius, e substituí-la, em nome do interesse público, por uma consequência ope legis

decorrente da indignidade»: ao tornar-se a condenação por violação da obrigação de alimentos ou por exposição

ou abandono uma causa de incapacidade sucessória por indignidade, retirar-se-á ao autor da herança «vontade,

liberdade de assim decidir». Considerou, ainda, a Procuradoria-Geral da República que «a legislar-se deste

modo estará assente que se prescinde, ou se eliminará, o princípio da autonomia e da participação do cidadão

idoso, com direta repercussão na sua capacidade de exercício e de disposição relativamente ao seu património».

Apesar de o parecer agora apresentado pela APAV acabar por concluir que «tudo ponderado, considera-se

ajustado alargar o elenco das situações passíveis de indignidade sucessória nos termos propostos no projeto

de lei ora em análise», não se julga que sejam encontrados argumentos bastantes que permitam ultrapassar as

dificuldades antes evidenciadas. O parecer da Ordem dos Advogados, apesar de incluir algumas sugestões de

melhorias legislativas, considera que a «proposta merece acolhimento».